Gestão ambiental de terras indígenas, um pouco do Acre e os retrocessos das políticas indígena e ambiental brasileiras

Foto: Divulgação/Funai
Foto: Divulgação/Funai

Roberta Graf *, em Combate Racismo Ambiental

Este é apenas um breve artigo nada científico, sem revisão bibliográfica e, por vezes, coloquial, relatando um pouco da minha experiência em gestão ambiental de terras indígenas no Acre, suas potencialidades, mas em confronto com os desmontes atuais, em curso e propostos, às políticas indígena e ambiental, que tenho acompanhado de perto, com muita preocupação.

Deixo claro, de início, uma vez que citarei partidos ao longo do texto, que eu não possuo filiação partidária e nem tenho nada contra partido algum, especificamente. Apenas aponto, como outros analistas, que o curso das políticas (ou a falta delas) ambiental e indígena vai mal, como não víamos desde a ditadura militar – em alguns pontos vemos retrocessos até em relação a esta época! E o retrocesso é suprapartidário, ou seja, composto de vários partidos, especialmente composto pelo setor ruralista (aliado ao de agrotóxicos e transgênicos) e das empreiteiras, entre outros. Mas esta não é uma dura realidade só brasileira. O mundo todo em seu capitalismo selvagem expansionista tem sido, em sua maioria de governos e nos órgãos mundiais, cego-surdo-mudo para estas questões. Há países melhores e piores, e o Brasil infelizmente encontra-se no segundo grupo, há muito o que melhorar e que cuidar para não desabar ainda mais.

Agradeço imensamente o convite da Profa. Dra. Andreia Martini e o endosso da ABA por esta fala na reunião da SBPC, que por sinal foi de ótima qualidade em todos os aspectos, contando inclusive com uma sessão especial intitulada “SBPC Indígena”, por esforço do Prof. Jacó Cesar Piccoli da UFAC, e outra “SBPC Extrativista”, por esforço do PZ / UFAC (e colaboradores). A SBPC indígena particularmente foi extremamente exitosa, com indígenas de todo o Brasil e América Latina, grandes personalidades, palestras, feiras de artesanato indígena, apresentações culturais e sessões espirituais (xamânicas, ou de pajelança, como eles preferem chamar). Os indígenas puderam, na ocasião, fazer intercâmbios e assembleias do seu movimento social, bem como apresentaram uns aos outros os 2 candidatos indígenas do Acre, um a deputado estadual e um a federal,[1] o que é de grande importância já que o Acre não teve, até hoje, um deputado indígena e possui pouquíssimos vereadores indígenas.

Embora meu nome, na programação, tenha vindo como “Ibama”, instituição em que trabalhei até o mês passado,[2] eu não estou aqui em nome do Instituto, mas sim como pesquisadora independente, embora descreva, brevemente, um programa do Ibama deveras exitoso junto aos indígenas que liderei no Acre, com muito prazer, até que ele foi extinto, um dos muitos, no contexto de “enxugamento” do Ibama.

Minha formação é de gestão e política ambiental, tendo doutorado pela Unicamp. Em minha trajetória passei por temas como epistemologia científica e tecnológica, um pouco de antropologia, gestão ambiental de resíduos sólidos, educação ambiental e ética ambiental. No Ibama tive a oportunidade de coordenar o Programa de Agentes Ambientais Voluntários (PAAV), com sucesso de 2006 a 2010 (e desacelerando em 2011 e 2012, por corte de recursos a zero), no qual formava e apoiava populações tradicionais e afins[3] na gestão ambiental de seus territórios, incluindo os indígenas. Com estes o Programa foi mais exitoso, pois eles tiveram bastante seriedade e apreço por ele, sem dúvida por já praticarem, historicamente, a defesa e gestão de seus territórios com afinco. E então iniciou-se uma fortuita cooperação profissional. Mesmo findo o Programa, eu segui me interessando pela temática de gestão ambiental de terras indígenas (GATI) e política indígena, um tanto por gosto particular (ensaio até um pós-doutorado no tema), e outro tanto para prestar apoio às associações indígenas em seu movimento social.

Assim, esse artigo é uma panorâmica do cenário atual preocupante das questões indígenas e ambientais no Brasil. Eu, como servidora pública de um órgão (Ibama) e setor que, hoje, não pratica quase nenhuma educação ambiental ou agenda positiva junto à sociedade (mas sim comando e controle), me vejo totalmente sem tempo para atuar nesses campos, “escravizada pela burocracia”, como já dizia Max Weber. Mas assim mesmo, creio que vale a pena publicá-lo, podendo ser útil aos indígenas e seus parceiros, até porque consta um apanhado de importantes citações, ao longo do texto e no item 6, que recomendo.

