Mais perdas do que ganhos com a Copa

Por Adriano Gianturco*, Espaço Vital

O debate sobre Copa do Mundo e Olimpíadas parece ser muito apaixonado, polarizado e politizado. Mas o que fala o mundo acadêmico, a economia e a ciência política sobre a hospedagem dos grandes eventos esportivos e sua gestão política? Os recursos gastos não são dos decisores, então o mecanismo de incentivos é perverso. A decisão de organizar uma Copa do Mundo é tomada entre políticos, técnicos, lobistas e burocratas e como todas as decisões políticas é uma imposição.

Os impostos são pagos principalmente pela classe média e os lucros vão para o big business da construção civil, para a classe política e para os burocratas envolvidos, constituindo assim uma redistribuição regressiva em favor dos mais ricos. Isso claramente é uma distorção da economia, das relações da sociedade e das suas exigências.

A maioria das análises de impacto só observa custos enfrentados e situação econômica futura. Uma análise de custos-benefícios mais atenta avaliaria o custo de oportunidade desse gasto e de alternativas talvez mais produtivas.

Surpreso que o custo atual superou o prefixado? Seria falta de planejamento? Ou planejamento demais?

Niskanen (1971) já previu e demonstrou que “o custo será, muito provavelmente, maior que o prefixado” porque os tomadores de decisão têm o incentivo a gastar mais.

Imagine que por acaso, perto do prazo final, se descubra que por algum motivo é preciso gastar alguns milhões a mais. Não vamos fazê-lo? Agora que já gastamos tanto? Vamos perder a oportunidade de recuperar algo? Claro que não, vamos gastar ainda mais!

Isso não aconteceu só nos Jogos Pan-Americanos do Rio.

Flyvbjerg e Stewart (2012) demonstram que todas as edições de 1960 a 2012 superaram o orçamento, em média em 179%. As Olimpíadas da Grécia de 2004 deviam inicialmente custar 4,5 bilhões de euros, mas chegaram ao dobro, representando 5% do PIB, sendo esse um dos fatores da recente crise econômica. Os jogos de Londres custaram 276% mais que o previsto.

Shikida (2006) demonstra que para aumentar impostos e gastos é mais fácil fazê-lo no setor do esporte que em outros, porque se trata de uma “atividade escapista”, o ópio do povo. A população tem uma percepção de divertimento e suporta mais facilmente a carga tributária (Puviani, 1917).

O turismo vai aumentar? Não necessariamente, porque ocorre sempre o chamado “efeito crowding out”: enquanto alguns turistas vêm para o evento, outros deixam de vir exatamente por isso e alguns residentes também vão para fora.

Londres atraiu apenas 100 mil turistas em vez dos habituais 300 mil e o Financial Times falou de“cidade fantasma”. As proporções variam e dependem também da temporada: teria sido melhor hospedar os megaeventos durante a baixa temporada, sendo este o período em que a proporção entre turistas que vêm e que deixam de vir é mais favorável (Allmers e Maennig, 2003).

Mas o Brasil vai ter um ganho de imagem no cenário internacional? Depende de como desenrolarem os eventos. Assim que ocorrer o primeiro caso da cotidiana e extrema violência que assola o país, os gringos ficarão chocados.

Mas o PIB vai crescer? Não. Pelo “couch potato effect” várias pessoas ficarão mais perante a tevê que trabalhando, produzindo e gastando. Isso será piorado pelos vários feriados que foram decretados para os dias de jogo da seleção.

O enorme gasto (economicamente não se chama investimento) pode gerar um estímulo da economia? Sim, claro. Trata-se de um estímulo artificial e de curto prazo, que pode até criar um certo desenvolvimento no curtíssimo prazo (embora, segundo a Escola Austríaca de Economia, o crescimento seria maior com uma alocação de mercado), mas que cria uma queda futura, quando a conta chega e o tributado é chamado a pagar.

Trata-se de uma bolha artificial. Todo este processo é chamado “Political Business Cycle”(Nordhaus, 1975). Por exemplo, as Olimpíadas de 1976 em Montreal criaram uma dívida de US$ 2,8 bilhões, que necessitou de 30 anos para ser paga.

As Olimpíadas Invernais de Nagano de 1998 jogaram a cidade em recessão, criando uma dívida de US$ 30 mil por família. Além disso, geralmente os preços, depois desses eventos, ficam mais altos.

Pode-se limitar o dano limitando o gasto (Trovato, 2014), sem construir novos estádios faraônicos e infraestruturas não exatamente essenciais, mas aproveitando os estádios já existentes (Preuss, 2004). Isso foi feito em Los Angeles, em 1984, quando foi utilizado o Los Angeles Memorial Coliseum, construído para as Olimpíadas de 1932.

E pode-se também limitar o número de cidades envolvidas na Copa, lembrando que na África do Sul foram oito e no Brasil serão 12, com relativos problemas adicionais de locomoção, visto o tamanho e a infraestrutura do país.

A alternativa mais eficiente e que gera melhores incentivos seria um sistema livre no qual os interessados aplicassem seus próprios recursos e enfrentassem prejuízos ou lucros de suas decisões. Não é o caso das Olimpíadas que hospedaremos em 2016, que em Chicago foram rejeitadas por 87% dos moradores. Lá, o lema dos protestos era: “They play, we pay !” (Eles jogam, nós pagamos!).

Talvez uma lição que aprenderam com os economistas locais.

*Adriano Gianturco, professor de Ciência Política do Ibmec/MG.

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