MPF recorre ao STF contra ação que barrou desocupação de área xavante

Índios são contrários à permuta de área indígena (Foto: Reprodução/TVCA)

Produtores conseguiram liminar que impediu desocupação de Marãiwatsédé. MPF alega que território já apresenta avançado processo de desmatamento

Dhiego Maia – Do G1 MT

A Procuradoria Geral da República interpôs recurso no Superior Tribunal Federal (STF) contra a liminar que suspendeu a desocupação da Terra Indígena Marãiwatsédé, em Alto Boa Vista, a 1.064 quilômetros de Cuiabá, nesta terça-feira (9). A desocupação deveria ter começado, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), no dia 1º de outubro.

G1 entrou em contato com o advogado da Associação dos Produtores Rurais da Área Suiá-Missú (Aprossum), Luiz Alfredo Feresin. Ele disse que ainda não foi notificado do pedido e que só irá traçar uma estratégia de defesa quando souber o teor do recurso impetrado pelo MPF.

No mês de setembro, há poucos dias do início do processo de desocupação, o vice-presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, desembargador Daniel Paes Ribeiro concedeu liminar barrando a retomada da terra aos xavantes em julgamento à ação movida pela Aprossum.

Uma das alegações do magistrado se ateve a um risco iminente de conflito entre as duas partes e também a possibilidade de haver permuta entre a área indígena por outra. “Há nítido conflito entre os indígenas e a Funai, que tem por missão, justamente, tutelá-los”, conforme trecho da decisão.

Para o MPF, no entanto, os dois argumentos não se sustentam. De acordo com a vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, e o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, a lei  em vigor no estado que autoriza a permuta da terra indígena é inconstitucional.

No pedido de suspensão, o MPF salientou que os territórios indígenas são “espaços simbólicos de identidade, de produção e reprodução cultural, não sendo, portanto, algo exterior à identidade, mas sim a ela imanente.” Outra preocupação do órgão é com a continuidade do desmatamento ilegal, conversão do solo e grilagem de terras que já são recorrentes na região.

Imagem do Inpe mostra, marcada com linha amarela, o alerta de desmatamento na Terra Indígena Maraiwatsede. O círculo vermelho, acrescentado pelo Globo Natureza, indica a localização da aldeia xavante. (Foto: Inpe)

“Todo grupo humano tem um limite para resistência. Os xavantes estão nessa luta desde a década de 60 e os anciões temem morrer sem ver a sua terra libertada. Todos os atos do Executivo e decisões judiciais reconhecem que o direito está a seu lado. Por que retardar a ocupação de terras que são correlatas à afirmação identitária desse povo?”, conforme trecho do pedido do MPF.

A reserva
A extensão supera 165 mil hectares. De acordo com a Fundação Nacional do Índio, o povo xavante ocupa a área Marãiwatsédé desde a década de 1960. Nesta época, a Agropecuária Suiá-Missú instalou-se na região. Em 1967, índios foram transferidos para a Terra Indígena São Marcos, na região sul de Mato Grosso, e lá permaneceram por cerca de 40 anos, afirma a Funai.

No ano de 1980 a fazenda foi vendida para a petrolífera italiana Agip. Naquele ano, a empresa foi pressionada a devolver aos Xavante a terra durante a Conferência de Meio Ambiente no ano de 1992, à época realizada no Rio de Janeiro (Eco 92).

A Funai diz que neste mesmo ano – quando iniciaram-se os estudos de delimitação e demarcação da Terra Indígena – Marãiwatsédé começa a ser ocupada por não índios.

O ano de 1998 marcou a homologação, por decreto presidencial, da Terra Indígena. No entanto, sucessivos recursos impetrados na Justiça marcam a divisão de lados entre os produtores e indígenas. A Funai diz que atualmente os índios ocupam uma área que representa “apenas 10% do território a que têm direito”.

O território está registrado em cartório na forma de propriedade da União Federal, conforme legislação em vigor, e seu processo de regularização é amparado pelo Artigo 231 da Constituição Federal, a Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio) e o Decreto 1.775/96, pontua a Funai.

Em 2010 uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região confirmou a decisão de primeiro grau reconhecendo a legalidade do procedimento administrativo de demarcação da terra indígena. Para a Funai, “a posse de todos os ocupantes não-índios foi considerada de má-fé, sobre bem imóvel da União”.

Permuta
Em busca de uma solução para o impasse, o governo de Mato Grosso cogitou a realização de uma permuta. A proposta consistia em uma ‘troca’ da terra em litígio por uma correspondente no Parque Estadual do Araguaia, transformando-o em reserva indígena.

Mas no entender do Ministério Público Federal, a proposta fere a Constituição Federal, uma vez que a transferência dos índios para outra área pode ser realizada somente de caráter provisório e ainda motivada por razões extremas, como em caso de epidemia.

http://g1.globo.com/mato-grosso/noticia/2012/10/mpf-recorre-ao-stf-contra-acao-que-barrou-desocupacao-de-area-xavante.html

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