Mais de 40 adolescentes, jovens e crianças Kaiowá Guarani estarão em Brasília neste inicio de semana. Não estarão vindo a passeio ou para matar as curiosidades com relação espaços do poder. Estarão trilhando o caminho de seus pais e lideranças na luta por seus direitos, por terra e justiça.
Eles vem para o 1° Fórum de “Direitos e Cidadania na visão de crianças e adolescentes Guarani Kaiowá”. Eles vem de uma realidade sofrida, em alguns lugares desesperadora, sob os barracos de lona preta na beira das estradas e nas retomadas, submetidos a toda sorte de violência e discriminação. Como diz a coordenadora do evento, Dirce Carrion “No Mato Grosso do Sul, além da falta de assistência, é possível identificar situações de genocídio que pesam sobre os povos que vivem ali. Segundo dados do relatório “Violência contra os povos indígenas no Brasil” de 2011, o povo Guarani Kaiowá enfrenta uma verdadeira guerra contra o agronegócio registrando uma taxa de homicídio de 100 por 100 mil pessoas (maior que a do Iraque). Em consequência existe um quadro altíssimo de suicídios, especialmente entre os jovens e adolescentes.
É sobre essas realidades que eles vem conversar com diversos representantes dos três poderes. Mas vem principalmente para dizer ao Brasil e ao mundo que seu povo e em especial os adolescentes e crianças não se aceitam esse grave quadro de injustiças e preconceitos a que estão submetidas suas comunidades, famílias e povos. Exigem justiça, exigem as terras demarcadas e uma vida de paz e dignidade. Eles vem das aldeias de Panambizinho, Tey Kue, Kurusu Ambá, Ipoy e Guaiviry .
Na véspera da celebração dos 30 anos do assassinato de Marçal Tupã’y, eles vem pedir o fim da impunidade dos assassinos das lideranças de seu povo. Querem saber onde estão os corpos do professor Rolindo, do Ypo’i, do cacique Nisio, de Guaiviry.
É neste espírito de formadores de guerreiros e guerreiros de seus direitos que eles estarão em Brasília. Eles vem “expor suas demandas, seus anseios e suas exigências por direitos que sejam atendidos pelo poder público e respeitados pela população.”
Eles vem da fome, exigem alimentação adequada, vem da impunidade, exigem justiça, vem da discriminação e racismo, exigem respeito e igualdade na diversidade, eles vem da negação da vida, da violência, exigem paz e direitos cumpridos.
Enquanto isso um jornal de Dourados veiculou nessa semana um comentário onde, com relação aos Kaiowá Guarani afirma “Em 1500, quando os portugueses aportaram no Brasil, existia um povo sem roupa mas com uma cultura riquíssima e hoje os índios estão vestidos, calçados, documentados, mas despidos de cultura.” (O Progresso, 16/10/13). Só aos olhos segados pelo agronegócio e racismo, esse povo de resistência secular não “está despido de cultura”. Talvez fosse mais correto dizer que estão despidos da cultura genocida e etnocida do colonizador.
Já no Senado . “Meia dúzia de índios e alguns vagabundos pintados conseguiram por meio de baderna impedir a criação da comissão para debater o tema”, reclamou Moreira. A baderna a que ele se referia eram os protestos feitos em Brasília, no início do mês, por índios que exigiram de deputados que não transferissem para o Congresso as decisões sobre a demarcação atualmente a cargo da FUNAI. (Isto É – dinheiro, 13/10/13) “
Esses comentários mostram bem a mentalidade predominante, infelizmente, em amplos setores do Estado. Essas guerras, silenciosas ou alardeadas, nos dão ideia da dimensão e continuidade do extermínio e intolerância secular.
Está previsto para dia 23, quarta feira, do julgamento das condicionantes relacionadas à demarcação da Raposa Serra o Sol. Manifestemos aos Ministros do Supremo nossa esperança de que as condicionantes sejam rejeitadas e se inicie uma promissora caminhada, mesmo que tardia, de justiça e respeito aos direitos dos povos originários.
Povo Guarani, Grande Povo
Cimi Brasília, 19 de outubro de 2013.