Mapa dos blocos de exploração de petróleo planejados no Acre e sudoeste do Amazonas -FARIAS, 2013(http://amazoniareal.com.br/wp-content/uploads/2013/12/Mapa-bloco-ACT-8.jpg)
Mapa dos blocos de exploração de petróleo planejados no Acre e sudoeste do Amazonas -FARIAS, 2013(http://amazoniareal.com.br/wp-content/uploads/2013/12/Mapa-bloco-ACT-8.jpg)

1. Gestão ambiental de terras indígenas, e um pouco dela no Acre

Desde junho de 2012 temos promulgado o Dec. n. 7.747, que regulamenta a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (Pngati), fruto de um amplo processo de consulta pública anterior, aos indígenas e aos envolvidos com o tema. Até hoje, porém, pouco dela foi implementado de fato enquanto política nacional, ou seja, com recursos, planejamentos e envolvimento das instituições. No ano de 2013 foi lançado um edital do PDPI para executá-la, com poucos recursos e apenas 16 terras (projetos) contemplados no país. Ou seja, ainda falta muito, sendo uma política ainda quase que só teórica. Diz Márcio Santilli que a Pngati é da mais alta importância, afinal 13% do território do Brasil já está demarcado em TIs oficiais, mas não há recursos ou vontade política nessa direção.[4]

Haveria muito o que se dizer sobre a GATI, e há diversos autores e instituições se debruçando na teoria e prática do tema, mas, rapidamente, eu gostaria de destacar dois aspectos. Um é que os indígenas, historicamente acostumados à abundância territorial sem limites, e vidas nômades ou seminômades, hoje são obrigados a mudar o foco e se acostumar a terras limitadas e demarcadas, “para sempre confinados” (sendo algumas terras, inclusive bem pequenas, sobretudo fora da Amazônia). Portanto, eles precisam se preocupar cada vez mais com o bom manejo de recursos naturais e gestão do território, pois precisam deles preservados para as futuras gerações, que inclusive estão crescendo em número. Outro aspecto é o de que, sabidamente, em diversos levantamentos produzidos por instituições ambientais, as TIs são reconhecidas como áreas altamente preservadas, até mais do que as unidades de conservação de proteção integral. Bem como, numa visão mais ousada, o modo de vida indígena aponta elementos que podem servir de modelo de escape ao próprio colapso ecológico da humanidade, com o agravar dos problemas (segundo o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, citado por Moysés P. Neto,[5] e autores do campo da Ética Ambiental). Sem dúvida pode em muito nos ensinar, sobre o convívio sustentável com a floresta (e outros ecossistemas) e o etnoconhecimento vegetal e animal, por exemplo.

A despeito da falta de vontade política do governo na PNGATI, já há algum avanço concreto no tema, em boa parte por iniciativa dos próprio indígenas que procuram o MMA e instituições ambientalistas, em outra parte por iniciativa deste Ministério, da Funai, dos OEMAs e do terceiro setor, como é o caso da CPI (Comissão Pró-Índio), no Acre, que há anos vem implementando projetos continuados de formação de agentes agroflorestais indígenas (AAFIs) e apoio à GATI, na prática.[6]

A experiência do PAAV / Ibama também foi relevante, Brasil afora. Me recordo agora de pelo menos 6 estados em que houve trabalho assíduo junto a indígenas: Acre, Amazonas, Pará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Maranhão. No Acre ele foi ativo de 2003 a 2012, mas foi mais produtivo, com recursos financeiros próprios (embora parcos – fazíamos “milagre” com eles) por 5 anos (de 2006 a 2010). Formamos no Acre e sudoeste do Amazonas um total de 506 agentes, representantes de outros tantos agentes “informais” de suas comunidades, pois eles eram multiplicadores de toda uma práxis de gestão. Destes, na ativa (sem contar com as desistências), permanecemos ao final com 172 indígenas, de 19 etnias (as 15 do Acre e mais 4 do Amazonas), de todas as terras povoadas no estado e algumas no Amazonas (perfazendo 44 terras / áreas indígenas).

O Programa no Acre funcionava a partir de cursos densos de 45 horas, envolvendo o principal da legislação ambiental pertinente em cada caso, noções de ecologia e da questão ambiental, práticas de gestão e educação ambiental, bem como de vigilância e fiscalização dos territórios. Os 15 cursos que ministramos geralmente possuíam públicos mistos, entre indígenas, extrativistas e pequenos colonos, por exemplo, embora alguns foram somente com indígenas. A integração e troca de experiências destes membros de populações tradicionais de diversas origens, áreas e municípios diferentes era riquíssima para eles. Também procurávamos usar linguagem didática a partir de fotos, figuras e vídeos, pois parte do público era analfabeto ou semianalfabeto, e técnicas participativas durante todo o curso, com dinâmicas e artes.

O Programa caiu como uma luva aos indígenas, que em muito se satisfaziam com o andamento, nos procuravam bastante, e sempre tentávamos apoiá-los como podíamos. O motivo central da cooperação exitosa entre os indígenas e o Ibama, ao meu ver, é o fato da identificação profunda do indígena com sua terra, com a defesa constante de seu território e recursos naturais. Por exemplo, quanto à vigilância e fiscalização ambiental contra invasores (que roubam caça, pesca e madeira e podem cometer outras infrações como desmate, queima, biopirataria e captura de animais silvestres para tráfico), os indígenas sempre praticam, independente de apoio externo ou não, e já estão acostumados a encaminhar os invasores à polícia e/ou ao Ministério Público mais próximo. Isso é possível devido à forte coesão e organização comunitária[7] dos indígenas em cada aldeia e TI, bem como sua forte identificação com a própria terra, a natureza. Estas são questões centrais indígenas, e é por isso que antropólogos tanto insistem no fato de que se pode até mesmo exterminar uma etnia indígena se uma hidrelétrica os expulsa de seu território natal, por exemplo.[8]

