Comissão de Meio Ambiente da Câmara realiza Audiência Pública na sede do CIR em Roraima

audienciaAssessoria de Comunicação/CIR

Os povos indígenas Macuxi, Wapichana, Patamona, Ye`kuana, Taurepang, Yanomami, Ingaricó e Wai-Wai viveram mais um momento de conquista com a vinda da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara Federal ao estado de Roraima para conhecer a realidade dos povos indígenas da TI Raposa Serra do Sol e outras regiões.

A Comissão em sua primeira agenda com os povos indígenas participou da Audiência Pública, na sede do Conselho Indígena de Roraima, com a participação de mulheres indígenas, coordenadores regionais, tuxauas, representantes de instituições públicas, organizações indígenas e parceiros da causa indígena.  A recepção ficou por conta dos grupos de parixara Filhos de Canauanim (na língua Wapichana ‘Kanau`uwa`u Saunau’), do Kuarikiri de Boa Vista, e da banda Caxiri na Cuia.

Durante a audiência os coordenadores regionais reforçaram os encaminhamentos definidos e aprovados na segunda Reunião Ampliada anual do Conselho Indígena de Roraima, realizada nessa semana, de 03 a 05, onde foi elaborada uma Carta destinada aos parlamentares. (Leia Carta completa abaixo).

Na Carta entregue, foram apresentadas questões sobre Direitos Territoriais, Autonomia e Meio Ambiente, Sustentabilidade e Bem Viver, Direitos Humanos, Educação Indígena, Saúde Indígena, e Direitos Ameaçados, conforme o documento na íntegra. Houve também, entrega de documentos pelas organizações indígenas e outras comunidades.

Amanhã, a Comitiva segue para Terra Indígena Raposa Serra do Sol em visita as quatro etnorregiões Baixo Cotingo, Surumu, Serras e Raposa. Anteriormente havia sido confirmada a presença de cinco parlamentares e a presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), mas  foi possível a vinda de três deputados, o presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Indígenas Padre Ton (PT/RO),  Janete Capiberibe (PSB/AP) e Renato Simões (PT/SP), além da representante da Funai.

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Excelentíssimos Senhores:

Dep. Federal MÁRITON BENEDITO DE HOLANDA

Dep. Federal JANETE MARIA GÓES CAPIBERIBE

Dep. Federal ARNALDO JORDY

Dep. Federal DOMINGOS DUTRA

Dep. Federal MARINA SANT”ANNA

Senadora Federal ANGELA PORTELA

Presidenta da FUNAI MARIA AUGUSTA ASSIRATI

Nós, Lideranças Indígenas presente na Reunião Ampliada do CIR, nos dias 03 a 05 de Dezembro de 2013, representante dos Povos Indígenas Macuxi, Wapichana, Taurepang, Ingarikó, Wai-Wai, Yanomami, Patamona, Sapará e Ye’kuana, pertencentes às regiões do Amajari, Baixo Cotingo, Murupu, Taiano, Raposa, Serras, Serra da Lua, Surumu, moradores das 32 Terras indígenas, com uma população de aproximadamente 55 mil indígenas, distribuídas em 413 comunidades, amparados pelos dispositivos Constitucionais 231 e 232 da CF/88, da Convenção 169 da OIT e da Declaração Universal dos direitos dos Povos Indígenas, vimos nos manifestar:

  1.       Agradecemos a presença da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados em Roraima, que atendendo o convite de nossas lideranças indígenas em julho-2013, aceitaram visitar a TI Raposa Serra do Sol-RR.
  2.       Após a desocupação dos fazendeiros do interior da TI Raposa Serra do Sol, estamos trabalhando coletivamente para recuperar a terra pelos anos de exploração degradante que sofreu e mesmo assim, temos avançados positivamente. Não é verdade que nós indígenas estamos vivendo nos lixões de Boa Vista, ou que estamos morrendo de fome porque os arrozeiros saíram da terra indígena. Pelo contrário, após a reintegração de posse de nossas terras, estamos mais tranquilos, sem a violência e ameaças que impediam de avançar em nossa sustentabilidade. Hoje, temos uma serie de iniciativas das comunidades que comprovam nossa capacidade e responsabilidade sobre o futuro de nosso povo e contribuição com o planeta. As comunidades elaboraram 5 Planos de Gestão Territorial e Ambiental em Roraima, que demonstram o compromisso indígena sobre as terras indígenas. O que estamos precisando é a segurança sobre os nossos direitos e proteção a nossas vidas.
  3.      Além disso, constatamos no Brasil um retrocesso na garantia dos direitos fundamentais dos povos indígenas, principalmente aqueles referidos à livre determinação e a terra. Os direitos territoriais conquistados pelos povos indígenas e reconhecidos na Constituiçao Federal de 1988 estão sendo ameaçados por diversas medidas legislativas que circulam no Congresso Nacional. O Estado brasileiro não pode optar por um modelo econômico desenvolvimentista, de crescimento acelerado, baseado na exploração dos recursos naturais e na decorrente disputa pelo controle dos territórios, em detrimento dos povos indígenas.
  4.     Afirmamos nossa determinação em defender nossos direitos em uma relação autônoma, clara e transparente com o Estado brasileiro, e apresentamos nossas demandas e recomendações:

