STF julga a partir das 14 horas de quarta-feira, 23/10, validade das condicionantes de Raposa Serra do Sol. E ruralistas já estão em ação na mídia

Representantes indígenas acompanham julgamento no Supremo Tribunal Federal da demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Dezembro de 2008. Foto: Wiki.
Representantes indígenas acompanham no STF julgamento da demarcação contínua da TI Raposa Serra do Sol, em dezembro de 2008. Foto: internet

Tania Pacheco – Combate Racismo Ambiental

A notícia abaixo está sendo publicada exatamente para mostrar a guerra de versões que será vendida nos próximos dias à opinião pública, em apoio aos interesses ruralistas, presentes na inconstitucional AGU 303. Ao contrário do que está escrito em toda a primeira parte da matéria, que reafirma diversas vezes como aprovado o que está por ser decidido pelo plenário do Supremo, a questão central a ser julgada no dia 23 é exatamente se as 19 condicionantes estabelecidas em dezembro de 2008 se referiam especificamente a Raposa Serra do Sol ou se seriam válidas para todas as Terras Indígenas. Vale relembrar um pouco essa história.

Na época do julgamento, estava em pauta se a Reserva deveria ser demarcada de forma contínua, respeitando os direitos indígenas e a área homologada, ou se em ‘ilhas’, como queriam os ruralistas. Exceto Marco Aurélio Mello (que levou mais de seis horas para ler sua decisão), todos os ministros apoiaram a demarcação em área contínua. Entretanto, Carlos Alberto Menezes Direito estabeleceu, em seu voto, 18 condições através das quais ele buscava “garantir a proteção da fronteira (uma das alegações era de que os limites fronteiriços da TI Yanomami “ameaçariam” o Brasil) e a preservação do meio ambiente”. A elas foi acrescida mais uma pelos demais ministros.

A morte de Carlos Alberto Direito permitiu uma crescente manipulação quanto ao sentido de seu voto, que culminou com a ação de Luís Adams, tentando nos impingir a AGU 303, que teve que ser suspensa pela sua flagrante inconstitucionalidade.

Como a matéria abaixo, a 303 foi feita de acordo com a posição e os interesses ruralistas, para os quais as ‘condicionantes’ deveriam não só pautar as novas demarcações como, ainda, estabelecer a possibilidade de revisão das áreas das Terras Indígenas já demarcadas e de ingerência sobre elas, inclusive com a exploração dos recursos dos territórios e de seus subsolos por parte dos governos, políticos e – sintetizando – do capital.

No atual momento, em que os Povos Indígenas cada vez se veem mais obrigados a lutar pelos 20 anos de atraso no cumprimento e no respeito à Constituição de 1988, além de contra PECs, PACs, AGU, decretos e quejandos (sem esquecer toda a espécie de  jagunços), a decisão marcada para o dia 23 assume uma importância que precisa ser bem avaliada por tod@s nós.

Uma comissão de dez lideranças de Raposa Serra do Sol já está se deslocando para Brasília, para acompanhar o julgamento. É fundamental a presença do maior número possível de aliados. E que o STF honre a Justiça!

***

Notícia publicada hoje pelo G1:

STF deve julgar na quarta recursos do caso Raposa Serra do Sol

Em 2009, STF validou demarcação e criou regras sobre terras indígenas. PGR questiona normas e diz que elas ferem princípios constitucionais.

Por Mariana Oliveira, do G1, em Brasília

Quatro anos e meio depois de validar a demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar na próxima quarta-feira (23) recursos de produtores rurais, índios e da Procuradoria Geral da República que questionam pontos da decisão, na qual a Corte fixou regras gerais sobre terras indígenas no país.

Em março de 2009, após uma série de conflitos entre índios e fazendeiros, o Supremo determinou a saída imediata dos produtores de arroz e não índios que ocupavam a reserva.

O tribunal estabeleceu 19 condições a serem verificadas em todas [sic] as terras indígenas demarcadas no território nacional, entre elas a que exige dos índios que obtenham permissão do poder público para o garimpo em suas terras; a que autoriza intervenções de interesse da Política de Defesa Nacional na terra indígena e a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal no local sem prévia consulta aos Índios ou à Fundação Nacional do Índio (Funai); além de regra que autoriza a construção de vias de transporte caso seja de interesse público.

O Supremo também determinou que os índios permitam a entrada de visitantes e pesquisadores não índios na área de conservação ambiental, não cobrem tarifas para permitir a entrada nas terras e não implantem estabelecimentos comerciais nas reservas.

A Suprema Corte impediu ainda o governo de cobrar qualquer tipo de imposto ou taxa nas terras indígenas e, por fim, proibiu a ampliação da terra indígena já demarcada.

Diante das condicionantes, foram apresentados vários embargos de declaração (recursos que questionam decisões do Supremo). Esses recursos serão analisados pelo Supremo com uma nova composição, cinco ministros diferentes – Luiz Fux no lugar de Menezes Direito, Rosa Weber no lugar de Ellen Grace, Teori Zavascki no lugar de Cezar Peluso e Luís Roberto Barroso no lugar de Ayres Britto.

O ministro Dias Toffoli, que entrou no lugar de Menezes Direito, era o advogado-geral da União na época do julgamento da demarcação e deve se declarar impedido de julgar os recursos.

Argumentos dos recursos
O recurso da Procuradoria Geral da República afirma que as condicionantes do Supremo não deveriam ter sido fixadas sem debate prévio da sociedade e que a definição de normas fere o princípio da separação de poderes. Para a PGR, as condicionantes ultrapassam o tema do processo, que é a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol.

Ainda na avaliação da Procuradoria, as condicionantes priorizam os interesses do poder público e ofendem os direitos das comunidades indígenas. O recurso aponta que algumas das determinações “podem gerar efeitos nefastos sobre a vida das comunidades, afetando a sua cultura e suas tradições”. Outro questionamento é que não pode se determinar como impossível a ampliação da terra demarcada, uma vez que há previsão legal para que isso ocorra.

Comunidades indígenas questionam a obrigatoriedade de terem que obter permissão para a atividade de garimpo em suas próprias terras e também são contra a desobrigação de consulta prévia em casos de interesse público.

O governo de Roraima também recorreu da decisão e afirmou que o Supremo não estabeleceu como seria sua atuação na reserva Raposa Serra do Sol, em relação aos serviços públicos como saúde e educação.

O ex-senador Augusto Botelho também recorreu em defesa dos proprietários rurais e afirmou que há imóveis particulares com propriedade privada reconhecida por sentença judicial dentro do local.

O senador Mozarildo Cavalcanti afirmou em recurso que há omissões em relação às pessoas miscigenadas, se elas podem permanecer na reserva, além de templos religiosos já construídos e escolas mantidas na área pelo poder público. Sustenta que é preciso garantir a passagem pela terra por se tratar de única ligação entre Boa Vista e a cidade de Pacaraima.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.