Nota sobre o assassinato do Guarani Kaiowá Denilson Barbosa e as investigações

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) vem a público se manifestar sobre a morte do indígena Guarani-Kaiowá Denilson Barbosa, de 15 anos, brutalmente assassinado na noite do dia 16 de fevereiro de 2013 pelo proprietário da fazenda Santa Helena, Orlandino Gonçalves Carneiro, réu confesso, na área que incide sobre território reivindicado pelos indígenas como tekoha Pindo Roky.

O Cimi apoia a reinvindicação do Conselho da Aty Guasu (grande assembleia Guarani e Kaiowá) de que o Governo Federal deve implementar, de forma imediata, um programa de segurança nas comunidades que estão em luta pela demarcação das terras, dentre elas a Tey’ikue, que ocupa a área da fazenda onde Denilson foi morto. De acordo com os relatos das lideranças indígenas, ocorreram dois ataques de fazendeiros e pistoleiros desde o dia 18, quando houve a retomada da fazenda pelos Guarani e Kaiowá.

Reforçamos também a urgência de que as investigações que envolvem o caso sejam imediatamente assumidas pela Polícia Federal, a exemplo das investigações do assassinato de Nisio Gomes, em novembro de 2011. Lideranças indígenas do Tey’ikue e do Conselho do Aty Guasu posicionaram-se publicamente exigindo o deslocamento da competência das investigações da Polícia Civil para a Polícia Federal, preocupados com o comprometimento da polícia estadual com os fazendeiros da região.

Também apoiamos a reinvindicação dos indígenas sobre a necessidade de que sejam indicados novos delegados federais para assumir o caso, em substituição aos que atuam na região, uma vez que estes foram denunciados pelos indígenas em carta endereçada ao Governo Federal por uma atuação “declaradamente anti-indígena” e preconceituosa.

As contradições e divergências existentes entre os depoimentos do fazendeiro Orlandino e dos dois indígenas, que também foram vítimas dos disparos e que presenciaram o assassinato do adolescente Denilson, reforçam ainda mais a versão de que o crime foi doloso. A comunidade, portanto, refuta a versão de que o fazendeiro, naquela noite de 16 de fevereiro, teria atirado da varanda de sua casa na direção do criadouro de peixes porque ouviu barulho e os latidos dos cães. A distância da varanda da casa até o local onde Denilson foi morto é de pelo menos 400 metros. A pergunta que deve ser respondida é como um senhor de 61 anos de idade, durante a noite, portanto no escuro, e a mais de 400 metros acertou um tiro na cabeça do adolescente? O Cimi confia plenamente na versão dada pelos indígenas e reafirma se tratar de um caso de homicídio com fortes traços de execução.

Em seu relato, Orlandino negou a participação de outras pessoas no crime, contradizendo o depoimento das duas testemunhas que viram Denilson ser assassinado, onde apontaram a participação de três pessoas no homicídio. Para o Cimi, ao omitir esta informação, Orlandino estaria tentando descaracterizar a prática de ‘segurança’/pistolagem da área, recorrente nas áreas de conflito Guarani e Kaiowá, que já resultaram em incontáveis ataques a acampamentos e aldeias, e pessoas feridas, torturadas, desaparecidas e mortas.

O Cimi compreende que a defesa feita pelos advogados do fazendeiro tem o objetivo de despolitizar o conflito, tratando a morte de Denilson como uma “fatalidade”, um crime comum, tirando-o da dimensão de crime contra os direitos humanos. É importante enfatizar que as áreas do entorno das reservas ocupadas por fazendas foram estudadas nos levantamentos feitos pelo Grupo Técnico (GT) de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Dourados-Amambaipeguá, cujo relatório ainda está sob avaliação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e desde então, segundo relatos das famílias do tekoha Tey’ikue, onde vivia Denilson, os conflitos com o fazendeiro Orlandino se acirraram. Trata-se, portanto, de uma área de conflito, fruto de um processo histórico de confinamento – e das consequências geradas por ele – sofrido pelos indígenas Guarani e Kaiowá do estado, e não de algo que, conforme declarou à imprensa uma das advogadas do réu “poderia ter acontecido com qualquer outra pessoa”.

Por isso, vimos a público declarar nossa solidariedade ao povo Guarani-Kaiowá na sua luta pela garantia do direito a terra e por justiça, e conclamamos a sociedade para que acompanhe com atenção a apuração de mais este assassinato. Não podemos permitir que assassinos de indígenas fiquem impunes. Denilson foi covardemente assassinado, seus familiares estão inconformados, sua comunidade clama por justiça.

Campo Grande, MS, 5 de março de 2013.

Conselho Indigenista Missionário – Cimi


Homens invadem aldeia Kaiowá em Rio Brilhante, relata Aty Guasu

O Conselho do Aty Guasu (grande assembleia Guarani-Kaiowá) relatou que, no último domingo, 3, um grupo de homens invadiu o tekoha – território sagrado – Laranjeira Ñanderu, comunidade Kaiowá de Rio Brilhante, região de Dourados (MS).

O ataque aconteceu dias depois da equipe de perícia antropológica do Grupo Técnico ter iniciado os trabalhos de campo que deverão levar à desintrusão e demarcação do tekoha.

Segundo relatos de lideranças da aldeia, colhidos por membros do Aty Guasu, os homens, que não puderam ser identificados, chegaram num trator com os faróis apagados, de propriedade de um fazendeiro vizinho à aldeia, que puxava uma carreta com uma dezena de homens embriagados, e ameaçaram incendiar a casa de reza da comunidade.

Leia o relato do Aty Guasu sobre o caso.

Acionada, uma equipe da Fundação Nacional do Índio (Funai) esteve no local para apurar as informações.

Conflito

Desde a reocupação do território, em 2009, conflitos impulsionados por fazendeiros locais tem sido recorrentes. O mais comum é o fechamento da saída da aldeia com toras de madeira, impossibilitando os indígenas de usarem ônibus escolares ambulâncias.

Em janeiro, uma liderança indígena relatou à equipe do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) ter sido alvejada com quatro tiros pelo arrendatário da fazendeira que incide sobre o território, reivindicado pela comunidade como tradicional do povo Kaiowá. A indígena conseguiu escapar com vida do ataque, se escondendo na mata.

Leia mais:

 – Fazendeiros bloqueiam e plantam soja em estrada que dá acesso à aldeia

 – Fazenda vizinha à Laranjeira Ñhanderu deve liberar acesso a acampamento indígena

O tekoha de Laranjeira Nhanderu está contemplado no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) estabelecido em 2007 pelo Ministério Público Federal (MPF) com a Fundação Nacional do Índio (Funai). O acordo exige que sejam constituídos grupos técnicos para identificação e delimitação das terras indígenas, no sentido de agilizar o trabalho de demarcação de terras reivindicadas pelos Kaiowá e Guarani.

O território, de cerca de 400 hectares, foi retomado em 2009. Em 2010, os indígenas foram expulsos da área, quando se alojaram às margens da estrada, ao lado da entrada de uma das fazendas invasoras. Sofreram com as inundações, o calor, falta de água potável e ao menos três mortes por atropelamento, até que retomaram novamente o território em maio de 2011.

Já em janeiro de 2012, os fazendeiros tentaram a reintegração de posse da área em ação junto à Justiça Federal. Contudo, por conta da pressão de indígenas e organizações indigenistas, o despejo foi suspenso pelo Tribunal Regional Federal da 3a. Região (TRF-3), em São Paulo, onde ainda tramita o processo dos fazendeiros contra os indígenas.

http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&conteudo_id=6745&action=read

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