Morte de indígena é reflexo da demora na demarcação de terras em MS

Jovem de 26 anos vivia em acampamento na beira da BR-463 e foi atropelado por dois ônibus. Acampamento foi destruído em um ataque em 2009

A morte de Sidney Cario de Souza, de 26 anos, na última terça, 28 de junho, é consequência direta de um drama comum aos 70 mil índios de Mato Grosso do Sul: a demora na demarcação dos territórios tradicionalmente ocupados pelos indígenas e o quadro de violência e miséria decorrente desta situação. Embora a Constituição Federal de 1988 tenha estipulado prazo de cinco anos para que a demarcação ocorresse, até hoje a maioria dos índios do estado vive em acampamentos na beira de estradas ou dividindo pequenas reservas, que não comportam atividades econômicas nem permitem a manutenção de sua cultura.

Em novembro de 2007, o Ministério Público Federal (MPF) assinou um termo de ajustamento de conduta (TAC) com a Fundação Nacional do Índio (Funai), estabelecendo o prazo de junho de 2009 para a publicação dos estudos antropológicos que definiriam quais as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas em Mato Grosso do Sul. A partir de então, iniciou-se uma batalha judicial para impedir os estudos e posterior demarcação.
Sem ter para onde ir, milhares de indígenas de diversas etnias transformaram a beira de rodovias em moradia permanente, com todos os riscos inerentes a esta situação. Sobrevivem apenas com a cesta básica da Funai e seguem um roteiro de morte anunciada, quer pelos efeitos da precariedade das condições de vida, quer pela violência direta. Por trás da violação dos direitos humanos dos indígenas, está o conflito fundiário.

Atropelamento – É nesse contexto que ocorre a morte de Sidney. Ele foi atropelado por dois ônibus na BR-463, próximo ao acampamento em que vivia, na região do Curral do Arame, a 7 km de Dourados, cidade que fica no sul do estado, a 230 km de Campo Grande. Ele andava a pé pela estrada quando um primeiro ônibus o atingiu, jogando-o na pista. Um segundo ônibus, então, passou por cima dele, arrastando-o e dilacerando o corpo.

Ironicamente, Sidnei morreu do mesmo modo que seu pai, o líder Kaiowá Hilário Cário de Souza, atropelado em dezembro de 1999, nas terras reivindicadas pelo grupo indígena como Tekohá Jukeri’y, pertencentes atualmente à fazenda Serrano.

Expulsos das terras em que viviam em 1999, os indígenas montaram acampamento próximo dali, na BR-463, onde permanecem desde então. Houve duas tentativas de retomada da área, ambas frustradas, sempre com o retorno ao acampamento, no qual cerca de 60 famílias sobrevivem hoje em precárias condições. Não há água potável, nem qualquer fonte de alimento. Eles dependem unicamente das cestas básicas fornecidas pela Funai. O governo do estado não presta assistência a índios acampados.

Em setembro de 2009, a comunidade sofreu um ataque a tiros. Barracos foram queimados, dois indígenas saíram feridos, um deles com 62 anos, atingido por um tiro na perna. Os indígenas recorreram ao Ministério Público Federal, acusando a empresa Gaspem, que fazia a segurança da fazenda, pelo ataque. Inquérito aberto na Polícia Federal apura a autoria.

 

 

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