Tsitsina Xavante participa da 58º Sessão da Comissão de Condição Jurídica e Social da Mulher/CSW na ONU

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Samantha Ro’otsitsina de C. Juruna (Tsitsina Xavante), da Aldeia Namunkurá – Terra Indígena São Marcos, Mato Grosso, bacia Amazônica, bioma cerrado, participou da 58º sessão da Comissão de Condição Jurídica e Social da Mulher/CSW, na sede das Nações Unidas ONU em Nova York, EUA, entre os dias 10 a 21 de março, onde foi abordado o tema “Desafios e avanços na aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio para mulheres e meninas”, e paralelamente as mulheres indígenas puderam demonstrar os desafios e avanços relacionados ao tema da conferência.

A indígena brasileira foi uma das 10 selecionadas pelo Fórum Internacional de Mulheres Indígenas/FIMI com apoio da ONU MULHER através da bolsa “Yvone Herbert”, da qual foi realizada uma convocação de jovens e mulheres indígenas das 07 regiões de atuação da ONU, da qual ela foi informada por mensagens compartilhadas nas redes sociais e email sobre a seleção.

A Xavante é membro da Comissão Nacional de Juventude Indígena/CNJI e é uma das organizadoras da Rede de Juventude Indígena/REJUIND, ferramenta criada pelos jovens para facilitar a comunicação pela internet e divulgação dos assuntos relacionados aos jovens indígenas.

Quanto à questão da mulher indígena brasileira, Tsitsina disse que houve muitos avanços ao passo que a sociedade debate os seus direitos e amplia o acesso à informação, e destaca que há muito a melhorar, pois “as agressões a nós mulheres, em toda nossa geração (meninas, juventude e anciãs) está ocorrendo em toda extensão do território brasileiro – violências físicas, psicológicas, verbais, abuso e exploração infantil também ocorrem”.

Conforme Tsitsina, a conferência foi importante para se obter o entendimento de que todos os povos que possuem o pensamento de que “Violentar uma menina e mulher indígena é violentar os direitos dos povos indígenas” estão abertos a melhores ações para proteção aos direitos dos povos e que seria importante que os órgãos nacionais apoiassem as mulheres indígenas em suas representações pois elas não podem ser somente vistas, mas também ouvidas, podendo assim ter avanços e melhores perspectivas relacionados aos próximos congressos na ONU.

Veja a entrevista na íntegra:

– Você faz parte de alguma organização?

Faço parte de organização não formal (jurídica). Sou membro de uma Comissão Nacional de Juventude Indígena/CNJI, criada em 2009, durante o I Seminário Nacional de Juventude Indígena em Brasília – realizada pela FUNAI. Em 2012 o II Seminário Nacional de Juventude Indígena foi realizado por membros da CNJI, e por outros jovens indígenas que acreditaram no protagonismo por nós mesmos povos indígenas, neste segundo momento foi eleita os atuais membros compostos por 10 jovens, sendo 2 por região do Brasil. Compus esses dois momentos, o nosso objetivo não é representar as juventudes indígenas nos diversos espaços, e sim contribuir para a mobilização e articulação em prol dos direitos dos povos indígenas da juventude – compartilhando experiências e ações, para que cada um/povo possa através de intercâmbios seja via rede social ou presencial adquire e amplie possibilidades melhores prol juventude indígena.

No mesmo ano de 2009, criamos a Rede de Juventude Indígena/REJUIND, como meio/ferramenta de está facilitando a comunicação através da internet, até então éramos somente um google groups (gmail) – com o objetivo de apontar as ações/iniciativas da juventude prol direitos dos povos indígenas, bem como assuntos relacionados aos povos indígenas. Um grupo voltado para juventude indígena.

Mas como as redes sociais foram tomando espaço, criamos um grupo aberto com o mesmo nome no facebook, em menos de 1 ano tínhamos mais de 1000 membros. Porém isso levava tempo na questão de aceitação do grupo(olhar o perfil para saber se realmente a pessoa tem pensamentos/ações em comuns com o objetivo do grupo). Diferente do google groups o grupo/facebook visava ampliar discussões com os não indígenas, aqueles que apoiam a causa. Diante desse tempo de ocupação aos moderadores do grupo, criamos a página de comunidade com o mesmo nome, facilitando alimentar a página, com informações, cabendo a cada interessado (a) ao tema curtir a página. (isso está recente janeiro/2014).

