Justiça ordena censura em caso de fiscalização de trabalho escravo

Leonardo Sakamoto

A pedido da empresa Pinuscam – Indústria e Comércio de Madeira Ltda, o juiz titular da 43a Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Miguel Ferrari Júnior, ordenou a censura de informações sobre uma ação de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério Público do Trabalho divulgada pela Repórter Brasil. A operação resultou no resgate de 15 trabalhadores de condições análogas às de escravo, em Tunas do Paraná (PR), em 2012.

A empresa obteve uma liminar que obriga a Repórter Brasil a retirar de seus sites “qualquer informação que associe o nome da autora à exploração escravagista do trabalho”, sob pena de multa diária de R$ 2 mil. A Repórter Brasil está recorrendo da decisão.

A informação sobre a operação teve como fonte o Ministério do Trabalho e Emprego e integra, no site da Repórter Brasil, uma seção em que estão listadas as operações de fiscalização nas quais o poder público afirma ter encontrado escravos desde 2003. Entre elas, a fiscalização na Pinuscam.

A empresa entrou com a ação temendo que a informação poderia causar danos à sua imagem. Ela firmou um acordo judicial, em dezembro de 2012, sobre o caso e o cita como exemplo de que não havia problemas sob sua responsabilidade.

“Um acordo não significa, em hipótese alguma, reconhecimento de inexistência de prática de trabalho análogo ao de escravo. É só uma forma de solução do conflito judicializado”, afirma Luercy Lopes, procurador do Ministério Público do Trabalho no Paraná, responsável pelo caso. “Pelo contrário, o fundamento de vários pedidos formulados nas medidas ajuizadas foi justamente a existência dessa modalidade de exploração de trabalhadores, conforme se apurou nas inspeções, realizadas nos locais de trabalho, pelos auditores fiscais e pelos representantes do MPT”, completa.

Dados sobre ações de fiscalizações e resgates pelo governo brasileiro são de caráter público e acessíveis a qualquer cidadão ou jornalista. Impedir a divulgação dos resultados dessas operações é cercear a sociedade de informações de interesse público que têm sido veiculadas cotidianamente por sites, TVs, rádios, jornais e revistas desde que o país criou seu sistema de combate ao trabalho escravo contemporâneo em 1995. E, portanto, dificultar o combate a esse problema.

“As informações sobre fiscalizações do Ministério do Trabalho e do Ministério Público são de domínio público, de livre acesso a todos os cidadãos. É um absurdo cogitar que, de uma hora para outra, o site não possa dar a seu público conhecimento de informações públicas”, afirmou Carlos Bezerra Júnior, deputado estadual pelo PSDB, autor da lei paulista de combate ao trabalho análogo ao de escravo.

Já o secretário executivo da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, José Guerra, diz que “a publicização de casos de fiscalização de trabalho análogo ao de escravo pelos veículos de comunicação tem um papel central no combate a essa forma de exploração no país”. A comissão integra a estrutura da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

Como a liminar impede que a Repórter Brasil divulgue informação relacionando a empresa à exploração de trabalho escravo e considerando que é impossível tratar do assunto sem explicá-lo, isso impossibilita a divulgação do caso pelo site da organização.

O processo corre sob o número 1064878-54.2013.8.26.0100.

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