CE – Carta de Apoio ao Acampamento Zé Maria do Tomé na 2ª etapa do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi

ZE-TOME-PROTESTO

Pela suspensão imediata da ação de reintegração de posse

Pela abertura imediata da mesa de negociação com o Ministério da Integração Nacional e atendimento da pauta de reivindicação dos acampados

O DNOCS redefiniu a vida das famílias de agricultores que viviam na Chapada do Apodi nos anos 1980, quando instalou o Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi (PIJA), no Estado do Ceará, e ameaça fazer o mesmo com a implementação do Perímetro Santa Cruz do Apodi, no Rio Grande do Norte. São estruturas construídas com recursos públicos que prometem o desenvolvimento para a região, mas, na verdade, são planejadas e implantadas, prioritariamente, para as empresas do agronegócio, atraídas com facilidades e isenções oferecidas pelos governos federais e estaduais.

No caso do Perímetro Jaguaribe-Apodi, após sua implantação e operação, em fins da década de 1980, ocorreu a expropriação de parte significativa de agricultores familiares e camponeses da Chapada, que antes produziam alimentos e mantinham relações de identidade com o território. Dos 316 agricultores que conseguiram entrar no projeto irrigado, 255 foram expulsos com o passar dos anos, ou seja, 81% foram expropriados, segundo estudo realizado pela Universidade Estadual do Ceará/FAFIDAM. Entre as causas do processo de expropriação podemos apontar os critérios “excludentes” e desiguais de permanência no projeto; a ausência de políticas de públicas de apoio à agricultura familiar camponesa; a imposição de um modelo de monocultivo intensivo, químico-dependente, alheio à realidade produtiva anterior, bem como os custos de produção no Perímetro, restando-lhes migrar para tentar a vida em outro lugar, ou tentar sobreviver ali, subordinando-se a empregos do agronegócio, num doloroso processo de proletarização precarizada e de destruição do modo de vida camponês.

As precárias condições de trabalho oferecidas nestas empresas, produtoras de commodities para exportação, são traduzidas em contratos de trabalho temporário, baixa remuneração, intenso esforço físico em longas jornadas de trabalho, onde impera a cobrança de elevadas metas de produtividade. Do ponto de vista da saúde, além do desgaste pela intensificação do trabalho, isto significa diferentes formas de humilhação como assédio organizacional e moral, relatado por mais de 40% dos trabalhadores entrevistados em pesquisa realizada pela Universidade Federal do Ceará, além de intensa exposição a agrotóxicos, não só no trabalho, mas também nas comunidades do entorno. A pesquisa supracitada revela ainda que 99,1% dos trabalhadores do agronegócio são expostos aos agrotóxicos, em sua maioria (65,8%) extremamente tóxicos ou muito tóxicos, que estão relacionados aos 38% a mais de taxa de mortalidade por câncer constatada na região da Chapada do Apodi/CE.

Estes mesmos agrotóxicos contaminam a água de abastecimento das comunidades da região. De acordo com estudos da UFC, 100% das amostras mostravam a presença de pelo menos três venenos diferentes. Além de contaminada, a água agora falta nos poços das famílias, em consequência do alto volume exigido para a produção nas monoculturas e exportado através frutas, com base nos estudos da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (COGERH).

Sem terra e sem água, as famílias assistem, há mais de uma década, a invasão das terras e ao uso abusivo da água pelas empresas, acompanhada da exploração dos trabalhadores e trabalhadoras e de intensa violência, resultando inclusive na morte de agricultores que se opunham ao projeto do agronegócio, como foi o caso de Zé Maria do Tomé. Famílias que veem seus filhos indo embora para o sudeste, em busca de perspectivas de futuro, haja vista o avanço das drogas entre a juventude oprimida.

A situação é ainda pior em virtude da apropriação ilegal de terras por parte das grandes e médias empresas, tanto na área piloto e primeira etapa, como na área correspondente a 2ª etapa do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi, processo que levou a expropriação de 81% (do total de 316) dos pequenos agricultores do projeto, segundo pesquisas da FAFIDAM/UECE. INVASÃO é a conclusão do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS) sobre essas ilegalidades, em estudo determinado pela Justiça Federal em 2009: dos 10.000 hectares do PIJA, 4.000 foram invadidos e grilados, com destaque para empresas transnacionais e nacionais, tais como: Del Monte – 1223,27ha, Banesa – 356,74ha, Frutacor – 284,29.

