Maranhão Indígena: Lideranças dialogam sobre reestruturação da FUNAI

Terra Indígena Araribóia, Sul do Maranhão – Em uma das regiões onde o índice de desmatamento é um dos maiores da Amazônia Legal, o movimento indígena se fortalece com a manifestação da sua base, dialogando para a conquista de direitos

Assim foi a reunião das lideranças indígenas do Sul do Maranhão, que aconteceu no período de 13 a 15 de setembro, na Aldeia Lagoa Quieta, território do povo Tentehar, gente verdadeira. Os Guajajara, donos do cocar.

A grande assembleia das lideranças reuniu os Tuixaw e demais representantes das centenas de aldeias da região, para discutir o território tentehar, suas ameaças e suas fortalezas. A Assembleia que em um primeiro momento seria somente dos caciques Guajajara, entretanto, aconteceu com a participação de outros povos, em virtude da gravidade do tema aboradado. A tão falada e pouco vista Reestruturação da FUNAI.

Além dos anfitriões, os Tentehar (Guajajara) o evento contou com a participação de representantes dos povos Gavião, Krikati, Ka’apor, Krenyê e Krepumkatêyê. Todos são testemunhas de um quadro de violação de direitos que vem se repetindo e se agravando a cada ano contra os povos indígenas no Maranhão.

A Terra Indígena Araribóia, por exemplo, sofre com a invasão de madeireiros que assolam a região desde os anos 80, devastando uma área que também é terra de um povo livre, sem contato com a sociedade envolvente, os Awá.

A invasão desse território, situado entre a Amazônia e o Cerrado Maranhense, nos municípios de Buriticupu, Bom Jesus das Selvas, Arame e Amarante, aliado ao desmantelo da FUNAI, gera um quadro de abandono na região.

No Maranhão, a violência contra os povos indígenas assusta. Com todos os nove povos presentes no Estado acontecem ameaças aos territórios, com o avanço do agronegócio, em especial, a plantação de eucaliptos para alimentar as fornalhas das siderúrgicas, um carvão que nunca será diamante.

“A reestruturação da FUNAI que deveria atender as demandas dos povos indígenas não vem sendo implementada em nossa região, lamentavelmente essa foi pensada sem a participação plena e efetiva dos maiores interessados. Denunciamos a violação de direitos garantidos na Constituição Federal de 88 e em tratados internacionais como a Declaração da ONU sobre os Direitos Humanos e a Convenção 169 da OIT, do qual o Brasil é signatário”, destaca o documento final da Assembleia.

Para Silvio Santana Guajajara, cacique da Aldeia Lagoa Quieta e coordenador da COAPIMA – Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão é preciso que o governo escute a nossa voz. “Queremos ajudar, mas não querem a nossa ajuda”, lembra.

“Esse encontro é um esclarecimento regional sobre a reestruturação, para temos informações, queremos ajudar o Governo, mas com esclarecimento para todos os povos, não entre quatro paredes. Esse momento é muito bom para nós, pois vieram explicar o que não nos explicaram. Quando se fala de reestruturação, temos muita esperança, coisas boas, coisas novas. O movimento indígena quer isso. É preciso ouvir nossas idéias, para juntos amarrar e achar uma nova estrada”, profetizou o cacique.

“A FUNAI tá ai desse jeito, não faz projeto com a gente, não faz nada. Os índios estão se reunindo para demarcar terra, precisam de terra. Os Guajajara tão se ajuntando para ver se melhoram as coisas aqui para nós. Sem terra ninguém pode viver. A gente faz roça e cria filho. Os madeireiros têm que sair também, não tão respeitando FUNAI, nem Federal. Muita invasão na área”. Afirmou o cacique da Lagoa Comprida, tumuy Chicão Guajajara, um velho guardião da sabedoria Guajajara.

Wazengahaw: Eternizando a tradição – Enquanto seguia a Assembleia, ia se desenrolando em outros espaços da comunidade a preparação de um ritual de passagem do povo anfitrião, a Festa da Menina Moça, na qual as jovens Guajajara, após sua primeira regra, participam de uma celebração da vida Tentehar, em uma interação que envolve todas as comunidades do local. Maria Santana, avó das meninas e matriarca da aldeia, defende sua cultura com muito entusiasmo, e diz que esse é o momento mais importante para o seu povo. “Aqui está nossa sabedoria. A nossa força!”

