“Mészáros e Ciência, mais o Falso Consenso Científico”

Nesse artigo questiona-se a ciência engajada no capitalismo e damos a Hipótese do Aquecimento Global como exemplo da falsa ciência consensual, comparável ao também falso consenso da Hipótese Geocêntrica

por José Carlos Parente de Oliveira (*)

István Mészáros, em O Poder da Ideologia (Ed. Boitempo, SP, 2004) afirma: “A idéia de que a ciência segue um curso de desenvolvimento independente, de que as aplicações tecnológicas nascem e se impõem sobre a sociedade com uma exigência férrea, é uma simplificação demasiadamente grosseira e com objetivos ideológicos”. E mais: “defender a absoluta imanência do progresso científico e de seu impacto sobre os desenvolvimentos sociais, só pode servir aos propósitos da apologia social. Assim, para o autor, a ciência não é um corpo (…) neutro de conhecimento, é antes o reflexo do sistema social que a envolve.

Mészáros, no mesmo livro, cita que: “(…) o mais básico da ciência que realizamos é um produto de nossa sociedade. Portanto, certos tipos de sociedade realizam certos tipos de ciência; investigam determinados aspectos da natureza. A religião babilônica antiga exigia a previsão exata dos acontecimentos celestes, e a ciência babilônica era muito dedicada ao estudo intensivo da astronomia. O capitalismo emergente da revolução industrial na Grã-Bretanha exigia avanços tecnológicos na geração de energia, e os físicos estudaram as leis da termodinâmica e da conservação e transformação de energia. (…) também é verdadeiro que (…) em algumas sociedades alguns tipos de ciência não são praticados. Tornam-se mesmo impraticáveis (…).”

O Brasil é um bom exemplo deste último tipo de sociedade. Somos abundantes em energias eólica e solar – as “meninas dos olhos” do dito desenvolvimento sustentável – e não temos pesquisa e desenvolvimento conseqüente nestas áreas. Somos o segundo maior “mercado” mundial de telefonia móvel – e que pesquisa temos neste campo? Quando muito, um desenvolvimento marginal. Sequer montamos o que consumimos! Em qual campo do saber somos proeminentes? E atente-se para o fato de sermos um dos 13 países que mais produz artigos científicos e a 8ª economia mundial.

O que vemos e assistimos é que o modo de produção capitalista estabelecido e suas relações de propriedade são apresentados como infalíveis e insuperáveis, portanto únicos, e nada pode entrar em cena para perturbá-los: a natureza, assim como a sociedade, funciona perfeitamente e, qualquer intervenção humana, terá o condão de destruir e ameaçar esta ordem perfeita. Assim, também é a ciência financiada pelo modo de produção capitalista. Principalmente, tratando-se de sociedades em desenvolvimento.

Foi criado e desenvolvido ao longo de séculos, e colocado em nossas mentes, um modelo de sociedade e de ciência prontos a identificar como normal e desejável tudo aquilo que se encaixa nos padrões instituídos pelos “poderosos” do momento histórico. Portanto, nossa percepção da sociedade e da natureza é historicamente construída – enxergamos somente aquilo que nos ensinaram a ver, com destaque para algumas partes, enquanto outras são, convenientemente, descartadas. Em conseqüência, se na sociedade as relações sociais prevalentes são eternas, nada mais natural que criar uma ciência natural que postule a imutabilidade da natureza, pois as mudanças, sociais ou naturais, são prejudiciais e temíveis. E assim, uma vez estabelecidos os padrões, toda dissidência deve ser exterminada!

No mesmo livro, Mészáros também tece considerações sobre as supostas objetividade e neutralidade conferidas às ciências naturais, por seu caráter eminentemente experimental e instrumental. Ora, como os cientistas naturais precisam de uma estrutura de apoio e de instrumentos complexos e caros, eles necessitam de vultosos recursos materiais e financeiros como condição elementar para sua atividade. Dessa forma, esses cientistas naturais não são tão livres e desvinculados e podem perder as condições instrumentais e institucionais indispensáveis à sua atividade, caso tomem alguma iniciativa no sentido de denunciar práticas abusivas de seus “patrões”. Todos sabemos que financiamentos científicos são quase que exclusivamente acessíveis a poucas sociedades ditas “avançadas”, o que é determinante para a perpetuação do sistema de desigualdades e exploração em escala global e, efetivamente, em nada contribui para sua eliminação ou mesmo superação. A ciência e a tecnologia nos países capitalistas ditos avançados operam de acordo com os ditames e objetivos das poderosas estruturas econômicas, politicamente organizadas e “aliadas” dos governos.