Voltando ao assunto, portanto, por meio do PAAV / Ibama, procurávamos apoiá-los com algum recurso próprio para gasolina e alimentação (para os mutirões de vigilância, da Resolução Conama n. 03 de 1988), redigindo projetos para editais ambientais, indo às comunidades e dando palestras ao conjunto delas, observando e orientando atividades práticas de gestão ambiental dos agentes e seus colegas. Bem como, prestávamos apoio ajudando-os a se integrar a redes de governança ambiental local e global (fazendo a ponte entre eles e órgãos públicos, ONGs e outras instituições). Algumas TIs foram bastante beneficiadas com o Programa, é o caso, por exemplo, da TI Colônia 27, a qual, com dezenas de famílias, possui somente 300 hectares, encostada à cidade de Tarauacá, e quando receberam a terra estava quase toda degradada com pastagem. A partir do primeiro curso do PAAV / Ibama em 2002 (na época, ministrado por servidores de Brasília), os indígenas de lá “vestiram a camisa” ambiental e agroecológica, tiraram todo o gado e foram recuperando pouco a pouco toda a área de pasto em lindos pomares e SAFs, e hoje são professores e referências para indígenas de várias TIs, sediando cursos e encontros. Concluindo, no caso do Acre, nosso Programa veio enriquecer o trabalho já efetuado há mais de duas décadas pela CPI, por meio dos AAFIs, aprimorando a formação deles e envolvendo outros colegas seus como agentes ambientais voluntários. Fomos até aonde a instituição e os recursos financeiros permitiram, com alta produtividade, até que o Programa foi oficialmente extinto pelo Ibama em maio de 2013.

No Acre as etnias indígenas costumam ser vistas como preservadoras, “ecológicas”, bem como, felizmente, aqui há uma situação de relativa ausência de conflitos de terra (exceto algumas pendências pequenas em comparação com o restante do Brasil, como as demarcações das TIs Seringal Curralinho, Nawa e Kuntanawa). No geral,  também, pode-se dizer que as grandes degradações e conflitos socioambientais que vêm ocorrendo amiúde no Brasil ainda não chegaram, com força, no Acre, ou, o capital ainda não solapou a maior parte dos modos de vida das nossas populações tradicionais. É claro que existem problemas, como a aprovação do milho transgênico pelo governo atual de Sebastião Viana (PT) que desrespeitou a própria lei estadual,[9] algum desmate e queima ilegal, retirada de madeira ilegal e planos de manejo madeireiro permissivos e não fiscalizados,[10] etc. O problema de venda de carne de caça aqui no Acre é seríssimo, com fortes quadrilhas, entranhado na má “prática cultural” de cidadãos urbanos, entre eles servidores públicos, políticos e membros do poder judiciário, até de alto escalão (!!!). Bem como será muito problemática a exploração de petróleo e/ou gás natural que se vislumbra na região do Juruá (de alta relevância ecológica e permeada de UCs e TIs), e a passagem de rodovia e/ou ferrovia de Cruzeiro do Sul (AC) a Pucallpa (Peru), que sangrará o Parque Nacional Serra do Divisor.

As experiências exitosas de indígenas no Acre são diversas e presentes em praticamente todas as TIs e áreas. Há iniciativas de SAFs, pomares, enriquecimento de capoeiras com madeireiras e frutíferas, criação de peixes e pequenos animais, manejo de recursos naturais, artesanato com beneficiamento de produtos não-madeireiros (de sementes, palha, algodão – tecelagem, seringa – com destaque aos produtos encauchados da TI Nova Olinda, frutas – como o batom de urucum da TI Rio Gregório), etc. Os indígenas costumam ser muito produtivos em produção de mudas plantio, por exemplo, é o caso dos Kuntanawa, que, no interior da Resex Alto Juruá, doam milhares de mudas, anualmente, aos extrativistas vizinhos.[11]

Os indígenas acrianos também têm se destacado por seus festivais culturais, alguns bastante abertos a visitantes de fora, como o da Aldeia Nova Esperança, na TI Rio Gregório, que anualmente recebe centenas de visitantes não-índios (“nawás”, como eles chamam) do Brasil e do mundo, agenciados por empresas de turismo. Há o festival das TIs Jordão e Independência, já crescendo anualmente, e há festivais menores em cada terra, cada vez mais organizados e produtivos. Os festivais para eles são peça chave na afirmação e valorização cultural, no traçado de alianças interétnicas, interterras e deles com nawás brasileiros e estrangeiros em geral, que possam apoiá-los em projetos futuros, bem como, este é um fator que amplia a consciência indígena da população não-indígena em geral, o que é de fato positivo e uma necessidade, diante dos novos levantes racistas anti-indígenas que vem surgindo com crescente força no Brasil (falaremos desse tema mais adiante). Se os festivais são, sem dúvida, positivos, até pelo aporte direto de recursos financeiros pelo etnoturismo da ocasião e pela venda de artesanato, são também carregados de riscos, como sempre alertamos aos indígenas, porque com os visitantes vêm numerosos impactos culturais, possíveis doenças, possíveis crimes ambientais “na surdina”, possíveis crimes culturais de uso indevido de imagens e de apropriação de patrimônio imaterial (kenês, cantos, conhecimentos de pajelança), portanto é preciso se ter um alto nível de cuidado, triagem e orientação aos visitantes, para minimizar os impactos. A simples presença do nawá urbano em sua terra, repleto de botas chiques, roupas, mochilas, equipamentos audiovisuais sofisticados, etc, já cria um enorme desafio aos indígenas para reverter a tendência de saída de indígenas para as cidades.