DIREITOS TERRITORIAIS, AUTONOMIA E MEIO AMBIENTE

  1.     O Estado brasileiro deve garantir a manutenção e respeito dos direitos territoriais originários dos povos indígenas reconhecidos pela Constituição Federal de 1988 e pelas normas de direito internacional, Convenção 169 da OIT e Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas de Nações Unidas. Algumas terras indígenas foram demarcadas sem considerar critérios adequados, deixando comunidades indígenas separadas em forma de ilhas e sem acesso aos recursos naturais necessários. Em Roraima há 22 pedidos de ampliação já formalizados à FUNAI pertencentes às regiões do Amajari, Taiano, Serra da Lua e Murupu, para que incluam áreas necessárias para a sobrevivência física e cultural dessas e das futuras gerações. Neste sentido, recomendamos:

a.Criação URGENTE de um grupo de trabalho para identificação da Terra Indígena Arapuá na região do Taiano e Terra Indígena Anzol da região Murupu.

b.Regularização do território tradicional da comunidade indígena Lago da Praia que em 2009 foi desocupada através da expulsão das pessoas que ali habitavam, as quais tiveram suas casas, posto de saúde e escola queimadas por não indígenas.

c.Retirada imediata das cercas das  fazendas Flores de Newton Tawares e da  Fazenda Acari  que invadem a Terra Indígena ANANÁS.
d.Aprovação imediata do Projeto de Lei 2057/91 do Estatuto dos Povos Indígenas, servindo como marco regulatório para quaisquer discussões e propostas legislativas sobre assuntos de interesse dos povos indígenas ou que venham abranger os direitos indígenas;
e. A anulação do PDL 2540/2006 que trata do projeto de hidrelétrica na Cachoeira de Tamanduá, no Rio Cotingo, interior da Terra Indígena Raposa Serra do Sol;
f.A imediata paralisação do PL 1610/95 de regularização da Mineração em Terras Indígenas priorizando a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas;
g.A regulamentação do mecanismo de consulta assegurando o direito de consentimento livre, prévio e informado, com a segurança do procedimento transparente, claro e adequado, direito ao veto e consulta com efeitos vinculantes em todas as medidas administrativas e legislativas que venham afetar os povos indígenas;

 

2.       O Estado Brasileiro deve assegurar as medidas necessárias para apoiar e incentivar as ações de gestão e controle territorial dos povos indígenas.

a.Sejam criadas linhas específicas de apoio às atividades econômicas sustentáveis dos povos indígenas, que realmente assegurem o acesso direto com instrumentos adequados, e apoio à implementação dos planos de Gestão Territorial e Ambiental das terras indígenas já construídos pelas comunidades indígenas;

b.Reconhecimento, regularização e apoio à atuação dos Agentes Ambientais Indígenas;

SUSTENTABILIDADE E BEM VIVER

  1. Queremos apoio para implementar programas que fortaleçam a autonomia alimentar e  financeira, mantendo as nossas tradições, e que garantam a continuidade da nossa vida e do meio ambiente como fonte de vida das nossas futuras gerações indígenas;
  2. Exigimos que todos os projetos a serem implantados nas terras Indígenas sejam de conhecimento das nossas organizações Indígenas e órgãos que trabalham em prol dos direitos dos povos indígenas e que sejam implantados da melhor forma possível;
  3. Continuidade dos estudos para implantação de sistemas de energia eólica e solar nas comunidades indígenas;
  4. Fortalecer o Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol como espaço de produção, garantindo apoio para a reconstrução do Centro e a estrutura necessária de pessoal docente.

DIREITOS HUMANOS

1. As violências sofridas pelas comunidades indígenas continuam impunes; o exemplo disso é a absolvição dos acusados do assassinato do Macuxi Aldo da Silva Mota, no Tribunal do Júri em Roraima, que manifestaram opiniões contra a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol.

