Indígenas Pataxó expõem situação caótica na saúde indígena na Bahia

Segundo eles, terras indígenas na região não têm nenhum posto de saúde ou atendimento médico. O grupo exige atuação urgente da Sesai

Por Maíra Heinen
Assessoria de Comunicação –  Cimi

Crianças morrendo por verminoses, idosos por hipertensão, grávidas perdendo seus bebês ou morrendo em trabalho de parto. Situações como estas foram relatadas pelos pataxó, ontem (23), durante reunião com o secretário Nacional de Saúde Indígena, Antônio Alves, no Ministério da Saúde, em Brasília. A comissão de lideranças indígenas do sul da Bahia veio exigir que o quadro de atendimento à saúde indígena mude o mais rápido possível na região. As consequências do mau atendimento são arrasadoras.

Antônio Alves iniciou a audiência apresentando o quadro situacional que pegou ao se tornar secretário em outubro do ano passado. Segundo ele, a transição do atendimento à saúde indígena da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) acontece até abril e até lá, a Fundação ainda tem obrigações a cumprir para com os indígenas, até pela falta de orçamento da Secretaria neste início de ano. Porém, de acordo com Alves, isso não vem acontecendo.

Ele ressaltou que o quadro de saúde em áreas indígenas em todo o Brasil é caótico e dramático e que a Funasa, ao invés de ajudar, vem fomentando movimentos contra a nova Secretaria. “Há aldeias que não recebem visitas de equipes de saúde há vários meses, servidores contratados precariamente, sem garantia de continuidade do serviço; faltam médicos, o saneamento está sucateado”. Ele lembrou também as condições dos indígenas Xavante e dos que vivem no Vale do Javari, que estão morrendo por falta de assistência e por precariedade em estruturas de saneamento básico. Para a Bahia, o secretário afirmou que deve construir um plano de intervenção, pois sabe que a falta de ações efetivas e indefinições no governo afetam muito mais os povos indígenas.


Realidades cruéis

Várias lideranças fizeram relatos de suas realidades, citando perdas de parentes por falta de carros e de atendimentos de urgência. Aruã Pataxó lembrou que nenhuma terra indígena no Sul da Bahia tem atendimento médico ou posto de saúde. Também informou que dos 16 carros destinados a atendimento, 14 estavam quebrados e os dois que sobraram são para atender cerca de 15 mil índios. “Queremos que o senhor dê encaminhamento às ações de saúde o mais urgente possível. O senhor explicou o quadro caótico, mas nós na base é que sentimos na pele as consequências. A doença não espera que o medicamento chegue ou que o governo tome decisões”, afirmou o cacique.
Na maioria dos depoimentos indígenas, falou-se na exoneração do responsável pelo Dsei da Bahia, Jorge Araújo. “Isso já foi muito discutido. Nós não queremos esse homem no Dsei, porque ele compra pessoas, fica fazendo acordos”, disse Aruã. Valmir Pataxó, que é conselheiro local de saúde, também pediu a saída do superintendente. “Jorge promete o que não pode dar e quer subornar lideranças! A Sesai precisa tomar providências urgentes. Até quando vamos esperar?”.

Aratikum Pataxó afirmou que o governo só não toma providências porque seus integrantes têm, juntamente com suas famílias, atendimento diferenciado na saúde. “Se algum governante passasse 24 horas numa aldeia ia perceber o que a gente passa. O Brasil está se desenvolvendo apenas para alguns: é avançado para grandes empresários e políticos, mas nós não passamos de pobres, miseráveis!”, ressaltou.

Muitos indígenas lembraram que são 511 anos de história vergonhosa e que a história vem se repetindo em pleno século XXI. “Será que o diretor da Funasa teria coragem de tomar a água contaminada que a gente bebe?” questionou Aratikum. “Nós queremos uma mudança real na saúde, pois o governo não criou a secretaria só para criar cargos, mas para apresentar serviços de qualidade”, finalizou.

Encaminhamentos

Muitas ações que deverão ser tomadas ainda dependem do decreto de orçamento da União, que deve ser publicado até o final da próxima semana, como ressaltou o secretário de saúde. O montante para a saúde indígena deverá ser de 640 milhões. Segundo Alves, a partir desta aprovação orçamentária, poderá ser criado o pólo base de Itamaraju, mas até a sexta-feira (25) será definida uma data para que um representante da secretaria vá à Bahia, veja um imóvel na região que possa ser a sede do pólo. A secretaria também deverá mapear a região e definir, juntamente com os indígenas, o melhor local para se construir uma Casa de Saúde Indígena (Casai). Sobre a falta de veículos, a Sesai explicou que existem oito veículos parados esperando emplacamento no pátio da Funasa, em Salvador. O secretário se prontificou a ligar para o governador da Bahia para liberar os emplacamentos o mais rápido possível. Além dos oito, ainda há quatro veículos para serem entregues ao Dsei da Bahia e também veículos a serem consertados para voltarem a trabalhar, o que deverá acontecer após a liberação do orçamento.

Na reunião foi solicitado que Luzia Pataxó, indígena técnica de enfermagem que acompanhava a reunião, fosse cedida da prefeitura de Porto Seguro (onde é servidora), para a Sesai, a fim de que ajude no atendimento de seus parentes indígenas. Antônio Alves assegurou que o pedido será feito à prefeitura de Porto Seguro ainda nesta quinta-feira.

Outras orientações foram tomadas, como a realização de um seminário sobre a saúde indígena na Bahia (ainda sem data provável), a atuação do projeto de saúde bucal “Brasil Sorridente” nas aldeias da Bahia, campanhas sobre saúde mental e contra o uso de drogas, entre outras. Ao final da reunião, Antônio Alves afirmou que até segunda-feira terá um nome para ser interventor no Dsei da Bahia e que Jorge Araújo deverá sair, se esta é a vontade dos povos indígenas da região.

Depois de quatro horas de reunião, os indígenas saíram satisfeitos e declararam: “Secretário, estamos dando a você um voto de confiança porque temos esperança que a situação pode mudar!”. E a saúde não pode aguardar muito.

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