Outro aspecto relevante das TIs do Acre (e que certamente devem se verificar em TIs brasileiras), que salta aos olhos dos observadores, é a democracia, transparência, harmonia de gestão e convivência internas. Tudo é resolvido em longas e harmônicas reuniões, e os lideranças são legítimos representantes do seu povo. Quando não estão desempenhando bem seu papel, são trocados por outros. Os indígenas em sua coesão de laços coletivos internos são muito avançados nesses aspectos de organização social. Sabem resolver bem problemas internos, tendo eles próprios, às vezes, seguranças em ronda e “cadeias” (para situações-limite), já que tudo é resolvido no consenso, e na máxima inclusão das demandas. Esse aspecto democrático é facilitado, sem dúvida, pelo relativamente baixo contingente populacional, mas o fator determinante é o cultural.

E por falar em cultura, o que é central, realmente, em todos os casos, e também para o êxito da gestão ambiental e territorial, é a valorização cultural. Muitos indígenas têm lutado com afinco para pesquisar com seus anciãos a própria cultura, reavivar a língua materna e todos os elementos, da arte à cosmologia, dos conhecimentos agrícolas e ecológicos. Se os indígenas em seu processo de contato crescente com a cultura ocidental urbana perderem sua cultura, futuramente poderão correr o risco de perder os territórios, pois o capitalismo globalizante se estende a tudo, a batalha pelo território inevitavelmente chegará a todos os rincões[12] e, sem a cultura, a tendência é que o poder reinante destine apenas algumas dezenas de hectares por família, como no modelo da reforma agrária. Com a cultura preservada, justifica-se, além da ligação visceral dos indígenas com seu território materno por questões sagradas e dos seus cemitérios, por exemplo, a necessidade de sobrevivência em função da disponibilidade de recursos naturais vastos, incluindo água, vegetais e animais de caça e pesca, entre outros elementos.

Uma outra boa característica que é comum às 15 etnias indígenas do Acre é o uso da bebida ayahuaska (chamada por eles de cipó, nishi pãe, huni, kamarãpi e outros nomes, a depender da etnia e contexto). Sabe-se que o xamanismo com uso de plantas de poder,[13] ritualizadas em contextos sagrados, é usado por praticamente todas as etnias brasileiras, mas a ayahuaska possui de fato um dom especial de coesão, união e harmonização do ser humano com a natureza, e talvez ela tenha ajudado os indígenas acrianos a manterem um bom desempenho na gestão ambiental – é o que se torna nítido para nós, que também conhecemos esta bebida e sua ritualística.

Finalizando, do que pude observar em campo, as TIs acrianas estão num ótimo caminho de gestão ambiental, mas há 4 alertas importantes que eu gostaria de salientar, para os indígenas e os gestores que forem trabalhar em cooperação com eles:

a) Como já foi analisado, a sempre central e presente necessidade da valorização cultural.

b) A segurança alimentar com base agroecológica local. Por conta da proximidade e/ou facilidade de acesso às cidades, bem como do aporte de mais recursos financeiros regulares às famílias (tais como bolsas-família, auxílios-natalidade e aposentadorias), muitos indígenas têm alterado seus hábitos alimentares quase completamente, trocando a plantação, caça, pesca e coleta pelos produtos industrializados mais baratos (macarrão, “frango de granja”, arroz refinado do sul do país, suco “de saquinho – em pó”, e muitos outros itens), a maioria de baixo valor nutritivo, e de alto teor contaminante (agrotóxicos, transgênicos, corantes, conservantes, hormônios). É patente o crescimento de casos de diabetes (por conta do excesso de açúcar), gastrite e câncer nos indígenas por conta dessa má alimentação. Ora, a segurança alimentar própria, além de ser pilar cultural, é vital a longo prazo para manter as sementes e mudas, os conhecimentos e técnicos da rica agrobiodiversidade que eles possuem, por exemplo, os indígenas cultivam diversas espécies de mandioca, cará, inhame e milho, para muito além do uso comum na cultura ocidental. Ou seja, é muito importante que sigam plantando, e sempre mais, inclusive frutas nativas e exóticas, espécies madeireiras e palmeiras (para suas construções), etc, sem cair na tentação de usar o dinheiro para a (má) alimentação da cidade. Em termos de proteína animal, também, é importante o foco na criação de peixes e animais de pequeno porte (galinha, pato, ovelha, porco – com os devidos cuidados do manejo de cada um), e até mesmo silvestres, para alimentação, ao invés da criação de gado, de alto impacto e não recomendável ao bioma amazônico. Felizmente já são pouquíssimos indígenas acrianos que ainda mantêm gado em suas terras, e a tendência é diminuir os rebanhos, pelo que temos visto dos Planos de Gestão Ambiental aprovados e revisados. Enfim, estes assuntos são do cotidiano dos AAFIs, mas é importante que obtenham mais apoio ao seu trabalho de multiplicadores, para garantir a manutenção e enriquecimento da agrobiodiversidade pelas famílias das TIs.

