Racismo na USP: A Universidade e seu racismo institucional

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Mesmo com a carteirinha da USP em mãos, Mônica foi impedida de entrar. Enquanto isso, outras pessoas – brancas – entravam no prédio sem nem se identificar

Natália Natarelli, fotos de Roberto Brilhante – Carta Maior

Nesta terça-feira, 13 de maio, 126 anos depois da abolição da escravidão no país, alunos da Universidade de São Paulo fizeram um ato contra o racismo na Faculdade de Medicina da USP. No dia 30 de abril, Mônica Mendes Gonçalves, aluna negra da Faculdade de Saúde Pública, foi barrada pelos seguranças do prédio da Faculdade de Medicina. Mesmo com a carteirinha da USP em mãos, a aluna foi impedida de entrar sob o argumento de que apenas alunos de medicina poderiam entrar no prédio. Enquanto isso, outras pessoas – brancas – entravam no prédio e uma delas nem se identificou. Depois de muita insistência, Mônica foi escoltada pelo segurança para dentro do prédio até o local onde já estavam seus colegas do curso de Saúde Pública (que não haviam sido barrados).

O caso se enquadra no chamado “racismo institucional”. No Brasil, o Programa de Combate ao Racismo Institucional (PCRI) implementado em 2005 definiu o termo como “o fracasso das instituições e organizações em prover um serviço profissional e adequado às pessoas em virtude de sua cor, cultura, origem racial ou étnica. Ele se manifesta em normas, práticas e comportamentos discriminatórios adotados no cotidiano do trabalho, os quais são resultantes do preconceito racial, uma atitude que combina estereótipos racistas, falta de atenção e ignorância. Em qualquer caso, o racismo institucional sempre coloca pessoas de grupos raciais ou étnicos discriminados em situação de desvantagem no acesso a benefícios gerados pelo Estado e por demais instituições e organizações (CRI, 2006, p.22). É o caso de Mônica que, mesmo com a carteirinha da USP em mãos, não conseguiu entrar no prédio.

A Faculdade de Medicina, por sua vez, abriu uma sindicância para averiguar o caso, mas tratou-o como pontual. “A FMUSP abriu uma sindicância e houve uma nota do Departamento de Medicina Preventiva, porém eles tratam essa questão como um fato isolado. Há um repúdio a atos racistas, mas não assumem que há racismo institucional. Não há uma discussão sobre o que é isso. Nós estamos falando de instituições que operam numa lógica de tratamento desigual entre pessoas pretas e brancas. É necessário debater o racismo. Por que o segurança parou a Mônica? Porque ela é preta e porque tem 0% de pretos na FMUSP”, disse Miguel Ângelo Sena da Silva Junior, membro do Centro Acadêmico Emílio Ribas da Faculdade de Saúde Pública e do Fórum de Hip Hop Municipal de São Paulo.

O ato contou com cerca de 30 pessoas que fecharam a Avenida Dr. Arnaldo por 15 minutos e depois entraram na Faculdade de Medicina. Os estudantes colaram cartazes em frente ao busto do médico Arnaldo Vieira de Carvalho, fundador da faculdade, com os dizeres “Racismo, pode isso Arnaldo?”, “Vandalismo é o racismo da FMUSP”, entre outros. Depois fizeram um círculo e várias falas condenando o caso e chamando atenção para o genocídio da juventude negra, a falta de acesso aos espaços públicos (incluindo a universidade) e sua elitização, o vínculo que a FMUSP tem com o Instituto Médico Legal (IML) e a implementação de cotas raciais nas universidades estaduais paulistas.

Mônica Mendes Gonçalves, estudante de saúde pública que foi vítima do racismo institucional
Mônica Mendes Gonçalves, estudante de saúde pública que foi vítima do racismo institucional

“A própria instituição está organizada para barrar preto e isso começa no vestibular. Se a Faculdade de Medicina é contra o racismo, que se coloque a favor das cotas raciais. Vários outros institutos iriam apoiar se isso acontecesse, mas a elite branca não quer perder seus privilégios”, disse Miguel em sua fala. A professora Laura Feuerwerker, da Faculdade de Saúde Pública, também se pronunciou no ato repudiando o ocorrido e dizendo que, apesar dos professores da Saúde Pública sempre terem feito o debate sobre o racismo, foi somente a partir da presença de alunos negros no curso que os temas realmente começaram a ser debatidos. Ela também comentou que a USP tem uma política retrógrada na inclusão de pretos e pobres entre seus estudantes. O curso de Saúde Pública é o que, proporcionalmente ao número de vagas, tem mais negros na USP. São cerca de 20% por turma segundo dados da Fundação Universitária para o Vestibular (FUVEST) Enquanto isso, nenhum estudante preto entrou em medicina no vestibular de 2013, também segundo a FUVEST.

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