ES – Audiência do porto da Manabi reforça caráter contrário ao projeto

manabiApesar das tentativas do Ibama, da empresa e de secretários de Linhares de defender o empreendimento, prevaleceu o coro “Fora, Manabi”

Any Cometti, Século Diário

O projeto do Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) do Porto Norte Capixaba (PNC), mais conhecido como porto da Manabi, e de seu mineroduto foi apresentado na última sexta-feira (31) em Linhares, no norte do Estado, município que será impactado pelas obras do empreendimento, previsto para se instalar no vilarejo de Degredo, próximo a Regência. Entre o governo e a prefeitura, o clima é de total conformismo e apoio. Da sociedade civil, surge o enfrentamento e o brado “Fora, Manabi”, apesar das tentativas de repressão aos movimentos sociais, claramente contrários à instalação do porto naquela área.

Da administração de Linhares, estiveram presentes os secretários de Agricultura, Aquicultura, Abastecimento e Pecuária, José Roberto Macedo Fontes; de Meio Ambiente, Walter Maia; e de Cultura, Roberto Cordeiro. A audiência durou seis horas, ultrapassando à 1 hora da madrugada do sábado (1). Os pescadores, em função de seu ofício, tiveram que ir embora antes do término.

Os movimentos populares, pesquisadores, pescadores e demais representantes da sociedade civil contrapuseram a afirmação do secretário de Agricultura. Na ocasião, José Roberto afirmou “que os impactos positivos são infinitamente maiores que os negativos”.

A coordenação estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) declarou que é contra a construção do porto, sobretudo pelos impactos causados. “Nós realmente precisamos desse minério?”, questionou. “Até quando mandaremos a matéria-prima extraída em solo brasileiro para exportação, suprimindo vida humana e a nossa natureza?”. Para o movimento, é perfeitamente possível crescer sem esse tipo de empreendimento nocivo.

Para a entidade, a audiência pública não pode ser considerada válida, já que as manifestações contrárias ao projeto foram deixadas por último, sendo que as primeiras foram, todas, de trabalhadores em busca de emprego. Gestores públicos que apoiam o empreendimento também tiveram prioridade na ordem das falas. Além disso, foi denunciado por entidades um corte à fala de grupos ambientalistas de Linhares.

Mais de mil trabalhadores irão para a região, contabilizou Eric Mazzei, pesquisador oceanógrafo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). “É uma população muito maior que a do vilarejo onde, fatalmente, será criado um enorme problema social com as demandas desses trabalhadores”. Ele ressalta que houve falhas no embasamento técnico do projeto, que demonstrou ser totalmente insustentável e dispensável para a região.

Mazzei também considerou o estudo fraco com relação à abrangência dos ecossistemas costeiros e marinhos e apontou ainda que a alternativa para despoluição da água que sai do mineroduto e é novamente lançada ao mar é rudimentar e fatalmente formará um passivo ambiental semelhante ao que existe na Ponta de Tubarão, formado por pelotas e pó de minério despejados pela Vale na década de 1970. A Manabi chegou a afirmar que o seu minério é diferente do da Vale, pois “não produz pó de minério”.

Segundo ele, o pátio da retroárea, a esteira de minério e as pilhas do produto estarão desprotegidos, a céu aberto, o que espalhará o pó de minério de ferro na direção em que o vento soprar. O pesquisador conta que o terreno alternativo para o porto é vizinho ao lado do terreno inicial para o qual foi planejado, o que não provoca mudança ou melhoria nenhuma na questão ambiental. A segunda alternativa permite que o porto seja construído em uma área com 400 metros de restinga arbórea, remanescente de Mata Atlântica nativa de formação mais sólida do que no sul do Estado. Ele classifica que o empreendimento não deveria acontecer naquele local, ainda mais pelo fato de que os empreendedores absolutamente desconsideraram o impacto do porto na comunidade de Regência.

O prefeito de Baixo Guandu, Neto Barros (PCdoB), chegou a questionar, sem resposta, se as medidas mitigatórias e compensações realmente valeriam a pena diante de tantas catástrofes naturais e sociais. Ele também convocou os moradores dos municípios de Marilândia, Colatina, Linhares e Baixo Guandu a criarem o “movimento doa atingidos pela Manabi”. Neto Barros é contrário ao empreendimento, bem como os prefeitos de outras cidades de Minas Gerais que podem ter seus municípios cortados pelo mineroduto.

Apenas para começar a obra do porto da Manabi, será necessária uma dragagem de 31 milhões de toneladas de areia, em uma área ambientalmente sensível. O trabalho para recuperação das tartarugas-de-couro, ou tartarugas-gigantes, desenvolvido por mais de 30 anos na base do Projeto Tamar de Regência, em Linhares, será completamente inviabilizado pela construção do empreendimento, já que as tartarugas terão uma alteração drástica em sua área de desova, nas correntes marítimas e no fluxo marítimo costeiro.

Para o MPA, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), responsável pelo licenciamento ambiental dos projetos, atuou como uma empresa de consultoria à Manabi, sempre defendendo o empreendimento. O Ibama, diante de tantos protestos, chegou a pedir “ordem para que o empreendimento pudesse avançar”. O MPA também criticou a ausência das instâncias federal e estadual do Ministério Público e reforçou que ficou claro o esforço descomunal para passar por cima de todas as populações contrárias ao empreendimento, incluindo os pesquisadores do Projeto Tamar e os pescadores de Barra Nova.

A Manabi também deixou de explicar, detalhadamente, de onde vêm os bilhões de reais que estão sendo investidos na implantação do porto.

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