Entrevista: bióloga Mônica Lima alerta que a TKCSA sempre poluirá

Por Eliomar Coelho

Uma das especialistas do grupo multidisciplinar que acompanha o impacto ambiental da TKCSA na região de Santa Cruz, Mônica Lima afirma que a emissão de material particulado é diária e já provoca doenças graves como disfunção renal. A biológa de Uerj está sendo processada pela TKCSA – um consórcio que reúne a empresa alemã ThyssenKrupp e a Vale – porque vem denunciando como a poluição atmosférica causada pela siderúrgica está associada a doenças agudas e crônicas. Em entrevista ao mandato Eliomar Coelho, Mônica disse que a empresa deveria, de imediato, ter usado o mesmo filtro que usa na Alemanha mas isso dobraria os gastos com a construção. Mônica também atua no grupo de trabalho – formado pelo secretário estadual de Meio Ambiente, Carlos Minc- responsável por levantar subsídios que definirão futuras indenizações.

Por que você está sendo processada pela CSA?

Mônica Lima – Por que venho dizendo a verdade e desejo proteger os atingidos, já que meu compromisso é com a sociedade e não com empresas e governos. A empresa age com má fé para me intimidar e ameaçar, pois venho associando a poluição atmosférica da TKCSA, ou seja, o particulado e os gases tóxicos com doenças agudas, ou seja, as doenças imediatas, como os casos de alergias dermatológicas, respiratórias e oftalmológicas (asma, bronquite, rinite, conjuntivite, coceiras na pele com e sem sangramentos) e as doenças crônicas futuras, como câncer, casos de aborto espontâneo e doenças neurológicas. Mas algumas doenças crônicas já estão ocorrendo, como é o caso de um menino que apresentou síndrome nefrótica, que é uma grave disfunção renal provocada pelas altas concentrações no sangue da toxina da bactéria que se replica durante a infecção de pele ocasionada pelo pó-brilhoso da CSA. E ainda dizem que é só grafite e é inofensivo. Mais especificamente, estão me processando devido a uma entrevista no portal da Portogente e duas falas que fiz na Alerj durante as audiências da comissão de investigação. Dizem que estou alarmando a população sem ser médica. Porém, sou profissional de saúde e estou me baseando em estudos nacionais e internacionais que tratam de doenças provenientes do vazamento de siderúrgicas.

A Fiocruz fez um estudo sobre o nível de poluição do ar causado pela CSA na região de Santa Cruz. O que foi constatado?

Mônica Lima – Que o particulado, o pó-brilhoso, não é só grafite, possui uma série de outros metais (exemplo: cálcio, manganês, silício, enxofre, alumínio, zinco, magnésio, estanho, cadmio, titânio, dentre outros) que podem ser tóxicos e nocivos em altas concentrações e também devido ao efeito cumulativo ou sinérgico, e que o nível de ferro aumentou mais que 1000% no ar. Outros problemas de saúde podem ser agravados devido ao particulado fino, que pode carrear além de metais, substâncias tóxicas que afetam a saúde humana, como hidrocarbonetos poliaromáticos. Verificou-se também que os picos nas medições de particulados estão bem acima do nível considerado aceitável pela nossa legislação e pela OMS. O Inea e a empresa fazem uma média que acaba diluindo os picos e mascarando o resultado. O relatório também possui a avaliação clínica de indivíduos moradores do entorno da usina e diagnostica alguns indivíduos com CID10-F43, uma síndrome de inadaptação gerada por estresse grave e transtorno de adaptação devido a presença da empresa e a má qualidade de vida gerada, fazendo o nexo causal com a TKCSA. Também verificou-se muitos eventos de asma, sinusite, tosse com início ou piora após a exposição à poeira da CSA, e pruridos na pele e couro cabeludo devido o pó prateado.

Que danos a poluição causa à população vizinha? Que danos pode causar ao ecossistema da região?

