Começa a tomar forma instalação de memorial da resistência latino-americana às ditaduras militares, em Porto Alegre

Conhecido como Dopinha, local servirá como um centro de referência e defesa dos direitos humanos| Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Conhecido como Dopinha, local servirá como um centro de referência e defesa dos direitos humanos| Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Caio Venâncio, Sul 21

Entre 1966 e 1971, num imponente casarão localizado no número 600 da rua Santo Antônio, em Porto Alegre, funcionou aquele que foi um dos primeiros centros de tortura clandestino da América Latina. Conhecido como Dopinha, o imóvel foi usado por militares para, por meio da violência física e psicológica, obter confissões daqueles que lutavam contra a ditadura.

Agora, o espaço deve mudar de nome, vai se chamar Centro de Memória Ico Lisboa, uma homenagem ao militante preso pelo Regime Militar e desaparecido desde 1972, e contará com acervo histórico, além da visitação de escolas, focando na trajetória dos gaúchos que se opuseram à ditadura. No momento, a Secretaria da Fazenda de Porto Alegre avalia o valor do imóvel para desapropriá-lo e nos próximos dias um projeto de lei sobre o tema deve ser encaminhado à Câmara de Vereadores.

Coordenadora-geral do Comitê Carlos de Ré, grupo de defesa dos direitos humanos que atua em pautas relativas à ditadura Militar, Christine Rondon conta que uma reunião ocorreu com a Prefeitura de Porto Alegre na segunda semana de julho. Na ocasião, ficou definido que dentro de 16 dias um projeto de lei sobre a desapropriação do imóvel será encaminhado ao legislativo municipal. A ideia é que os custos deste processo, estimados em cerca de R$2,15 milhões, sejam repartidos entre o município e o governo do estado do Rio Grande do Sul.

Conforme Christine, existe vontade política de ambos os lados para aprovar o projeto. Na Câmara, as bancadas de oposição e situação estão orientadas a votar a favor do projeto. Até mesmo os proprietários do imóvel têm simpatia pela causa e são favoráveis à desapropriação, algo raro em casos do tipo.

Conquistada a desapropriação, o Ministério dos Direitos Humanos deve custear a reforma do prédio. A gestão será compartilhada entre o órgão da União e diferentes entidades da sociedade civil. “O desafio é tornar este projeto algo aberto. Não queremos que exista uma apropriação política restrita do que foi a resistência à ditadura”, afirma Christine.

Operação Condor

A meta do Comitê Carlos de Ré, que iniciou o movimento pela desapropriação do Dopinha ainda em 2012 e atualmente já realiza atividades no local, é fazer com que o local se torne um centro de referência internacional na área. Numa reunião entre autoridades da área dos direitos humanos de países do Mercosul, ficou definido que um memorial deverá ser construído em Porto Alegre com o tema “Operação Condor”, aliança entre as diferentes ditaduras militares da América do Sul, que resultou em inúmeras mortes de integrantes de organizações de resistência armada e sequestros de militantes, como o conhecido caso dos uruguaios Lilian Celiberti e Universindo Diaz.  O futuro Centro de Memória Ico Lisboa deve oferecer espaço para a iniciativa, o que possibilitará a ampliação de apoio e, por consequência, mais investimentos.

Vereador de Porto Alegre envolvido com a causa, Pedro Ruas (PSOL), que também compõem o Comitê Carlos de Ré, indica que entidades como a Associação Riograndense de Imprensa (ARI), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) estão sendo chamadas para discutir o projeto do memorial. “Vai haver uma pluralidade muito grande, mas sem o lado opressor, da repressão, dos torturadores, é bom deixar isso claro”, assegurou.

Segundo Ruas, o projeto deve chegar à Câmara no início de agosto e, assim que for aprovado, o antigo Dopinha, mesmo que a reforma não ocorra imediatamente, passará a receber atividades.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.

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