E o consenso científico? Ele existe? Nas atividades em ciência é muito comum, e mesmo desejável, que um pesquisador ou grupo de pesquisadores procurem reforçar seus achados, com achados de outros pesquisadores independentes. De forma que, quanto mais achados similares e independentes há, mais acreditada passa ser a ciência desenvolvida. Seria essa acreditação o consenso científico? Se sim, ele necessariamente não é imutável, pois a ciência evolui.

O fazer ciência inclui etapas como a verificação de fatos e achados, argumentação racional, revisão de resultados similares, com a possível repetição desses resultados, revisão da metodologia, busca de novos fatos e achados, e interpretação. Todo esse trabalho pode resultar em debate sobre a validade de distintas conclusões obtidas. Quando isso ocorre deve-se fazer, no mínimo, uma revisita a todas àquelas etapas. Porém nunca, em hipótese alguma, o debate deve ser decidido por votação a favor de uma ou outra conclusão.

Dessa forma, nos parece muito claro que o consenso não deve ser parte da metodologia científica, tampouco deve ser critério a ser utilizado para determinar sobre a validade ou não de dada teoria.

Historicamente, há dois momentos em que foi atribuído um “consenso científico”, os quais se enquadram perfeitamente no arcabouço da ideologia do poder, e são exemplos claros do poder da ideologia. São eles, a hipótese do sistema geocêntrico e a hipótese do aquecimento antropogênico.

Naquele momento o consenso assemelhou-se à máxima falaciosa que se muitas pessoas importantes acreditam em uma idéia, não é razoável considerá-la falsa. E foi assim ao longo de séculos, quando a Igreja, auto definida como feita de homens cultos, sérios e importantes, forçou a sociedade a acreditar que a Terra era o centro do Universo, ao preço de até cometer atrocidades. Nesse episódio, a autoridade foi imposta como critério de verdade.

Neste último momento, novamente foi imposta a autoridade como critério de verdade, aliada a uma decisão por votação – cerca de 2500 dos mais “importantes cientistas” de diferentes áreas de estudos e “representantes de governos” garantiram que o aquecimento global é antropogênico e decidiram por votação que o consenso era um fato e que a ciência do clima estava estabelecida! E como importantes reforços foram apresentadas a formulação de cenários não realistas, mas convenientes aos interesses “políticos” de certos grupos de pressão e o sofisma do consenso que resultou da concordância entre as projeções climáticas obtidas pelos 22 modelos do IPCC (concordância que pode resultar do fato dos modelos basearem-se nos mesmos pressupostos sobre o sistema climático, ou concordância que pode resultar do fato dos modelos cometerem os mesmos erros). Ao longo e ao fim, não há, absolutamente, nenhum achado científico verificável que garanta a exatidão das projeções para daqui a 10, 50 ou 100 anos. O que há de fato são projeções de modelos climáticos precários e manipuláveis – afinal, o sistema climático é muito complexo e o seu desconhecimento obriga os cientistas do clima utilizarem muitas parametrizações!

Por que empregar tanta energia e esforço com uma “discussão” criada para empanar o verdadeiro problema: o modo de produção capitalista que embrutece o homem, dilapida o planeta e suja o meio ambiente? A razão dada pelos céticos para continuar a discussão são as violentas e injustificadas campanhas midiática e ONGmática para mudar o mais rápido possível a matriz energética mundial, aliada à necessidade de mudanças nos hábitos de vida da humanidade.

(*) Professor, doutor em Física e Pós-doutorado em Física da Atmosfera.

[Enviada pelo autor, a quem agradecemos, em resposta à polêmica sobre a questão da mudanças climáticas. TP]

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