Mônica Lima – Além dos impactos nocivos à saúde, com o aparecimento e agravamento de doenças, os impactos socioambientais, sanitários e ao ecossistema mais prováveis que já estão ocorrendo são a poluição hídrica e atmosférica, a destruição de 10 mil hectares de manguezal com animais em extinção como o peixe-boi, deslocamento compulsório de 14 mil pessoas, exacerbação da violência urbana com aparecimento inclusive de prostituição, e saturação de serviços que já são precários na região, como os da área da saúde. O fechamento do Hospital Pedro II é um dos piores agravantes neste momento de caos que atribuo ao governo do estado.

Desde que entrou em operação, em 2010, a CSA já provocou dois graves acidentes e foi novamente multada, este ano, por poluição com fuligem. Acredita que a empresa ThyssenKrupp utiliza os mesmos padrões de segurança empregados na Alemanha?

Mônica Lima – Não, e na Alemanha esse projeto nunca seria instalado. Desde a época do Rima, os profissionais da Fiocruz e da RBJA (Rede Brasileira de Justiça Ambiental) já apontaram para o duplo padrão e vulnerabilidade das nossas instituições reguladoras e fiscalizadoras. No Rima também houve ausência de análise dos efeitos cumulativos e sinérgicos devido aos passivos ambientais que a região já possuía, como os deixados pela Ingá Mercantil, pela siderúrgica Gerdau e as indústrias e fábricas já existentes na região. E o que agravou absurdamente a poluição e a emissão de particulados foi o fato de o governador Sérgio Cabral ter autorizado o funcionamento do segundo alto-forno baseado em um laudo limitado tecnicamente e emitido por uma empresa privada e estrangeira. Esclareço que tais “acidentes” ocorrem diariamente, o que difere é a quantidade de particulado emitido.

Por determinação do Ministério Público Federal e do Inea, a CSA terá que fazer uma auditoria externa. Na sua opinião, esse procedimento pode resultar na proibição de concessão da licença definitiva de operação por parte do Inea? Qual sua avaliação sobre a atuação do Inea?

Mônica Lima – Acho pouco provável, pois é um projeto imperialista e hegemônico (do capital internacional), mas tudo pode acontecer e vai depender do movimento e da pressão social. O estado e o governo são ausentes, aplicam multas que não resolvem a situação efetivamente, e a empresa ainda usa o dinheiro da multa para se promover. É o empresariamento da região, onde a sociedade se torna refém da empresa com seus projetos compensatórios e de “responsabilidade social”. A primeira auditoria que esta empresa procurou fazer foi com a Usiminas, onde havia conflito de interesses, caracterizando mais uma vez sua má fé. Técnicos da Usiminas também estão respondendo a processos criminais, assim como diretores da TKCSA, por omitirem informações e por crimes ambientais, respectivamente.

Para receber a licença, o Inea exige que a CSA adeque suas operações às determinações ambientais. Os moradores e pescadores de Sepetiba são contra a licença definitiva. Na sua opinião, a CSA tem condições de operar sem causar danos à população vizinha e ao ambiente?

Mônica Lima – Não, pois vem funcionando há mais de um ano se utilizando de um procedimento que deveria ser de emergência, portanto, a empresa, de imediato, deveria ter usado o mesmo filtro que usa na Alemanha. Mas isso exigiria gastos comparados à construção de uma nova siderúrgica. O tipo de solo também não é compatível com o empreendimento e cederá sempre. Ou seja, são incompetentes e não valorizam a vida, valorizam o “futuro do aço” como divulgado em outdoors da empresa na região. E mesmo que funcione com um excelente padrão é um empreendimento polêmico que sempre poluirá. É a política da luta de classe, onde impera o racismo ambiental e o território de exceção.

http://www.eliomar.com.br/2011/11/16/entrevista-biologa-monica-lima-alerta-que-a-csa-sempre-poluira/

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