Nota da Hutukara Associação Yanomami (HAY): Porque a retirada dos fazendeiros do Arajani é prioridade para o povo Yanomami

A estrada: epidemias, exploração, desestruturação social. Morte dos Yanomami do Ajarani 

Em 1973, durante o governo militar, dentro do “Plano de Integração Nacional” começou a ser construída a rodovia Perimetral Norte.

Relatório da Funai1 aponta que na região chegaram 2000 homens e 800 máquinas pesadas. O primeiro impacto sentido pela população foram as mortes causadas por epidemias. Os Yanomami não tinham resistência para muitas doenças trazidas pelos trabalhadores da estrada. Segundo o mesmo relatório da Funai: “Considerando apenas a cifra de 102 habitantes até 1973, ano do início de construção da Perimetral, temos que, em dois anos, a população decresceu em pouco mais de 40%. A diminuição seria ainda mais brutal considerando a estimativa de Migliazza, de 400, o que significaria uma queda de cerca de 84% da população.”

As mortes e convivência constante com 2000 trabalhadores levaram os Yanomami da região a vivenciarem uma série de dificuldades. Segundo o mesmo relatório da Funai: “Além das epidemias que grassavam, o contato desordenado trouxera a mendicância, a prostituição feminina e, com esta última, a ocorrência de doenças venéreas.” 

A partir desse contato catastrófico com os não-indígenas, um processo de desestruturação social teve início entre as comunidades da região. A morte de grande parte das pessoas que ali viviam tem como consequência imediata a impossibilidade da reprodução cultural dos Yanomami da região.

A desestruturação social que teve início na década de 70 persiste até os dias de hoje. 

A Hutukara Associação Yanomami e seus apoiadores vêm chamando a atenção do Governo Brasileiro para esse fato, desde a época da demarcação da TI Yanomami. E, no entanto, nada de efetivo foi feito, nesses 21 anos de homologação da TI Yanomami, para mitigar essa situação de desestruturação social. NADA. Em 2012, pelo menos três Yanomami, provavelmente alcoolizados, morreram atropelados na BR-174: vítimas da omissão do governo diante de tal situação. Existem inquéritos no Ministério Público para a investigação de trabalho escravo dos indígenas em fazendas da região.

Quando o governo se omite diante de fatos como esses, causados por ações próprias, e não faz nada de efetivo para mitigar a situação, ele é responsável pelas consequências que os Yanomami da região vêm sofrendo durante os últimos 40 anos, desde o início da construção da Perimetral Norte. E não ter efetividade na retirada dos fazendeiros, ato administrativo da Funai, é no mínimo um desrespeito aos direitos dos Yanomami, aos direitos humanos.
“Situação dos ocupantes não indígenas na região do Ajarani”

Em 21 anos de ocupação da região do Ajarani após a homologação da TI Yanomami, os fazendeiros que ali estão acumularam terras e desmataram ilegalmente, trazendo danos para os Yanomami e para o meio-ambiente.

Além das áreas que ocupam por meio de título expedido pelo INCRA, alguns ocupantes adquiriram as áreas de outros ocupantes, aumentando a área de desmatamento sobre elas e ainda invadiram novas áreas na TI Yanomami. Causaram danos ambientais que precisam ser auferidos pelo órgão competente. O Ministério Público Federal solicitou ao IBAMA que faça um levantamento na região.

A permanência destes ocupantes tem causado uma série de danos aos Yanomami, pois os mesmos estão impedidos de usar a TI Yanomami e seus recursos naturais onde eles exercem a suas atividades e impedindo a Funai de estabelecer a fiscalização e o monitoramento nesta área de enorme pressão sobre os Yanomami.

A Funai, em 2010, por meio de Comissão que avaliou as ocupações e determinou quais as benfeitorias originárias de ocupação de boa-fé devem ser indenizadas e quais benfeitorias derivam de ocupação de má-fé e não podem legalmente ser indenizadas (Resolução No. 218, de 19 de outubro de 2010, publicada no Diário Oficial da União – 202 – 21/10/2010 – Seção 1).

Em outubro de 2012, dois anos depois, a Funai impetrou ação de consignação para pagar os ocupantes pelas benfeitorias que foram consideradas de boa-fé e por razões que protelam a saída destes ocupantes há tanto tempo, apenas conseguiu efetivamente realizar o depósito do valor das benfeitorias que foram consideradas de boa fé, em abril deste ano.

Pressões crescentes na região do Ajarani

Em 2012 a HAY, em parceria com a Funai, realizou uma expedição de fiscalização pela região do Ajarani. Foram constatados diversos pontos de invasão na TI Yanomami, e um aumento constante da pressão vindas dos Projetos de Assentamento da região.

A situação mais preocupante foi vistoriada em nova expedição realizada HAY e pela Funai, nos dias 10 e 11 do presente ano. Uma vicinal que está sendo aberta ilegalmente vem crescendo em direção à TI Yanomami, e segundo os ocupantes de lá, o objetivo é que ela alcance a perimetral norte, no Km 44, altura da Fazenda de Ermilo Paludo.

A concretização dessa junção das estradas nos preocupa muito, pois com certeza trará um aumento muito grande no fluxo de pessoas e veículos pela perimetral norte, aumentando a insegurança das comunidades indígenas do local. Aprofundando a tragédia do povo Yanomami naquela região.

”O Futuro da região”

A Hutukara Associação Yanomami pede às autoridades competentes que procedam imediatamente à retirada dos ocupantes não-indígenas da Terra Indígena Yanomami.

A Hutukara tem um plano para a região do Ajarani: construir um Centro de Formação Yanomami. Transformar a região que está sendo palco de uma das piores tragédias do contato dos Yanomami em um lugar onde o conhecimento Yanomami pode circular e ter um espaço de diálogo com a sociedade envolvente. Trazer o conhecimento Yanomami de volta para esse lugar de onde ele foi quase extinto, pois ali quase foram extintos os próprios Yanomami.

Boa Vista – RR, 18 de abril de 2013.

DAVI KOPENAWA YANOMAMI
PRESIDENTE – HAY”

Enviado por Elaíze Farias para Combate Racismo Ambiental.

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