Bem agora sim, diante desse breve relato, posso dizer que faço parte de duas mobilizações de juventude indígena, CNJI como membro região centro oeste, e REJUIND como uma das moderadoras, pois temos uma rede de juventude além da REJUIND, que são as mobilizações locais, que enviam informes, fotos, sociabilizam atuação da juventude, e assim podemos postar diretamente citando-as, ou compartilhando temas de interesse para juventude indígena nos aspectos políticos/direitos.

Através dessa atuação na REJUIND, conseguimos ampliar as redes de juventude indígena em âmbito internacional, aumentando meios de conhecimentos sobre outras temáticas que são discutidas e oferecidas em âmbito regional (América do Sul e Caribe) e demais regiões. Tais como cursos, seminários, oficinas, encontros, bolsas – enfim de juventude para juventude, e de povos indígenas para povos indígenas[1].

– Como apareceu a oportunidade para participar do congresso na ONU?

Justamente por essas questões de ampliar a rede, através da REJUIND, e uma parte de atuação pessoal/profissional tive acesso á informação de que o Fórum Internacional de Mulheres Indígenas/FIMI com apoio da ONU MULHER através da bolsa “Yvone Herbert” estavam fazendo uma convocação de jovens e mulheres indígenas das 07 regiões de atuação da ONU, para participar da 58º sessão Comissão de Condição Jurídica e Social da Mulher.

Esta informação além de receber via email por conta de sociabilização de outros indígenas/organizações como Chirapaq (Perú) e grupo de Caucus de Juventude Indígena, tive acesso no próprio facebook em páginas destas organizações e outras redes, e assim também compartilhei e na REJUIND e grupos de jovens (Mato Grosso, Bahia, Pankakaru, Alto Rio Negro, Maranhão) que eu tenho contato direto, e na minha página pessoal – aproveitei e também me candidatei para seleção da bolsa, e fui uma das 10 selecionadas.

– Qual era a pauta do congresso na ONU?

A 58º sessão Comissão de Condição Jurídica e Social da Mulher/CSW – teve como tema: “Desafios e avanços na aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio para mulheres e meninas”.

Os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio/ODM – Post 2015 tem como metas: Erradicação da fome; Educação Básica; Igualdade de Gênero; Redução da Mortalidade Infantil; Saúde Sexual e Reprodutiva; Combater a AIDS; Sustentabilidade Ambiental; Trabalho Decente.

– Como a questão da mulher indígena foi inserida no congresso?

Na verdade a participação de mulheres indígenas em reunião da CSW é recente, somente a 3 edições (que se tem registro), já para 58ª CSW a temática “mulher indígena” pode ser inserida em momentos oficiais da Conferência e nos eventos paralelos através de apoio FIMI, ONU MULHER, ECMIA, Rosa Luxemburgo – no qual organizações que atuam com meninas, jovens  e mulheres indígenas puderam demonstrar os desafios e avanços relacionado ao tema da conferência Objetivos do Desenvolvimento do Milênio – Post 2015.

Porém uma atuação que ainda é preciso ser vista como diferencial, no sentido de que nós mulheres e povos indígenas podemos sim contribuir com o tema, e trazer uma nova reflexão quando se fala das metas a ser alcançada em nível universal.

– Qual a sua visão da mulher indígena no Brasil?

Para esta questão, acredito que vem de encontro do que eu espero para o futuro, respeito por ser jovem, respeito por ser mulher, respeito por ser um povo indígena, por ser Xavante. Essa ótica me remete que temos muitos desafios em relação a equidade, igualdade e empoderamento.

No mesmo sentido, temos avanços, pois a partir do momento que temos oportunidade em discutir politicamente nossos direitos, visando amplitude, na informação e acesso, posso considerar que estamos seguindo para maiores responsabilidades. Afinal quanto mais se tem informação, mais se tem expectativas de melhoria.

Ao mesmo instante, as agressões a nós mulheres, em toda nossa geração (meninas, juventude e anciãs) está ocorrendo em toda extensão do território brasileiro – violências físicas, psicológicas, verbais, abuso e exploração infantil também ocorrem. Como atuar na minimização e erradicação desses fatores, onde muitos dos locais de tais violências estão em contexto local?

