No Brasil de Cris e Tati, a luta pela liberdade

Em meio a uma semana agitada para o movimento pelo respeito à diversidade sexual, ativistas lançam vídeo em resposta à campanha difamatória encabeçada, principalmente, pelo deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), contra Cristiano Ferreira e Tatiana Lionço. A próxima sexta-feira (17) marca o dia nacional de combate à homofobia

Vinicius Mansur – Carta Maior

Brasília – Nas ruas, o movimento pelo respeito à diversidade sexual protagonizou a 4º Marcha Nacional Contra a Homofobia, nesta quarta-feira (15), em Brasília, exigindo a garantia de direitos, o Estado laico e a saída do deputado Marcos Feliciano da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. A próxima sexta-feira (17) marca o dia nacional de combate à homofobia.

Na justiça, o movimento conquistou, também nesta semana, a decisão do Conselho Nacional de Justiça que obriga os cartórios do país a celebrar casamentos entre pessoas do mesmo sexo.

Nas redes sociais, houve outro avanço nesta semana com o lançamento do vídeo No Brasil de Cris e Tati – a luta pela liberdade, produzido pela “recém-nascida” Organização de Comunicação Universitária Popular (Ocup). Um avanço modesto para o movimento como um todo, mas importantíssimo para os ativistas Cristiano Ferreira e Tatiana Lionço, vítimas principais da campanha difamatória encabeçada, principalmente, pelo deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ).

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Ataque conservador
No ano passado, Bolsonaro produziu e divulgou vídeos em seu canal do youtube a partir de imagens de Ferreira e Lionço em atividades e mobilizações do movimento de diversidade sexual. Manipulando suas falas através de técnicas de edição, distorcendo o sentido de suas mensagens e até mesmo falsificando legendas, os vídeos sugeriam que os ativistas eram pedófilos e incitaram o ódio pela internet.

“Quando ele soltou isso, imediatamente se espalhou na rede. Eu contei 70 blogs e sites evangélicos que replicaram a história, querendo a minha cabeça, me ameaçando de agressão, dizendo que eu deveria ser exonerado, pedindo intervenção do MEC”, conta Cristiano Ferreira, que é professor da rede pública do Distrito Federal (DF) e teve divulgado, em um dos vídeos, o seu número de matrícula na Secretaria de Educação.

Em uma parte do vídeo, gravado pelo próprio Bolsonaro durante uma conturbada sessão da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Ferreira é chamado de “viado” por um dos apoiadores do presidente da comissão, deputado Marcos Feliciano, e responde “sou viado e com orgulho”. Na legenda, entretanto, aparece “sou viado e dou o cu”.

Em outras meticulosas manipulações, a edição do vídeo pega uma fala em que o professor – durante o seminário “Respeito à diversidade se aprende na infância” – afirma trabalhar há 18 anos com crianças e gostar disso porque a cada dia aprendia com elas. A edição, porém, mostra apenas o trecho “Sempre trabalhei com crianças. Gosto muito” e o repete algumas vezes. “O vídeo vai repetindo isso de forma as pessoas acreditarem que eu gosto muito de crianças porque eu sou pedófilo”, denuncia.

Em circulação
vídeo foi removido do Youtube porque “violou os Termos de Serviço”, avisa o próprio site. Porém, teve mais de 120 mil visualizações e continua circulando pela internet. Os pedidos de exoneração do professor foram negados pela Secretaria de Educação do DF e um conjunto de professores realizou um ato de solidariedade a Ferreira em seu local de trabalho. “Agora, o estrago está feito, porque quando as pessoas digitarem meu nome na internet vão sempre se reportar a esse tipo de situação”, aponta o professor que junto com a psicóloga e professora universitária Tatiana Lionço e com o apoio da Ordem dos Advogados o Brasil (OAB) processam Bolsonaro por quebra de decoro parlamentar.

Lionço relata que os ataques conservadores lhe trouxeram muitos problemas pessoais, inclusive ameaças. Mas, por outro lado, resultaram em grandes apoios, como os manifestados pela própria OAB, Conselho Federal de Psicologia (CFP), a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos, entre outros. “Dessa articulação já surgiu o projeto de instituir um fórum de enfrentamento das campanhas de ódio na internet”, informou.

O vídeo de Bolsonaro que ataca a psicóloga associa um trecho de sua fala em um seminário, quando ela diz que crianças também tem curiosidade a respeito dos próprios corpos e das outras crianças, com outro trecho onde ela se refere a brincadeiras sexuais, dando a entender que ela estimularia as crianças a brincar dessa forma. “Eu tinha inclusive diferenciado a sexualidade infantil da adulta. Ele recortou minha fala, editou, colocou legendas interpretativas insinuando que eu estimulava crianças a transarem, quando na verdade eu estava discutindo a necessidade de não incorrer em violência quando as crianças expressam o gênero fora dos estereótipos ou mesmo dirimir o pânico sexual associado a brincadeira sexual infantil, como se a criança fosse gay”, explica.

vídeo que ataca Lionço segue no ar e conta com mais de 170 mil visualizações. Mais do que cobrar seus direitos na justiça, a psicóloga reiterou a importância de responder aos ataques conservadores produzindo seus discursos próprios, sem usar da mesma agressividade discursiva de seus adversários. “Produzir conteúdo reflexivo, com argumentos razoáveis, pautados nos princípios constitucionais, numa ética democrática para dizer por que a gente discorda disso que fizeram com a gente, em que base toparíamos dialogar com pessoas que tem posição contrária. Porque a lógica de ataque criminoso, caluniador, difamatório a gente não vai adotar”, concluiu.

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