Quando você “pirateia” um filme, uma família de pandas morre na China, por Leonardo Sakamoto

Por Leonardo Sakamoto

Grandes estúdios de Hollywood estão reclamando que os serviços de busca na internet não estão fazendo tudo o que podiam para impedir os internautas de encontrarem conteúdo “pirateado” na rede.

(suspiro de preguiça)

De tanto ouvir e ver propagandas em rádios, TVs e cinemas que fazem o consumidor sentir-se um pedaço de titica, financiador do tráfico de drogas, responsável pelo desemprego, pela fome no mundo e pela pichação de muros do Justin Bieber, por não se atentar à pirataria dos CDs e DVDs que compra ou dos arquivos que baixa, creio que se faz necessária uma pergunta: empresas de software, gravadoras e a indústria do entretenimento em geral aplicam o mesmo terror em suas relações comerciais?

Inexiste, por parte de muitas delas, uma política para evitar a compra de equipamentos eletrônicos (utilizados na criação de programas, gravação de músicas, filmagens de películas) que contêm crimes contra a humanidade e o meio ambiente em seu processo de fabricação. As únicas restrições que impõem são: que o produto tenha preço baixo e a qualidade técnica desejada.

Enquanto isso, a indústria de aparelhos eletrônicos consome proporções cada vez maiores de minérios preciosos e raros encravados pelo mundo. Muitos desses metais são extraídos em minas de países pobres nas quais trabalhadores, crianças e adultos, enfrentam condições aterradoras. Ou comunidades são removidas para dar mais espaço para a mineração. Fora a contaminação da água e a poluição do solo. Isso sem contar que, depois, essa matéria-prima se transformará em componentes que, por sua vez, serão montados não raro com a superexploração de trabalhadores chineses, brasileiros, mexicanos.

Alguns vão dizer que é ilegal baixar músicas e copiar DVDs, mas comprar de quem escraviza e desmata para a produção de matéria-prima não é? A resposta sobre o porquê de o mundo ser assim reside no fato de que, historicamente, as leis criadas para proteger a propriedade e o lucro são mais severas e efetivas do que as que foram implantadas para defender a vida e a dignidade.

Se as indústrias da informação e do entretenimento não podem comprovar para o consumidor comum de que o seu processo de produção é social e ambientalmente responsável, como é que eles vão exigir a mesma responsabilidade de nós?

E isso não significa doar computadores para orfanatos, informatizar ONGs ou ser simpático ao distribuir softwares gratuitamente a instituições de ensino (há várias formas de viciar uma criança, sabia? E usar alguns programas desde cedo é uma delas…). Também não basta recolher o lixo digital produzido pela obsolescência programada das máquinas desse admirável mundo novo. É preciso mais, muito mais. Dever-se-ia (acho que essa é a primeira mesóclise deste blog) chegar ao ponto de discutir o consumismo tresloucado da era digital e aonde vamos todos com esse culto ao gadget (do qual, não nego, sou participante ativo e dependente).

A provocação não é uma apologia à pirataria, mas sim um chamado à responsabilidade. Coisa que anda em falta nos dias de hoje.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.

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