Produzindo esta informação e ciente da invasão, desde 2009, o DNOCS não impetrou nenhuma ação de reintegração de posse para determinar a saída dessas empresas das áreas públicas, além de descumprir a determinação judicial de destinação de 1000 ha de terras para a agricultura familiar camponesa, não levando em conta a função social da terra.

Contraditoriamente, após dois dias de ocupação legítima das terras pelas famílias da Chapada do Apodi, a Federação das Associações do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi (FAPIJA), tendo ao lado a Procuradoria do DNOCS, conseguiu liminar expedida em caráter de urgência, para, com uso da força policial, expulsar as mais de 800 famílias camponesas que afirmam seu direito às terras da segunda etapa do perímetro, de forma independente da FAPIJA, e reivindicam:

1. Destinação de toda a área que compreende a 2ª Etapa do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi para a agricultura familiar camponesa, de base agroecológica.

2. Independência do conjunto de regras e normas previstas na Leide Irrigação, a exemplo da licitação como forme de acesso a terra.

3. A terra deve pertencer a uma entidade coletiva (ex. cooperativa), com uso individual dos lotes, inibindo o mercado de terras na área conquistada.

4. A área deve ter uma dupla organização espacial:

4.1. Área de moradia e de produção – para os agricultores que não dispõem de moradia própria e adequada

4.2. Área de produção – para os agricultores que já dispõem de moradia própria e adequada nas suas respectivas comunidades.

5. Entrega e garantia de manutenção de toda infraestrutura necessária (sistema de irrigação, casa de bombas, galpão, maquinaria, energia elétrica, implementos agrícolas, etc) para moradia e produção, sem quaisquer ônus para os agricultores;

6. Garantia de Assistência Técnica permanente e de forma coletiva, que respeite e dialogue com as técnicas de convivência com o semiárido e com a agroecologia;

7. Permanência das comunidades localizadas na área do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi, que ainda não possuem a titulação de suas terras, a exemplo de Ipu, Maracajá, Cabeça Preta e Tomé.

É inadmissível que o Estado, governado pelo Partido dos Trabalhadores, se coloque a serviço do agronegócio, negando aos agricultores (as) o direito a terra, a água e a condições dignas de vida.

Exigimos do Ministério da Integração Nacional um diálogo lúcido com os movimentos sociais que representam estas famílias, com suspensão imediata da liminar de reintegração de posse que ameaça a segurança e a vida das famílias acampadas e dispostas a resistir no atendimento imediato de todas as suas reivindicações.

Ademais, demandamos que este modelo perverso materializado pelo agronegócio na Chapada do Apodi/Ceará não seja replicado no Rio Grande Norte, devendo a estrutura do Perímetro Irrigado Santa Cruz do Apodi (terra, água, energia elétrica, assistência técnica, etc.) ser destinado à agricultura familiar, garantindo a permanência das comunidades na área do projeto.

Assinam:

Movimentos Sociais, Entidades e Instituições:

  • Cáritas Diocesana de Limoeiro do Norte
  • Conselho Indigenista Missionário – Equipe Itabuna
  • Conselho de Cidadania Permanente – Itabuna
  • Seminario Justicia Ambiental- Universidad Nacional de Córdoba – Argentina
  • Paróquia Nossa Senhora das Brotas – Tabuleiro do Norte (CE)
  • Centro Acadêmico Dias da Rocha – Agronomia UFC
  • Anel – Assembleia Nacional dos Estudantes Livre
  • FEAB – Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil
  • AEcuador
  • CEPEDES
  • Articulação Nacional de Agroecologia
  • ADUFC – Associação dos Docentes da Universidade Federal do Ceará
  • Abrasco – Associação Brasileira de Saúde Coletiva
  • Programa Residência Agrária – PRA/UFC
  • Articulação de Psicanalista e Psicólogos/as Iara Iavelberg (Arpia)
  • SINDSIFCE – Sindicato dos Servidores do Instituto Federal do Ceará