c) É preciso mais cuidado com a gestão de resíduos sólidos e saneamento. Infelizmente, em muitas terras, apesar dos agentes indígenas de saúde (AISs) e de saneamento (Aisans), estes itens têm sido negligenciados, ocorrendo diversos casos de poluição já evidentes, que contribuem em curto prazo em doenças como verminoses e infecções, e, no longo prazo, câncer e outras doenças graves. Afinal, cada vez mais, os indígenas trazem produtos industrializados e embalagens para as aldeias, bem como a população está aumentando e às vezes não se tem o devido cuidado com as águas servidas (esgoto), que fica espalhado em pequenos igarapés, açudes e em torno das casas. Destacam-se os seguintes subitens, para os quais é necessário uma contínua e dedicada educação ambiental:

c.1) Cada família ou conjunto de famílias deve fazer banheiro ainda que simples, com fossas sépticas longe de corpos d’água, e orientem efetivamente a todos para não espalhar fezes pelos arredores.

c.2) Para as águas de lavagem de louças e roupas, é necessário fazer sistemas de drenagem adequados, se possível até tratar estas águas (há sistemas caseiros relativamente simples de se adotar).

c.3) Não lavar roupa ou louça com sabão em igarapés pequenos, e, em hipótese nenhuma, em açudes, pois estes rapidamente eutrofizam (“apodrecem”), com o uso de sabão.

c.4) Evitar usar sabão, e usar mais sabão em barra tipo neutro do que os “azuis”, e os em pó. Evitar detergente e cosméticos (shampoos, cremes), altamente poluentes.

c.5) Evitar o consumo de produtos industrializados, informar-se acerca dos mais tóxicos, usar somente o que se precisa realmente. Fazer educação ambiental anti-consumismo, explicando à população tudo o que está envolvido no produto, da fabricação ao descarte na forma de lixo. Evitar a todo custo trazer embalagens para as aldeias (deixá-las nas cidades), usar paneiros e sacolas permanentes.

c.6) Efetuar a coleta seletiva de lixo casa a casa efetivamente, pelo menos para separar entre orgânicos, recicláveis, tóxicos e rejeitos. Os orgânicos devem ser destinados à compostagem para adubo (e não espalhados em volta das casas ou nos barrancos dos rios, pois assim poluem). Os recicláveis podem ser reaproveitados na aldeia mesmo, para alguma utilidade de armazenagem ou até para artesanato, e o excedente pode ser comercializado ou doado nas cidades (há prefeituras se preparando para a coleta nas aldeias, senão os próprios indígenas devem se organizar para levar). Os rejeitos e tóxicos também devem ser levados às cidades, sendo que os tóxicos devem ser cuidadosamente separados e jamais deixados ou enterrados nas aldeias, são eles os mais comuns: pilhas e baterias, lâmpadas fluorescentes, remédios e tintas. No caso de não se conseguir, esgotando-se diversas tentativas, levar o lixo para a cidade, é necessário enterrar na aldeia mesmo, num lugar organizado, seguro, sinalizado e distante de corpos d’água, porém, repito, jamais enterrem os resíduos tóxicos – estes devem retornar à cidade, custe o que custar.

d) Manter as iniciativas sustentáveis como produção de artesanato, cadeias produtivas de não-madeireiros em geral, etnoturismo (incluindo os festivais e olimpíadas – porém com os devidos cuidados exigidos no controle da entrada e permanência de nawás nas aldeias, por exemplo, é recomendável que as arenas, kupixaus [14] e hospedarias sejam distantes das aldeias em si, cujo acesso deve ser bem mais restrito).

Os indígenas são os nossos exemplos de vida ecológica, portanto, vamos manter as aldeias ecologicamente, como as ecovilas que tantos nawás lutam para manter em meio ao capitalismo degradador, pois é isto que vai nos sustentar, cada vez mais, no futuro. 

2. O contexto indígena e ambiental, no Brasil e no mundo

É impossível falar em gestão ambiental de terras indígenas sem olhar para o contexto geral de como anda a questão ambiental e a questão indígena no Brasil e no mundo. É preciso que se esteja atento aos retrocessos que estão ocorrendo e propostos nas políticas indígena e ambiental em nosso país, e na tendência se o cenário político não melhorar, para que possamos, crescentemente, atuar em movimentos sociais. No caso dos indígenas, populações tradicionais e afins, pela garantia de seus direitos humanos e territoriais, tão suadamente conquistados após anos de dominação colonial.

