MS – Polícia Federal tenta responsabilizar CONDEPI e outras entidades pelo destino dos indígenas nas retomadas

CONDEPI

Tania Pacheco – Combate Racismo Ambiental

Desde sua criação em 25/11/2011, o CONDEPI – Comitê Nacional de Defesa dos Povos Indígenas de Mato Grosso do Sul -, como muitas outras instituições e entidades decentes do País, escreve às diferentes autoridades, nacionais e estaduais, não só tentando fazer com que a Constituição seja cumprida, como buscando garantir que pelo menos o não cumprimento do capítulo “Dos Índios” não signifique a perpetuação do atual genocídio.

Agora, ante diversos mandados de ‘reintegração de posse’ expedidos por alguns prestimosos, diligentes, rápidos, zelosos e eficientes operadores da justiça togada do MS, o CONDEPI vem-se preocupando, entre outras coisas, com a forma como se darão essas reintegrações, se não conseguirmos derrubá-las, considerando os resultados do passado próximo. Assim, juntamente com outras entidades, encaminhou um ofício à Polícia Federal, solicitando que, em eventuais processos de ‘reintegração de posse’, seja observado o Manual do governo federal que estabelece diretrizes sobre esses procedimentos. A resposta foi um ofício irônico, que tenta responsabilizar as entidades pelo destino dos indígenas.

O delegado Alcídio de Sousa Araújo, que o assina, começa por se mostrar ciente da existência do “Manual de Diretrizes Nacionais para Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, de 11 de abril de 2008”, que estabelece normas para o cumprimento de ações emanadas de decisões do judiciário.

A partir daí, lembra ao CONDEPI (a quem se dirige, através da dirigente Neyla Ferreira Mendes) que a referida norma prescreve a articulação com instituições governamentais e não governamentais, como a OAB e outras, para estarem presentes durante as “negociações e eventual operação de desocupação”. E continua convidando “essa renomada instituição” a contribuir nos “trabalhos de negociação com os indígenas invasores da área” [SIC]. Tudo, segundo ele, “com o especial intuito de evitar embates fundiários”, referindo-se especificamente ao cumprimento da ordem judicial concernente à chamada Fazenda Remanso Guaçu, em Japorã, reivindicada por Flávio Páscoa Telles de Menezes.

Como se não bastasse, o delegado dedica um novo parágrafo para cobrar ação “urgentíssima” do CONDEPI com relação à chamada fazenda Chaparrau, “cuja desocupação deve ser cumprida imediatamente. Encerrando, dá um prazo de cinco dias, “considerando a urgência que o caso requer”, para que a agora “tão zelosa entidade” informe quais as medidas “realizadas” [sic] “durante todo o período já transcorrido desde o início das invasões” e quais as providências tomadas pelo CONDEPI para solucionar a questão “de forma pacífica”. E anexa cópias da Carta Precatória assinada pelo juiz Eduardo Lacerda Trevisan em 3 de dezembro, e outros documentos, além de se colocar à disposição para eventuais dúvidas por e-mail e por celular.

Ninguém desistiu, entretanto: outro oficio foi feito, reiterando o primeiro, e entregue pessoalmente ao superintendente da Polícia Federal. Lá estavam reunidos vários delegados, inclusive um especialista em formação de quadrilha, e no ‘diálogo’ que se estabeleceu pareceu que a PF pretende mesmo transferir para as entidades que lutam pela justiça para os povos indígenas a responsabilidade por tudo o que vem ocorrendo e vier a acontecer no Estado, com destaque para o Cimi.

Quanto aos ‘procedimentos’, a resposta não escrita foi de que, se não houver alteração na determinação da Justiça Federal de Navirai, eles não irão lá para levar “bolo de chocolate”, porque “não têm no orçamente deles bolo de chocolate”.   Só podem comprar bombas de gás e bala de borracha, “além de outros equipamento para uso progressivo da força, se for necessário”. A ironia se mantinha, pois, deixando no ar a ameaça de que, se houver de fato confronto, muitas pessoas podem sair feridas e, mesmo, morrer.

Não há muito o que comentar, em meio a tanta revolta e indignação. Vou me limitar, pois, a usar do mesmo estilo do delegado e levantar apenas uma questão: quando ele pede que o CONDEPI informe quais as medidas tomadas “durante todo o período já transcorrido desde o início das invasões”, será que não sabe que o criamos somente em 2011? Como quer que recuemos no tempo e nos responsabilizemos por 513 anos de assassinatos, de estupros, de esbulhos, de violência genocida, enfim?

Abaixo, cópia do ofício do delegado Alcídio de Sousa Araújo, da Carta Precatória e, em ordem cronológica, links para as principais matérias sobre o CONDEPI ou nas quais ele foi ator.

Ofício 6348 1

Ofício 6348 2

Carta  Precatória

Carta Precatória

LINKS:

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