Companheiros(as) de Luta:

  • Maria Ozirene Maia Vial – Professora do curso de Licenciatura em Biologia do Instituto Federal do Ceará – Campus Jaguaribe
  • Juliana de Carvalho Gaeta – Bióloga – Mestre em Ciência Marinha Tropical pela Universidade Federal do Ceará.
  • Franck Ribar – Professor Doutor do curso de História da Universidade Federal do Ceará (UFC)
  • Professor Doutor Gerson Machado – Especialista Cultural/Educador -Fundação Cultural de Joinville/ Museu Arqueológico de Sambaqui de Joinville
  • Elisa Rodrigues Dassoler – Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
  • Frederico de Castro Neves, Professor doutor do curso de História da Universidade Federal do Ceará (UFC).
  • Fernando Ferreira Carneiro – Coordenador do GT de saúde e Ambiente da ABRASCO – professor do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UNB)
  • João Alfredo Telles Melo – Vereador – PSOL Fortaleza – Presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara Municipal de fortaleza. Professor de Direito Ambiental
  • Helena Selma Azevedo – Professora da Universidade Federal do Ceará, Presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar do Ceará
  • Tania Pacheco – blog Combate Racismo Ambiental
  • Larissa Mies Bombardi – professora do Departamento de Geografia – FFLCH – da Universidade de São Paulo (USP)
  • André Campos Búrigo – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz.
  • Carlos Henrique Moura Barbosa, Doutorando em História da Universidade Federal de Santa Catarina e professor de História
  • Epitácio Macário – Professor da Universidade Estadual do Ceará (UECE) – Integrante da Associação Nacional dos Docentes de Ensino Superior – Sindicato Nacional (ANDES-SN)
  • Camila Dutra dos Santos – Doutoranda em Geografia na Universidade Estadual do Ceará (UECE)
  • Morgana Melca Braga Sampaio- estudante de Especialização em Gestão Pública- Universidade Estadual do Ceará (UECE)
  • Eraldo Paulino, jornalista e assessor de comunicação da Cáritas Diocesana de Crateús (CE)
  • Amanda Nunes Diógenes – Bióloga – Ceará
  • Virginia Pinheiro Gurgel – Estudante do curso de Tecnologia em Saneamento Ambiental do Instituto Federal do Ceará
  • Mário Martins Viana Júnior – Prof. Dr. do Departamento de História – Universidade Federal do Ceará – Coordenador do Projeto “Memórias das Comunidades impactadas pelos Perímetros Irrigados no Ceará
  • Natalha Nayane de Oliveira Pinheiro – Estudante de Farmácia da Universidade Federal do Ceará
  • Rosemeri Moreira – Professora do Curso de História UNICENTRO – Guarapuava – PR
  • Josefa Jéssica Macena Alves – COCEPAT (Cooperativa Cearense de Prestação de Serviços e Assistência Técnica LTDA) – Tecnóloga em Saneamento Ambiental (IFCE)
  • Francisco Alison de Maria – Estudante de Ciências Sociais (UFC)
  • Juliana Magalhães Linhares – Mestre em História – Professora na Universidade Estadual Vale do Acaraú
  • Alfredo Ricardo Silva Lopes – Doutorando pela Universidade Federal de Santa Catarina
  • Marcelo Castro – Sociologo
  • Soraia Carolina de Mello, professora, doutoranda em História Cultural na Universidade Federal de Santa Catarina
  • Luiz Antonio Araújo Gonçalves – Geógrafo e Professor Substituto da Universidade Estadual do Ceará – UECE
  • Monte Alverne Queiroz Fraga – Padre da Paróquia Nossa Senhora das Brotas
  • Alexandre Pessoa Dias – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz
  • Paulo Petersen – Agrônomo, Coordenador-Executivo da AS-PTA, Rio de Janeiro-RJ
  • Aterlane Martins, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará – IFCE, Quixadá – CE
