Débora Zampier* – Agência Brasil
Brasília – A dicotomia de teses sobre os prós e contras da produção e uso do amianto no Brasil se repetiu ontem (31) durante julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte começou a analisar ações contra leis estaduais que proíbem a fibra em São Paulo e no Rio Grande do Sul e a sessão foi encerrada quando o placar registrava empate de 1 voto a 1.
O amianto é uma fibra mineral usada na construção civil. Apesar dos benefícios da substância para a economia nacional – geração de empregos, exportação, barateamento de materiais de construção -, estudos comprovam que a substância é cancerígena e causa danos ao meio ambiente.
As ações analisadas hoje questionam o fato de as leis estaduais se sobreporem à norma nacional que regulamenta o uso do amianto. Uma lei federal de 1995 permite o uso controlado do tipo crisotila, proibindo as demais variações da fibra. Já nos estados em questão, as leis estaduais determinam a proibição total.
Para o ministro Carlos Ayres Britto, relator da ação envolvendo o Rio Grande do Sul, as leis estaduais não concorrem com a lei federal, mas apenas complementam seu sentido. “A União não tem dignidade maior que os estados para sair em defesa do meio ambiente, da saúde e do consumidor. A diferença não é de qualidade, mas de escala, no caso, geográfica”.
O ministro relativizou a tese de que as leis estaduais prejudicaram a garantia da livre iniciativa. “A lei que consagra a livre iniciativa, também consagra a proteção do consumidor e do meio ambiente”. Britto assinalou que foram estipulados prazos para que os estabelecimentos se adequassem ao fim do amianto “serenamente”.
Ainda segundo o ministro, não há como declarar a inconstitucionalidade de uma norma que se aproxima da convenção da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil, que recomenda a eliminação do uso da fibra, que ele classificou como “fábrica de adoecimento”.
Em voto de contraponto, Marco Aurélio Mello, relator da ação envolvendo São Paulo, disse que as unidades da federação não podem aprovar leis que desafiam regras nacionais. “Imagine que estados comecem a digladiar sobre os mais diversos produtos, sobre critérios científicos os mais diversos, em casos que exigem uniformização”.
Para o ministro, embora estudos médicos apontem que o amianto é cancerígeno, o Poder Público não deve proibi-lo e sim minimizar danos. “Admito que representantes do Congresso Nacional possam fazê-lo [proibir o amianto], mas não o Judiciário e o Supremo. Não pode haver premissa jurídica para tirá-lo do mercado, sob risco de inviabilizar a vida em sociedade, apenas porque o poder público tem incapacidade de fiscalizar de modo efetivo”.
Segundo Marco Aurélio, a suposição de que as empresas usarão o amianto de maneira indevida “é esperar o exorbitante, que foge ao comum da vida”. Ele argumentou que, seguindo o mesmo conceito de danos em casos de exceção, o país também terá que banir o lixo tóxico, armas de fogo, facas e veículos automotores.
O ministro reforçou que o Estado precisa de medidas eficazes para reduzir o dano à exposição do material, cuja abolição traria sérios prejuízos para a economia nacional, tanto para produtores quanto para consumidores. “Se for proibido esse produto, a porta deve ficar aberta para proibir ‘n’ produtos, aí poderemos voltar à época da caverna”.
Embora não tenha adiantado o voto, o ministro Gilmar Mendes pediu um aparte para dizer que a Corte não pode sempre optar pela opção que oferece, em tese, maior proteção. “De boa intenção o inferno está cheio, por isso é importante ter cuidado com a legislação. Por isso a importância da audiência publica, senão podemos substituir o achismo do legislador pelo nosso achismo e, se é para dar palpite, melhor que seja do legislador. Ele faz um experimento e, se der errado, ele volta atrás”.
A sessão se estendeu até as 21h45 e só foi suspensa porque não havia mais quorum – apenas cinco ministros permaneciam no plenário. Não há previsão de data para retomada do julgamento.
*Edição: Fábio Massalli
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http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2012-10-31/julgamento-do-uso-de-amianto-no-stf-e-paralisado-com-placar-empatado
Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.
Fernanda,
lamentavelmente não me surpreendeu em nada! Só me deu vontade de perguntar o que ele faria se recebesse de presente um caminhão de pó de amianto no quintal e como veria suas possibilidades de em consequência morrer e adoecer. Igual a atravessar a rua etc?
Nojo!
O amianto e o julgamento no STF: onde está a controvérsia?
Por falta de quórum, a mais importante das ADINs, que trata da inconstitucionalidade da lei federal do “uso controlado do amianto”, deixou de ser votada pelo pleno do STF. O seu relator, Ministro Carlos Ayres Britto, que se aposentará no próximo dia 18 de novembro, provavelmente não proferirá seu abalizado voto, o qual lamentamos profundamente. Quanto às 2 leis estaduais, que paradoxamente são questionadas por uma suposta confederação de trabalhadores – a CNTI, tivemos apenas os votos dos relatores, Ayres Britto (excelente e equilibrado disponível em http://s.conjur.com.br/dl/voto-ministro-ayres-britto-proibicao.pdf) e o de Marco Aurélio, que decepcionou a todos nós que militamos na área de saúde, trabalho e meio ambiente. Como promotor das audiências públicas, ocorridas em 24 e 31 de agosto último, onde 35 especialistas trouxeram suas valiosas contribuiç?es, parece que o ministro Marco Aurélio não tirou nenhum proveito delas, pois manteve a mesma posição e voto proferidos em 4.6.2008, quando foi vencido por seus pares (7×3), e sua liminar contra a lei de banimento em São Paulo foi revogada. Foi frustrante ouvir seu relatório de 2 horas repleto dos argumentos da indústria. Parecia que lia o website do principal produtor de amianto do país com suas teses miabolantes na defesa do indefensável. Pior ainda foi ouvir que a culpa das ilicitudes cometidas pelas empresas do amianto se deve à falta de fiscalização, que, em seu esforço hercúleo e muitas vezes solitário, para superar as deficiências estruturais, foi quem as apontou em diversos exemplos nas audiências públicas. Seria o mesmo que afirmar que na ausência de presídios em número suficiente e de uma força policial eficiente, criminosos deixariam de ser assim considerados, pedófilos seriam aceitos socialmente, meliantes em geral gozariam de salvo-conduto. Foi terrível ouvir que pregamos retornar à era das cavernas. Mas, o mais nauseante é ouvir que água também mata e que somos anti-progresso. Esta é a Corte Suprema do país com raras e honrosas exceções. Os demais ministros não votaram por falta de tempo e quorum. Perderam uma grande oportunidade de pôr fim à chamada catástrofe sanitária do século XX. Resta saber quando teremos novo espaço na pauta do STF para a continuidade do julgamento da fibra assassina, que ficou no frustrante empate de 1 x 1.
Gerente do Programa Estadual do Amianto da Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo
Fundadora da ABREA- ASSOCIAÇ?O BRASILEIRA DOS EXPOSTOS AO AMIANTO Coordenadora da Rede Virtual-Cidad? pelo Banimento do Amianto na América Latina