Por isso, está na CSW com outras mulheres indígenas, acabei obtendo o seguinte pensamento sistematizando o que todas falaram se suas realidades “Violentar uma meninas e mulher indígena é violentar os direitos dos povos indígenas”, um desafio diante de diversas questões culturais em nossa diversidade de povos indígenas no Brasil – alguns povos com essa esse entendimento amplo e estão abertos para melhores ações aos direitos dos povos, outros no processo de compreensão.

– Como os organismos nacionais e internacionais trabalham esta questão?

Até onde tenho conhecimento, no Brasil os organismos nacionais que atuam ou deveria atuar de forma que oportunize a promoção e empoderamento da mulher indígena, com sua participação plena e efetiva nos espaços nacionais e internacionais são: Fundação Nacional do Índio/FUNAI – ligada ao Ministério da Justiça, e Secretaria de Promoção para as Mulheres/SPM que faz parte da  Presidência da República.

Que fique registrado, não estou dizendo que estes organismos não tem ações a nós mulheres indígenas, sim tem ações, que auxiliam nas atividades propostas por organizações de mulheres indígenas em diversos temas; o que estou apontando são formas de nós mulheres indígenas está nos representando por nós mesmas; ao invés de representantes de governo estarem em espaços nacionais e internacionais falando que  nós mulheres indígenas temos tais e tais ações. Penso eu que poderia ser as mulheres indígenas falando “realizamos, efetuamos, tentamos fazer – com apoio de tal instituição – baseando em direitos garantidos nos marcos legais”. Se isso ocorresse na maioria dos momentos, faria uma grande diferença.

Sobre os organismos internacionais, já não tenho muito conhecimento, pois foi a primeira vez que fui para um momento internacional com o tema mulher, e discutindo alguns momentos mulheres indígenas – e justamente por esta oportunidade, pude constatar que ONU MULHER, e organizações/mobilizações de mulheres indígenas internacionais já tem uma boa participação nos espaços externos, e possibilitando ampliar a participação de nós mulheres indígenas. Exemplo disso foi algumas citações de redes/organizações internacionais que sociabilizam informes e oportunidades.

– O que esperar do futuro relacionado ao tema “Mulher indígena”?

Na minha percepção diante da minha vivência e experiência em diversos espaços de discussão, muitos destes espaços estão sendo ampliados para que nós da juventude e mulheres indígenas possamos está nesse processo de aprendizado e empoderamento no que diz respeito primeiramente aos Direitos dos Povos Indígenas, seja em nível nacional ou internacional.

Diante desse fator, posso dizer eu espero para nosso futuro, o direito da voz, o direito de se manifestar, o direito a aprender, o direito de ter informação e acesso as políticas públicas em nível mais amplo, desde as nossas aldeias e em todos os espaços que percorremos.

Que o futuro possa ser mais igual no sentido de participação e empoderamento da mulher indígena, que possa ser equânime em relação as nossas contribuições nos marcos legais – de que os Estados possam respeitar os marcos já existem como “consentimento, livre, prévio e informado” a nós povos indígenas[2].

De que os povos indígenas possam compreender que violentar uma menina, uma criança, uma mulher indígena é violentar os povos indígenas, de que violentar um marco legal que garante a nossa proteção e promoção seja ela ambiental, territorial, social, cultural, educacional, saúde, soberania alimentar… é violentar uma mulher indígena – pois  se somos mulheres indígenas, é porque somos povos indígenas.

– Quais são suas perspectivas relacionadas ao congresso na ONU e o que esperar daqui para frente?

Acredito que o congresso foi importante para os Estados perceberem de que nós mulheres indígenas somos povos indígenas, diferentemente de alguns discursos por eles proferido nos colocando como “comunidades rurais”, por este motivo vejo com desafio diversos de nossos direitos serem consolidados. O representante do Estado ali presente, ou até mesmo as pessoas/instituições que lidam com a questão de direitos devem respeitar essa nossa especificidade enquanto povos indígenas.

Por este motivo, acredito ser importante a maior participação de mulheres indígenas em congressos como este, onde tem a presença de diversos segmentos de mulheres pelo mundo, bem como Estados presentes. Devemos não somente ser vistas, mas também ouvidas, assim poderemos ter avanços e melhor perspectivas relacionado aos próximos congressos/comissões na ONU.

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