Mais sobre a ciclopassarela que ligará a USP ao parque Villa Lobos

Raquel Rolnik*

Na semana passada falei aqui no blog sobre um projeto do governo do Estado de São Paulo de construção de uma ciclopassarela ligando a USP ao parque Villa Lobos. Depois que publiquei o texto, o professor Bruno Padovano, meu colega na FAU e autor do projeto, me enviou o seguinte comentário:

Cara Raquel,

Você tem razão sobre a necessidade de um plano urbanístico abrangente para as Marginais, prioridade do Governo Alckmin e do próprio Prefeito Haddad, pelo que já divulgou de seu programa. O sonho de que isso acontecesse vem de longe, quando o Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB/SP) e a Prefeitura Municipal de São Paulo lançaram o “Concurso Nacional de Ideias para a Reestruturação Paisagística e Urbanística para as Marginais dos Rios Pinheiros e Tietê”, em 1998, e premiado em 1999. Naquela ocasião, uma equipe de professores, ex-alunos e alunos da USP, sob minha coordenação, foi a vencedora, prevendo interligar as margens opostas com transposições para pedestres, entre outras medidas necessárias. Desde essa época, fizemos, no Núcleo de Pesquisa em Tecnologia da Arquitetura e Urbanismo (NUTAU/USP), outros estudos sobre a área das Marginais e, quando a Secretaria de Desenvolvimento Metropolitano pediu uma proposta para a passarela, achamos que seria uma oportunidade ímpar para reintroduzir um projeto com riqueza socioambiental.

Ainda existe o próprio Plano Diretor da USP, elaborado por colegas nossos da FAU como Candido Malta Campos e Paulo Bruna, que previa uma interligação da USP com o Shopping Villa-Lobos e uma nova estação da CPTM, exatamente no mesmo local da ciclopassarela proposta, apenas com uma ligação em linha reta. Ele foi modificado para incluir a própria ciclopassarela, com sua forma sinuosa que ajuda a absorver os esforços laterais na estrutura estaiada adotada. Agora ela interliga dois espaços públicos com vocação para o lazer e permite uma futura ligação com uma nova estação da CPTM (prevista no Plano Diretor da USP) caso esta venha a ser implantada. Ainda, através de uma rampa lateral ao ponto de chegada no parque, ela prevê uma possível ligação com o próprio shopping, como com as ciclovias ao longo do rio Pinheiros.

Creio, assim, que não haja necessariamente uma contradição com o “antes” ou “depois” do plano, nesse caso, na medida que é uma conexão muito interessante para uma mobilidade mais sustentável em São Paulo, como defendemos em nosso livro recém-lançado sobre este tema. O importante é que as Marginais finalmente estão chamando a atenção das nossas autoridades, que, como havíamos sugerido na proposta vencedora com a criação de uma Comissão das Novas Marginais (CONOMA), pretendem agir através de um trabalho conjunto envolvendo o Governo do Estado, os municípios metropolitanos, o Banco Mundial e a USP, com participação ativa da sociedade civil  e das comunidades no processo. Isto deve garantir que uma abordagem pluralista seja adotada e que a nossa proposta, vencedora daquele concurso, se transforme numa realidade, com as necessárias adequações e complementações, após quase quinze anos da sua realização.

Prof. Dr. Bruno Roberto Padovano
Associado, FAUUSP
Coordenador Científico, NUTAU/USP

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O comentário do professor Bruno Padovano revela alguns fatos dos quais eu não tinha conhecimento; por exemplo, a proposta vencedora do Concurso de Ideias para as Marginais, (inviabilizada posteriormente, em boa parte, pela construção de novas pistas na Marginal do Tietê), a existência de um Plano Diretor da USP que prevê uma nova estação da CPTM, e a ideia de um Conselho Gestor das Marginais que reuniria o conjunto de órgãos e empresas que hoje atuam sobre estas, mas também nunca foi implantado. Em que pesem estes esclarecimentos, reitero aqui alguns problemas que estão longe de ser circunscritos a este projeto específico.

Me parece ainda importante questionar um processo no qual primeiro se lançam os projetos (que podem ou não “pegar” e ser executados) e depois se fazem os planos, quando são feitos… Além disso, os projetos apresentados não resolvem o conjunto de questões relacionados à melhoria da mobilidade e acessibilidade neste exato ponto da cidade. Um desses pontos é justamente a dificuldade da ligação entre a estação Cidade Universitária da CPTM e a USP. O leitor Durval, por exemplo, comentou sobre isso aqui no blog: “A ciclofaixa de lazer passa EM FRENTE à passarela que dá acesso à ciclovia no viaduto Cidade Universitária. Quem quiser passar de uma a outra é obrigado a empurrar a bicicleta pela calçada até o final do viaduto e contar com a boa vontade dos motoristas para atravessar a via expressa, sem semáforo.”

Nada tenho contra a execução de uma passarela para ciclistas e pedestres entre a USP e o Villa Lobos, mas seria muito importante que estas iniciativas pudessem ser tomadas a partir de um plano integrado de acessibilidade e mobilidade, implementado posteriormente pelo conjunto de atores que incidem sobre este território, incluindo a própria prefeitura da cidade universitária.

*Urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada.

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