Marcos Tupã: Dia do Índio para quem?

Campanha Guarani - banner

Hoje é a data que os brancos chamam de Dia do Índio. Todo ano, é só em 19 de abril que somos lembrados. Nas escolas, falam de nós como se fôssemos algo apenas do passado, lamentando o mal que foi feito aos nossos povos, mas fazendo as crianças brancas se conformarem com nosso extermínio, acreditando que não haja mais espaço para nós, que os índios não existem nem devem mais existir.

Os governos, por sua vez, tentam promover festas neste dia nas nossas aldeias, querendo fazer a gente comemorar, quando não há motivo para isso. Não aceitaremos mais.

Não aceitaremos que lamentem o mal que fizeram aos nossos antepassados só neste dia e no resto do ano continuem a se orgulhar dos bandeirantes que nos massacraram e que dão nome a monumentos, estradas e até ao palácio do governador. Não aceitaremos que finjam lamentar, enquanto tratam por santo um padre como José de Anchieta, que manifestava orgulho em colocar nossos parentes uns contra os outros e aprendia nossa língua para tentar destruir nossa cultura.

Foi por isso que, na última quarta-feira, nós indígenas guarani-mbya de todas as aldeias de São Paulo retomamos pacificamente o Pateo do Collegio, local onde os brancos se fixaram para começar a tomar posse das terras que eram do nosso povo.

Fizemos isso para anunciar que ainda estamos vivos e precisamos da demarcação das nossas terras, mesmo que isso desagrade alguns. Hoje é um dia qualquer pra nós, pois Dia do Índio será apenas aquele em que o ministro José Eduardo Cardozo, da Justiça, assinar o documento que garante a demarcação das nossas terras tradicionais.

Nossas terras não são mais onde hoje é o centro da cidade, não são no Pateo do Collegio, pois esse lugar já foi tomado por vocês há muito tempo e não vamos nunca pedir de volta. Elas ficam nas margens da metrópole, onde ainda resta um pouco das matas onde sempre vivemos.

Habitamos as terras indígenas Jaraguá e Tenondé Porã, uma no pico do Jaraguá e outra no extremo sul da Grande São Paulo. Há muito tempo é lá que estamos para poder viver em paz a nossa cultura, apesar de muitos de vocês não saberem, mesmo estando tão perto de nós.

Foi por isso que, ao desocupar o Pateo do Collegio, devolvendo-o aos mesmos brancos que tomaram de nós esse local há mais de 500 anos, lançamos publicamente uma grande campanha para pedir que o governo dos brancos também nos dê de volta ao menos essas terras onde vivemos hoje.

Muitos apoiadores não-indígenas compareceram para apoiar nosso evento, o que nos faz saber que nem todos os não-indígenas carregam o espírito dos bandeirantes. Alguns se sensibilizam conosco e não se esqueceram de que nós somos os habitantes originários de São Paulo, mesmo que ainda não tenhamos nossas terras demarcadas. Agradecemos profundamente a essas pessoas.

A nossa luta agora é para que o ministro da Justiça também se lembre da verdade e assine o documento que falta para demarcar as terras indígenas Jaraguá e Tenondé Porã, já reconhecidas pela Funai (Fundação Nacional do Índio).

No dia 24 de abril, faremos novo ato em São Paulo. Esperamos receber a solidariedade de muito mais apoiadores, para mostrar ao governo que não estamos sozinhos, que a maioria da população não-indígena sabe que somos os habitantes originários deste país e que temos direito de ter garantidas as terras que precisamos para manter a nossa cultura milenar e dar um futuro digno às nossas crianças.

Aguyjevete!

MARCOS DOS SANTOS TUPÃ, 43, liderança guarani-mbya da aldeia Guyrapaju, localizada na terra indígena Tenondé Porã, é Coordenador da Comissão Guarani Yvyrupa

JERA GISELDA PIRES DE LIMA, 32, liderança guarani-mbya da aldeia Kaliptoty, localizada na Terra Indígena Tenondé Porã, é vice-diretora da Escola Estadual Guyrapepó

DAVID MARTIM KARAI POPYGUA, 26, liderança guarani-mbya da aldeia Ytu, localizada na terra indígena Jaraguá

Comments (1)

  1. É isso aí! Sou “branca” (aparência, mas tenho misturas no sangue, inclusive índio), mas uma das coisas q mais me entristece é a situação de vários índios, como os q vejo em Curitiba, na rodoviária… Essa coisa de terra improdutiva é desculpa pra tomar a terra de vcs, pois se forem índios q tiram o sustento da própria terra e isso inclui ter q preservá-la tb, essa lei acaba sem fundamento. Mesmo a terra n sendo economicamente produtiva, é usada por vcs, então está sendo produtiva de alguma forma.

    Sabemos q mtos fazendeiros (mtos artistas gananciosos tb, espertinhos) tem propriedades enormes em nem toda extensão é produtiva, colocam uns boizinhos p dizer q é criação de gado extensivo, mas é obvio q comprar terras se tornou uma maneira de acumular bens de grande valor e n apenas pra produzir. Por isso essa briga toda e de gente poderosa. É mta ingenuidade quem cai nessa de que toda propriedade de fazendeiros é inteiramente produtiva, fora a degradação q causam com essa produtividade q visa qse sempre só lucro. Qndo n tiver mais nada quero ver…

    Se esse fosse o problema mesmo, o governo poderia apoiar e criar projetos para inserir o índio na economia por meio, por exemplo, de cooperativas com produtos agrícolas e de artesanato, etc, de preferencia que remetessem, mostrassem e ajudassem a preservar a cultura de vcs. Mas há uma tentativa de exterminar essas culturas e todas que vão contra esse sistema q vivemos (me refiro ao sistema como um todo, mesmo nos locais como China, supostamente n capitalista, o sistema se mostra tb cruel, excluidor e exploratório). Isso no mundo inteiro!

    Força e q os espíritos na natureza ajudem vcs!

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.