Copa pode provocar despejo de 250 mil pessoas, afirmam ONGs

Um mapeamento divulgado na Suíça pela Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop) em parceria com a ONG Conectas no final de maio calcula que 250 mil pessoas correm o risco de serem despejadas de suas casas por causa de obras para os preparativos da Copa em todo o Brasil

BBC Brasil

A articulação reúne comitês nas 12 cidades-sede da Copa, que por sua vez agregam movimentos sociais, universidades e entidades de sociedade civil que lutam contra as violação de direitos humanos decorrentes da realização da Copa e da Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016.

Não existe uma estimativa oficial sobre o número de despejados por causa do mundial. Uma estimativa anterior contabilizava 170 mil pessoas que corriam o risco de ter de deixar suas casas.

Segundo a representante da Ancop Larissa Araújo, foram somadas as famílias atingidas por obras, outras ameaçadas de remoção e as que residem em áreas em disputa. Os números foram compilados a partir de dados recolhidos por ativistas nas 12 cidades-sede.

Despejos e desinformação

O censo foi lançado em um vídeo apresentando em uma reunião paralela da 23ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra.

Nas imagens são retratados casos flagrantes de despejos forçados, remoções com aviso prévio de 48 horas, casas demolidas sob protesto, abusos policiais e famílias desesperadas por não saberem onde serão reassentadas ou se receberão indenização por suas perdas.

Outra queixa recorrentes são os reassentamentos de populações em locais distantes dos habitados originalmente e as indenizações insuficientes -entre R$ 4 mil e R$ 10 mil, em média, podendo chegar a R$ 30 mil.

“O valor dessas compensações transforma as pessoas em sem-teto no Brasil hoje. A moradia é a porta de acesso a outros direitos, como educação, saúde, cultura”, afirmou Juana Kweitel, diretora da Conectas.

Em dossiê datado de junho de 2012, a Ancop relata em detalhes os casos de 500 famílias ameaçadas de despejo na Vila Autódromo, no Rio de Janeiro, e da expansão do terminal de ônibus Cosme e Damião, em Recife, em que 200 casas foram marcadas para serem demolidas sem consulta prévia com os moradores.

Em Manaus, 900 famílias no oeste da cidade estão sob risco, por causa da construção de uma rodovia, em Belo Horizonte, são 2.600 casas ameaçadas pela ampliação do anel viário no entorno da cidade. Na região metropolitana de Curitiba, são 2 mil famílias em risco devido às obras de expansão do aeroporto e à reforma do estádio Joaquim Américo Guimarães.

‘De olho’ no Brasil

Em dezembro de 2010, a relatora especial da ONU para o Direito à Moradia Adequada, Raquel Rolnik, enviou correspondência ao governo brasileiro solicitando informações e expressando preocupação com as remoções nas cidades-sede e, em novembro de 2012, enviou outra, ainda sem resposta.

“É necessário que o governo brasileiro cumpra com as normas internacionais referentes ao direito à moradia no caso de remoções. Estas incluem a participação das comunidades na definição das alternativas, a transparência e direito à informação e também as compensações ou reassentamentos adequados”, declarou Rolnik à BBC Brasil.

Rolnik destacou que em algumas cidades, avanços foram registrados graças às mobilizações populares. “Como a diminuição do número de famílias a serem removidas e o aumento no valor de indenizações”, disse.

“Mas muito ainda há que ser feito e, sobretudo, é urgente a criação de uma regulação nacional que discipline o tema das remoções e oriente a ação dos governos locais e de terceiros incumbidos do desenvolvimento destes projetos.”

Wilfried Lemke, assessor especial da ONU sobre Esporte para o Desenvolvimento e a Paz, também expressou preocupação com a situação no Brasil.

“Consigo entender a necessidade de novas linhas de transporte e projetos urbanos, mas também entendo a situação dessas famílias em risco”, disse Lemke.”Temos que tomar muito cuidado com mega-eventos esportivos. Em todo o mundo é a mesma coisa, alguns querem investir, mas outros estão sendo desalojados.”

Durante os preparativos de mega-eventos esportivos como a Copa e as Olimpíadas, estima-se que 15% dos moradores de Seul foram expulsos de suas casas e, na África do Sul, 20 mil pessoas foram despejadas.

Governo

Procurada pela reportagem para responder a denúncia feita pela Ancop, a assessoria da Presidência da República, em Brasília, declarou que o tema era do escopo da Secretaria de Direitos Humanos e do Ministério do Esporte.

Já a SDH informou que não se pronunciaria por não ter recebido os dados completos formalizados pela Ancop como denúncia. O Ministério do Esporte, por sua vez, insistiu que são a SDH e a Presidência que devem se pronunciar sobre o assunto.

Em março, o Ministério das Relações Exteriores havia dito que o governo federal tem mantido um diálogo constante com Rolnik sobre o assunto.

Por sua vez, em maio, durante uma sabatina em maio sobre as remoções para a Copa e a Olimpíada, realizada na ONU em Genebra, a Ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, disse que o Brasil terá “respeito aos direitos humanos nos grandes eventos”.

No mesmo mês, a Secretaria Municipal de Habitação do Rio de Janeiro afirmou em uma nota que “a prefeitura vem conduzindo os processos de reassentamento da maneira mais democrática, respeitando os direitos de cada família”.

Comments (1)

  1. Racismo ambiental? Mais essa… Deve ser mais um jeito de defender gente que não está muito a fim de pegar no pesado, né?, feito os índios e os sem-terra.

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