A questão ambiental, ou ecológica, é a mais importante que existe, ao meu ver, e conforme muitos cientistas e atuantes na área. É a questão da própria vida, da sobrevivência humana e de todas as espécies, da manutenção da água potável disponível, do solo saudável agricultável e do próprio clima, pois, como se sabe, somos fragilmente dependentes da estabilidade climática. Hoje já é de mais amplo conhecimento que estamos num caminho rápido ecocida, que ruma à extinção da própria espécie humana, e não só de tantas vegetais e animais que ocorre em ritmo alarmante. As mudanças climáticas com eventos extremos (enchentes e secas, muito calor ou muito frio), a poluição e contaminação de vastas áreas (terras, rios, oceanos e atmosfera), a extinção de espécies, a perda de agrobiodiversidade e conhecimento tradicional associado, a escassez de recursos naturais, as guerras pela água e por petróleo, a escravidão e contaminação de trabalhadores com agrotóxicos e mineração, a expulsão de moradores (indígenas, ribeirinhos e populações tradicionais) e degradação de vastos territórios pelas hidrelétricas, etc, são sinais de colapso socioambiental e ecológico de toda uma cultura, de todo um modelo de “civilização”.

Apesar disso, os grandes blocos político-econômicos mundiais, capitalistas, fecham os olhos e os ouvidos, e as convenções ambientais mundiais pelo clima, pela biodiversidade e outras, seguem apenas no papel. A governabilidade global de tais questões será inevitável, pois os impactos já são globais, por exemplo, o mundo está sofrendo a radioatividade da usina nuclear japonesa de Fukushima que explodiu sob uma tsunami em mar/2011 (embora se escamoteie essa informação na grande mídia). A falada “desmaterialização da economia” ou a “economia pós-industrial”, que seria ambientalmente mais adequada, ainda é ínfima. A “economia verde” e o “desenvolvimento sustentável”, termos quando usados pelo mercado, são um conjunto de paliativos, muitos deles questionáveis, ou que não passam de um “marketing verde” com propaganda enganosa. Os desastres socioambientais na China e África, por exemplo, que sustentam boa parte da industrialização e fornecimento de matérias-primas ao consumismo mundial, são catastróficos, mas de pouca atenção, já que suas populações são mais pobres e dominadas num colonialismo que nunca deixou de existir. Vivemos mesmo numa situação de “genocídio planetário”, denunciado por exemplo num manifesto de mais de 250 cientistas (IHU, 2014), ou numa sociedade suicida, ou ecocida, como apontam ecólogos e analistas há pelo menos duas décadas.

Fatalmente precisaremos de fortes contingências e planificações no futuro para se limitar o consumo e a poluição. Por exemplo, não é possível seguir incentivando ao extremo a indústria automobilística, porque as cidades viram um caos de carros, totalmente inviáveis. E é fato de que é muito difícil construir esta governabilidade de forma democrática, pois a ONU e seus organismos, sabe-se, ou são inefetivos ou não democráticos, e a tendência é, novamente, a repetição da supremacia dos grandes blocos político-econômicos dos EUA (principalmente), Europa e Japão sobre os demais, cujo desenvolvimento se dá a custa dos outros. As iniciativas sustentáveis ainda são muito tímidas. Apesar disso há bons sinais, como programas da FAO, do Pnuma e do PNUD, mas que em muito precisam crescer.

Na verdade precisaríamos de outro modelo de desenvolvimento, pautado pela igualdade e justiça social ampla, democracia, Ética Ambiental, pela Economia Ecológica, e aí surgem ideias muito pertinentes como a teoria do Crescimento Zero, postulando que o crescimento econômico não é viável por definição, num planeta limitado.[15] Mas quando, e se chegaremos, a essa virada positiva na humanidade, é uma incógnita difícil de responder, e não se vislumbra nada parecido no médio prazo, antes o contrário, a não ser louváveis iniciativas pontuais de pequena escala. Algumas constituições como a da Bolívia e do Equador já incluem temas da Ética Ambiental, na linha do “bem viver” e do direito intrínseco das demais espécies e dos elementos naturais existirem (visão ecocêntrica, ao contrário da antropocêntrica), mas a prática de seus governos tem sido opostas ao que está escrito!

O próprio capitalismo é, intrinsecamente, socialmente injusto e ecologicamente predatório. Além disso, é intensamente globalizante, como já diziam Karl Marx e Friedrich Engels em seu famoso Manifesto Comunista de 1848, expandido seus domínios a todo o espaço global e territórios, aos poucos solapando os povos “primitivos” ou não-capitalistas existentes (neles se incluem as populações indígenas). Ou seja, a não ser que tenhamos um firme propósito de proteger as culturas originárias indígenas e de populações tradicionais em geral, que possuem relações não-monetárias com a natureza, vasto conhecimento e o direito intrínseco a manterem sua existência dessa forma, com amparo jurídico e de políticas públicas fortes, a tendência do capitalismo é de homogeneização de todos os povos na cultura ocidental dominante, com todo o seu arcabouço anti-ecológico e socialmente excludente.