2. Além disso, nenhuma condenação houve pela destruição das comunidades indígenas Homologação, Brilho do Sol e Insikiran em 2004, e do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol em 2005, e outros diversos atentados. Ao contrário disso, está havendo um processo de criminalização de lideranças indígenas, como no caso da liderança Jairo Pereira da Silva, que está sendo processado por denunciação caluniosa por solicitar providências na Polícia Federal e investigação de atos criminosos contra a comunidade indígena Lago da Praia.

EDUCAÇÃO INDÍGENA

  1. A educação é um dos principais fundamentos para o fortalecimento e a autonomia das comunidades indígenas. Ao longo destes anos, o movimento indígena conquistou espaços dentro da gestão da educação escolar e avançou na formação de professores indígenas. Porém, constatamos que o sistema educacional não atende as demandas específicas e si faz necessária à criação de um sistema próprio para Educação Escolar Indígena, garantindo assim a desvinculação e gerenciamento dos recursos financeiros nas três esferas governamentais.
  2. Os programas e serviços educacionais devem ser desenvolvidos em cooperação com as comunidades indígenas. A estrutura das escolas nas comunidades indígenas se encontra em condições precárias e indignas, com as aulas sendo ministradas embaixo de árvores, sem material didático, falta de cadeiras e outros itens indispensáveis.

SAÚDE INDÍGENA

  1. A crise que atravessa a política de atenção à saúde indígena ameaça a nossa organização social e a cultura indígena. O governo deve garantir serviços de atenção à saúde de qualidade, com equipamentos, prédios, medicamentos e profissionais devidamente capacitados e comprometidos com as necessidades das comunidades indígenas, com prioridade para a formação e contratação de pessoal de saúde das próprias comunidades indígenas (agentes de saúde, microscopistas, técnicos de enfermagem e laboratório, e profissionais de nível superior).
  2. Assegurar melhorias urgentes na Casa de Saúde Indígena (CASAI), incluindo construções e reformas na estrutura física, comunicação e transporte para retorno de pacientes. Assim como Garantir a distribuição regular de medicamentos tanto para a CASAI como para os postos de saúde e polos-base.

NOSSOS DIREITOS AMEAÇADOS

1. Repudiamos qualquer retrocesso de nossos direitos, tal como a ação das PEC 215, 038 e 419 que pretendem revogar ou modificar o artigo 231 da Constituição Federal.

2. As Propostas de Emendas Constitucionais, tais como PEC 215, PEC 033 e PEC 419 colocam em risco a garantia de nossos direitos e ameaçam nossa sobrevivência física e cultural. Essas PECs respondem claramente a interesses econômicos na exploração dos recursos naturais em terras indígenas e restringem a obrigação da União na proteção dos direitos indígenas, visando transferir as responsabilidades de demarcações de terras indígenas para o Congresso Nacional. Os dispositivos constitucionais assegurados aos povos indígenas são considerados cláusulas pétreas e quaisquer tentativas de emenda constitucional que diminuam ou restrinjam direitos fundamentais devem ser consideradas anticonstitucionais.

3. O projeto de mineração PL 1610/96 traz abusos visíveis aos direitos indígenas. A temática da mineração deve ter sua tramitação concomitante com o PL 2057/91 do Estatuto dos Povos Indígenas, por abranger direitos indígenas a serem protegidos e especificados. Não houve nenhuma consulta aos povos indígenas enquanto que nossos povos já manifestaram, pública e abertamente, a oposição à Lei da Mineração em Terras Indígenas em trâmite no Congresso Nacional. No texto atual do Substitutivo do PL 1610 não se prevê o direito dos povos indígenas de vetarem o projeto de mineração nem se garante nenhuma salvaguarda sobre lugares sagrados ou de moradia, gerando um estado de clara agressão à sobrevivência cultural de nossos povos. Do mesmo modo que este Projeto de Lei existem outras propostas de leis que vêm fragmentando o nosso Estatuto, inclusive com o apoio da base aliada do governo.

4. Somos contra a portaria editada pelo Ministério da Justiça que altera e regulamenta novos procedimentos para demarcações das terras indígenas.

Por fim, com base em nossas reivindicações acima relatadas, solicitamos medidas eficazes e oportunas por parte do Estado Brasileiro, com fé de que se materializem em ações práticas as nobres funções que lhe foram delegadas por nossa Constituição.

Abaixo Assinamos,

Boa Vista, 06 de Dezembro de 2013.

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