Com essa mesma sabedoria as centenas de lideranças presentes na Assembleia escutaram a participação da FUNAI de Brasília, equipe liderada pelo Ashaninka Pianco, assessor da Presidência do órgão, que seguiu com alguns esclarecimentos sobre a reestruturação da FUNAI, algo que nunca aconteceu na região. Para o representante da FUNAI, os povos indígenas no Maranhão, nem sempre ocuparam lugar de destaque, mas o movimento indígena local, dá provas de que se fortalece. “Essa reunião da qual fazemos parte, serve inclusive como uma instancia para se tirar uma comissão para participar do seminário sobre a reestruturação da FUNAI que acontecerá depois, assim será bem representativo”, diz o assessor.

Assim segue a base da COIAB, lideranças discutem e se fortalecem e ajudam a fortalecer o movimento indígena como um todo. Sonia Guajajara, vice-coordenadora da organização maior da Amazônia, participou do evento na articulação e condução, disse que esse momento serve reafirmar a resistência dos povos indígenas na luta pelos seus direitos, bem como apontar encaminhamentos para a resolução dos problemas que afligem a região. “A COIAB, junto com a COAPIMA, busca esse momento há algum tempo. É importante que fique claro que este não é um seminário sobre a reestruturação da FUNAI. É uma reunião nossa, dos povos indígenas. A FUNAI foi convidada para prestar alguns esclarecimentos. O seminário acontecerá na cidade de Imperatriz, com as demandas das outras regiões, com data a ser definida aqui nessa prévia”, lembrou.

Para Sonia Guajajara, a reestruturação da FUNAI precisa sair do papel, pois “enquanto se discutem cargos e salários, as Terras Indígenas estão abandonadas, à mercê de invasores e exploradores dos nossos recursos naturais. O processo de revisão de limites da Terra se trava, e o quadro de abandono e descaso só aumentando”, protestou a liderança.

De acordo com Lourenço Krikati, destacada liderança do movimento indígena no Maranhão, e membro da CNPI – Comissão Nacional de Política Indigenista, o governo não cumpre seus acordos. “O Governo Brasileiro não está sendo sincero com a gente, não cumpre acordo nos ministérios. Há muito tempo cobramos esse esclarecimento, não tivemos nenhuma participação para construir a mudança da FUNAI. Estava esperando muito esse momento. Não devo nada para a FUNAI, e ela não deve nada para mim. Mas estamos aqui em busca dos nossos direitos, dos povos indígenas do Brasil”, afirmou o guerreiro.

Reestruturação, muito falada e pouco vista – Além de discussões gerais e relatos, a Assembléia destacou 03 pontos específicos: A situação da Coordenação Regional da FUNAI do Maranhão, exigindo a saída do Coordenador atual; A revogação dos contratos Coordenadores Técnicos Locais de Amarante, Arame e Montes Altos, e também exigiu condições de trabalho para atuação das CTLs; Composição do Comitê Gestor.

Sobre a polêmica da saída do atual gestor, o cacique Silvio explica. “Há dez anos vivemos essa situação. Esse encontro não foi para tirar alguém. Mas a reestruturação, nem fomos nós que criamos, foi o Governo. Então, que se tenha uma nova cara, novas pessoas, que tragam outras formas de trabalho, não essa que não suportamos mais. Queremos colaborar com o governo, a partir do momento que ele ouça as nossas idéias”, finalizou o cacique Guajajara.

Terra Indígena Araribóia, Sul do Maranhão, terra dos ipês roxos e amarelos, aonde o cerrado se junta com a Amazônia, formando o lar de um povo guerreiro, que segue firme na luta pela conquista e garantia dos seus direitos e pela preservação da sua cultura que segue – ao som do maracá – viva, cantando pelo frio da madrugada a fora, a cantoria dos Maíras, os protetores dessa gente verdadeira.

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