No Brasil não é diferente, e mais, é um dos piores exemplos. Nosso governo, em particular na gestão federal em vigor chefiada por Dilma Roussef (do PT, em forte aliança com o PMDB), segue o mais anti-ambiental jamais visto, como observam diversos analistas. Com o seu PAC, o governo pauta-se no crescimentismo econômico de curto prazo a todo custo (e não “desenvolvimento”), e pior, enriquecendo as oligarquias das mais degradadoras possíveis para manter nosso modelo primário exportador. Produzimos soja, gado e outros produtos agropecuários (empanturrados de agrotóxicos e transgênicos, sendo o Brasil campeão mundial de consumo de agrotóxicos desde 2008), alumínio, ferro e outros minerais de baixo valor agregado (e de alto impacto ambiental). A ênfase econômica é esta, em que o governo apoia sobremaneira os conglomerados econômicos envolvidos, como os ruralistas do agronegócio, negligenciando outros setores, e com quase nenhum investimento em CT&I para que pudéssemos alavancar setores econômicos de ponta.

Na ampliação da infraestrutura, o Brasil tem priorizado as desastrosas mega-hidrelétricas na Amazônia,[16] também refém do grande poder das gigantes empreiteiras, entre outros problemas como rodovias sem os devidos cuidados ambientais. Temos o caso da insana UHE Belo Monte, cujos empreendedores já sofreram dezenas de processos judiciais e ações civis públicas, cujas condicionantes do licenciamento ambiental não têm sido obedecidas, e cujos impactos socioambientais e ecológicos são gigantes. Pelo mesmo caminho seguem as UHEs dos Rios Tapajós e Teles Pires. Recentemente, tivemos o desastre da enchente histórica do Rio Madeira, agravado pelas UHEs Jirau e Santo Antônio, próximas a Porto Velho, que causou calamidades públicas em Rondônia, Acre e Bolívia. Como se não bastasse, o Brasil vem estendendo suas obras, em parcerias do governo federal com as empreiteiras, para construir algumas UHEs no Peru e na Bolívia, cujos impactos previstos também são enormes, inclusive às bacias hidrográficas do Acre e Rondônia.

Em todos os casos destas hidrelétricas em curso, o licenciamento ambiental tem sido frágil[17] e, na questão indígena e de populações tradicionais ou residentes afetadas ou expulsas, tem sido trágico, sem nenhum cumprimento da Convenção 169 de 1989 da OIT (consulta prévia, livre e informada). Às vezes há até assassinatos de lideranças, como foi o caso dos Munduruku por conta de sua resistência às hidrelétricas dos Rios Tapajós e Teles Pires. Tal fato motivou, inclusive, a edição de um decreto federal para a entrada da Força Nacional nas áreas a serem afetadas por estes mega-empreendimentos, algo tipicamente ditador (Dec. n. 7.957 de 2013). O governo também desafetou cerca de 150 mil hectares de sete UCs na Bacia do Rio Tapajós (por medida provisória, transformada na Lei n. 12.678 de 2012) para as futuras hidrelétricas. E as mazelas oriundas da construção das UHEs, como aumento da desordem e crimes urbanos e no entorno de Altamira, são alarmantes.[18]

Há outras linhas de ação ambientalmente terríveis deste governo, como o apoio aos agrotóxicos e transgênicos (com instâncias de aprovação e legislação flexibilizadas), a exploração de petróleo na Amazônia e no pré-sal, a abertura de leilões para a exploração de xisto (gás de folhelho, ou fracking – intensamente impactante) e a proposta de novas usinas nucleares.

Tudo isso faz do atual governo o pior que já se viu na área ambiental e, mais a frente, veremos que é também o mais anti-indígena.

Some-se a isso o fato de que nosso governo é oligárquico, patrimonialista, coronelista, que não largou sua herança de ditadura e exploracionismo colonial.[19] Um governo de interesses próprios, e um dos mais corruptos do mundo. Cargos do executivo e legislativo são conquistados na base de doações e alianças com grupos econômicos de grande histórico anti-ambiental e de injustiças sociais. E o pior, neste governo de elites, temos uma elite “burra”, que aposta nos modelos da mais alta exploração social e ecológica, sem uma boa visão da realidade. No judiciário os cargos superiores são nomeados, e não fogem à regra e, infelizmente, nos juízes concursados, também há bastante corrupção, e quase nenhuma consciência ambiental ou indígena.[20] Some-se a isso a ineficiência e gigantismo burocrático da própria estrutura estatal. Precisamos, sobremaneira, de uma boa reforma política, democrática e popular.

Os órgãos públicos que trabalham com meio ambiente, populações tradicionais, indígenas, da agricultura familiar e afins, estão extremamente sucateados, até mesmo com golpes intervencionistas em alguns momentos, como o Ibama, o ICMBio, a Anvisa, a Funai e o Incra. Os orçamentos e políticas públicas nestes assuntos também são ínfimos.

Da mesma forma, sofremos de falta de um bom sistema educacional e cultural, de forma até proposital, das elites capitalistas. Para manter o consumismo e as elites no poder, é preciso manter a população alienada e desinformada. Daí a péssima programação da mídia dominante, e o sucateamento da educação. Nesse contexto, vemos que ainda é muito pobre a consciência ambiental e indígena da sociedade, e em alguns casos mais graves de municípios conflituosos de domínio ruralista ou dos mega-empreendimentos, as elites dominantes têm feito verdadeiras campanhas anti-ambientais e anti-indígenas, com pronunciamentos, panfletos e organizações incitando ódio na população, como se os indígenas e outros atores destas causas fossem “anti-progresso”, ou “anti-tudo o que é bom”.[21] Estamos vivendo uma nova onda de racismo indígena, presente também na grande mídia.

