MPF ingressou com ação para fazer cessar a conduta ilegal, pois somente a aplicação de multas não está sendo capaz de impedir a destruição das rodovias federais e os riscos aos demais usuários
Paracatu. A empresa paulista Votorantim Metais está sendo alvo de uma ação do Ministério Público Federal (MPF) por ter violado as normas que regulam o transporte de cargas em território brasileiro. Isso porque, nos últimos dois anos, caminhões da Votorantim Metais foram flagrados 1.981 vezes por balanças fixas e móveis transportando carga com peso acima do permitido.
Mais impressionante ainda é que esse número de autuações originou-se de equipamentos instalados em curtíssimo trecho da malha rodoviária brasileira: apenas nas rodovias federais que passam pelos municípios de João Pinheiro e Paracatu, na região Noroeste de Minas Gerais.
De 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2012, as balanças do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) registraram 391 infrações praticadas pela Votorantim; no mesmo período de 2013, o número de autuações subiu para 1.590. A diferença é que, se em 2012, as infrações foram registradas por balanças instaladas em rodovias federais próximas às cidades de João Pinheiro e Paracatu, os números de 2013 dizem respeito apenas às autuações registradas pela balança de João Pinheiro. Mesmo assim, foram quase cinco vezes maior do que o total do ano anterior.
“Ou seja, é evidente o flagrante e crescente desrespeito, pela Votorantim Metais, à legislação que regula o transporte de cargas e estabelece limites para o peso transportado em nossas rodovias. Se a cada ano o número de autuações cresce drasticamente, torna-se evidente a obtenção de lucros abusivos à custa de toda a sociedade, bem como a necessidade de tutela do Poder Judiciário, pois a mera atuação administrativa, por meio da imposição de multas, não tem se mostrado suficiente”, afirma o procurador da República José Ricardo Teixeira Alves, autor da ação.
Ele relata que, na tentativa de amenizar os prejuízos já causados ao patrimônio público federal, o MPF realizou reuniões com representantes da empresa para analisar e discutir a possibilidade de formulação de acordos extrajudiciais que fizessem cessar a conduta ilegal e estabelecessem medidas compensatórias para os danos já causados. A Votorantim Metais, no entanto, se recusou a celebrá-los.
Para o procurador da República, ficou evidente que “não se trata de falta de conscientização, mas de uma prática que visa obter o maior lucro possível a qualquer custo, em especial às custas dos interesses difusos e coletivos, que são normalmente mais difíceis de serem percebidos pela sociedade e de desencadearem alguma reação por parte dela. Por isso, diante da intransigência da empresa, que se traduz mesmo em ato de desobediência civil, já que ela se recusa a cumprir a legislação pertinente, não tivemos outra saída a não ser ingressar em juízo para obter uma ordem que os impeça de continuar trafegando com excesso de peso”.
Concorrência desleal – A ação do MPF reitera fatos notoriamente conhecidos, como as consequências do excesso de peso sobre a vida útil das rodovias federais, assim como dos riscos para a segurança dos usuários e dos danos ao meio ambiente e à ordem econômica.
Um desses fatos, sempre citados quando se fala no assunto, é o de que veículos de carga trafegam pelas rodovias brasileiras com sobrepeso de 10 a 30%. Este excesso, seja do peso por eixo, do peso do peso bruto total ou da capacidade máxima por tração, ocasiona o desgaste prematuro do pavimento asfáltico e das estruturas da rodovia. Na verdade, um excesso médio de 10% de peso por eixo reduz em até 40% a vida útil projetada para o pavimento.
“Na prática, significa dizer que uma rodovia reformada para durar 10 anos acaba durando apenas seis. Com isso, a União é obrigada a despender novos recursos, em regra, milionários, para restaurar o bem público que foi destruído por interesses genuinamente privados”, lembra o procurador da República José Ricardo Teixeira. “Isso porque a lógica do excesso de peso segue a da obtenção do maior lucro possível, e a verdade é que as empresas abarrotam seus caminhões com carga acima dos limites permitidos apenas para transportarem quantidade maior de material em número menor de viagens. Ou seja, elas ainda estabelecem uma concorrência desleal em relação a outras empresas que resolverem cumprir a lei”.
A ação registra que o Manual de Estudos de Tráfego elaborado pelo Dnit enumera diversas consequências decorrentes do excesso não só do peso por eixo, mas também do peso bruto total, entre elas, o desgaste dos componentes do próprio veículo, como eixos, molas e freios, aumentando o risco de acidentes, e o comprometimento das estruturas das rodovias.
“A conduta adotada pela ré deteriora o piso asfáltico da rodovia, diminuindo seu tempo de vida útil, e causa-lhe danos imediatos como buracos, fissuras, lombadas e depressões, imperfeições no escorrimento das águas e deterioração dos acostamentos, que passam a ser utilizados como pista de rolamento. Além disso, pelas péssimas condições em que deixam a rodovia, torna o serviço público de transporte interestadual e intermunicipal bem mais lento, gerando atrasos, estresses, danos nas bagagens e nos demais veículos e toda sorte de contratempos aos demais usuários”, lembra o MPF.
Roubo de cargas – O transporte de cargas com excesso de peso também “aumenta o número de acidentes, inclusive os com vítimas fatais e a gravidade das lesões, dado que o veículo com excesso de peso tem o seu sistema de frenagem absolutamente comprometido e sua massa exponencialmente elevada. A baixa velocidade com que trafegam nas subidas e a alta velocidade aliada à dificuldade de frenagem nas descidas (que fazem com que forcem passagem – empurrem – os motoristas de carros menores que trafegam em velocidade normal) geram ainda estresse aos demais usuários e elevados riscos de acidentes”.
O MPF destaca ainda outro efeito adverso: “a baixa velocidade com que trafegam nas subidas e os danos causados ao pavimento asfáltico (buracos), que forçam os motoristas a trafegarem, em certos trechos, em velocidades muito baixas, facilitam a atuação de ladrões no furto e roubo de cargas e pertences pessoais de passageiros. Aliás, essa situação concreta era constantemente verificada na BR-040 próximo ao município de João Pinheiro/MG”.
Pesam também contra o transporte de cargas com excesso de peso os danos causados ao meio ambiente, pelo aumento do consumo de combustíveis fósseis não renováveis e pela liberação acentuada de fumaça e gás carbônico.
Para o Ministério Público Federal em Paracatu/MG, é evidente que a conduta da ré gera enorme dano à coletividade, impondo-se a obrigatoriedade de repará-lo, pois a “empresa contribuiu e continua a contribuir para a destruição, inutilização e deterioração de rodovias federais que cortam esta região, pondo em risco a vida das pessoas e o patrimônio público e privado”.
Pedidos – A ação pede que a Justiça Federal, além de proibir a Votorantim Metais de continuar trafegando com excesso de peso, condene-a a pagar a quantia de R$ 1.981 milhões de reais a título de indenização por dano material, bem como igual valor, no mínimo, por dano moral coletivo pela violação ao patrimônio público federal; ao direito à vida, à integridade física e à saúde dos demais usuários da rodovia; à segurança pessoal e patrimonial; ao meio ambiente e à ordem econômica e concorrencial.
(ACP nº 1264-91.2014.4.01.3817)
Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal em Minas Gerais