  • Diego Hermys de Souza Vieira – Bacharel em Ciências Contábeis
  • Maxime Toutain, doutorando de Antropologia Social na Universidad de Toulouse II Le Mirail (France)
  • Renata Brauner Ferreira, Dra em Planejamento Urbano pela UFRJ e Professora de História da FURB – Blumenau
  • Bruno Eduardo de Souza Barbosa – Biólogo, Bacharel em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Ceará (UFC)
  • André Machado Camurça – Secretaria Nacional da RBJA – Mestra em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela UFC
  • Ruben Siqueira – CPT/BA e Articulação Popular -São Francisco Vivo
  • Denis Monteiro – Secretário Executivo (Articulação Nacional de Agroecologia)
  • Adolfo Maldonado, Clínica Ambiental, Ecuador
  • Hermano Albuquerque de Castro – Pesquisador Titular Fiocruz – Diretor da ENSP/Fiocruz
  • Marcelo Firpo Porto – Pesquisador Titular Fiocruz
  • Andrew Toshio Hayama – Defensor Público do Estado de São Paulo
  • Ana Cláudia de Araújo Teixeira – Professora Visitante do Departamento de Saúde Coletiva, Universidade de Brasília
  • Gleudson Passos Cardoso (Curso de História/ UECE)
  • Viviane Teixeira Silveira – Profª Dra na UNEMAT/Universidade do Estado de Mato Grosso/MT
  • Daniel Italo Alencar Barros – Professor de História do Estado do Ceará – Mestrando em Psicologia Social – UFC
  • Ana Caroline Peres Serra – Psicóloga – Universidade Federal do Ceará – Fortaleza/CE
  • Gerson Galo Ledezma Menezes – professor efetivo no Curso de História- América Latina na Universidade Federal da Integração Latina-Americana (UNILA)
  • Mel Simionato Marques, bióloga e mestre em Botânica pela Universidade Federal de Santa Catarina
  • Ana Maria Veiga – Universidade Federal de Santa Catarina
  • Paulo André Sousa Teixeira – Psicólogo MPPE e TJPE, mestre em Psicologia pela UFPE, Recife – PE
  • Patrícia Pereira Xavier – Mestre em História Social e Mestre Profissional em Preservação do Patrimônio Cultural -Fortaleza/CE
  • Marcia Lorena Bezerra Peixoto – Instituto Federal do Ceará
  • João Paulo Brilhante Barbosa – Professor (licenciado em História) – Universidade Federal do Ceará (UFC)
  • Diego Gadelha – Professor do Instituto Federal Ceará – Membro do Grupo de Estudos e Práticas em Agroecologia e Convivência com o Semiárido – Membro da Diretoria do Sindicato dos Servidores do Instituto Federal (SINDSIFCE)
  • Marcelo José Monteiro Ferreira – Professor do Departamento de Saúde Comunitária/Faculdade de Medicina – Universidade Federal do Ceará. Membro do Núcleo TRAMAS/UFC

DADOS PARA NOVAS ASSINATURAS:

RECEBEMOS ASSINATURA DE ENTIDADES, SINDICATOS, MOVIMENOS SOCIAIS, INSTITUIÇÕES

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Comments (1)

  1. Sou Professor Titular de História e Física da UECE, aposentado. Tenho acompanhado o drama e desrespeito que as comunidades agrárias que praticam há décadas uma agricultura familiar estão a viver na serra do Apodi – CE. Conheço o estudo e pesquisa feita pela Profª. Dra. Raquel Rigotto e seu grupo de pesquisa e como ela e os membros do grupo de pesquisa foram perseguidos pelas empresas multinacionais e nacionais que exploram e matam os trabalhadores rurais daquela região, inclusive grilando as terras do perímetro de irrigação sob a responsabilidade do DNOCS. DOU TOTAL APOIO A ESSES TRABALHADORES e gostaria que a Justiça Brasileira desse um jeito no descaso com que são tratadas as pessoas que compõem o grupo de agricultores que continuam na luta, praticamente sem apoio dos governantes, sejam eles da esfera municipal, estadual e federal.

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