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*Roberta Graf é doutora em Política Ambiental (DPCT / Unicamp), mestre em Gestão Ambiental e Energética (Unimep), graduada em Química (Unicamp), graduanda em Ciências Sociais (Ulbra), servidora do ICMBio / CNPT / Acre e ex-servidora do Ibama.

Comments (4)

  1. Acho a Roberta que escreveu esse artigo esta bem desinformada sobre a problemática da situação da regularização das terras indígenas do Acre e sobre os graves conflitos transfronteriços Acre/Ucayali.

  2. Pois é a autora viveu realmente em outro Acre! Sinceramente aqui no Pará essas políticas do IBAMA/ICMBIO, trazendo a “novidade” que os índios já conhecem, em geral vem junto com os grandes projetos de mineração e barragens e são na verdade “insustentáveis” ecologicamente e economicamente e só duram enquanto o governo e as empresas não conseguem as licenças pra destruição das florestas. No fim das contas continua sendo a ciência a serviço do Grande Capital, no Acre travestido de Verde, no Pará com sua máscara de desenvolvimento social.
    Lamentável

  3. Com relação a aparente “calmaria” e resolução de conflitos referentes às demarcações das terras indígenas no Acre, é preciso que digamos que desde o ano de 203 “todos” os processos foram paralizados a pedido do Governo. Mais ainda, a violência adquire contornos gravíssimos principalmente contra os Jaminawa que tem praticamente todo o seu território invadido e não demarcado. Ao todo são 04 terras Jaminawa sem providência. Várias tentativas de homicídio foram perpetradas contra lideranças daquele povo. É o caso do cacique Francisco, da terra indígena São Paolino. Infelizmente o Governo do Acre, protegido pela imprensa e por ONGs, não deixa que a sociedade saiba realmente o que acontece contra os povos indígenas e seus territórios.

    Destaco ainda que a terra indígena Apolima-Arara, única que teve o proceso em andamento, só chegou até aqui por determinação judicial e mesmo assim o território continua totalmente invadido e em alguns caso, os ocupantes não indígenas contam com apoio explícito do ICMBio. A terra indígena Nawa do Igarapé Novo Recreio também está judicializada por uma sequência de ações perpetradas pelo IBAMA/ICMBio.

    A terra indígena dos isolados do Igarapé Tapada até hoje não teve qualquer medida no sentido da interdição pedida pelo CIMI desde 2003, o mesmo ocorre com a terra indígena dos isolados do Parque do Chandles.

    São várias terras indígenas ainda por serem demarcadas e a situação de violência contra estes povos e comunidades é sistematicamente omitida e diluida em supostos projetos de proteção culturual, como os inúmeros “festivais” patrocinados pelo governo e suas ONGs com a finalidade (entre outras, claro) vender a imagem do próprio governo e suas ONGs, quase nada resulta de ganhos para os indígenas. Um exemplo claro disso foi a realização recente do encontro cultural na terra dos Kuntanawa (Kontanawa) enquanto não se tem se quer um processo claro e em andamento para a demarcação de seu território.

    O discurso de que tudo está bem para e com os povos indígenas do Acre é talvez a maior violência contra estes povos e suas histórias de luta.

    Bom trabalh.

    Lindomar Padilha

  4. Gostaria de conhecer esse”Acre Maravilha dos Povos Indígenas “, relatado pela autora no seu artigo. “bem como, felizmente, aqui há uma situação de relativa ausência de conflitos de terra (exceto algumas pendências pequenas em comparação com o restante do Brasil, como as demarcações das TIs Seringal Curralinho, Nawa e Kuntanawa)”. O povo Apolima Arara até hoje luta para retirar de suas terras os invasores, principalmente madeireiros e posseiros, sendo que a terra dos Apolima já está homologada, o cacique Francisco Jaminawa e sua família da TI São Paolino em Sena Madureira estão constatemente ameaçado de morte pelos fazendeiros que invadirão suas terras, o Povo Nawa estão constatemente sendo ameaçados e vigiados pelo ICMBio, proibidos de derrubar pequenas áreas de terras para colocar seu própria roçado, para seu sustento.Sem contar no que se refere a saúde Indígena, que mais mata do que gera vida, e uma educação diferenciada só nos documentos que vão para o MEC. Bom, esse infelizmente é um pouco do Acre que conheço, e que tb infelizmente esses povos que sitei são aqueles povos que o governos se quer faz um minimo de esforço para cumprir com suas politicas públicas, não são os povos indígenas dos festivais que os gringos conhecem. Um estado onde existem 21 terras indígenas não demarcadas não pode haver “uma situação de relativa ausência de conflitos de terra”, pois só o fato de não terem suas terras demarcas já é um conflito e creio que é dos piores, pois sabemos que se o estado não demarca é porque está em total legitimidade com os fazendeiros, grileiros, posseiros,garimpeiros e politiqueiros.

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