”O produtor rural só vai conseguir vender a sua produção se tiver o licenciamento ambiental da sua propriedade”, diz procurador do MPF-PA

O mercado está fechando as portas para a carne produzida de forma ilegal na Amazônia.  Nessa semana o Ministério Público Federal (MPF) e o Governo do Pará deram mais um passo importante para regularizar a produção pecuária no estado do Pará, ao se comprometerem que nenhum município, até junho, comercializará carne sem o cadastro ambiental e rural de suas propriedades. A reportagem e a entrevista é de Aldrey Riechel e publicada por Amazonia.org.br, 07-02-2011.

Mesmo com a assinatura do governador Simão Jatene se comprometendo em colaborar com a redução do desmatamento e o fim da pecuária ilegal, cabe a cada prefeito do Pará assinar o pacto, caso contrário, as propriedades que não tiverem o cadastro ambiental rural ou estiverem em processo de aquisição não poderão comercializar seus produtos.

Inicialmente o pacto poderia ser assinado até o dia 1º de fevereiro, mas levantamentos feitos pelo MPF apontaram que a Secretária de Meio Ambiente do Estado não tinha estrutura suficiente para receber todos os licenciamentos no prazo, e os cadastros ambientais que foram feitos ainda não foram validados.  Dessa forma o prazo foi estendido, sem uma data para encerrar.

Segundo o procurador da república, Daniel Azeredo, o ponto principal do pacto “é zerar o desmatamento.  E pra zerar o desmatamento precisa desse cadastro ambiental rural e do compromisso dos municípios junto com os produtores”.  Ele relata que até o momento nenhum prefeito expressou que não assinará o pacto, e os que ainda não o fizeram foi por terem dúvidas sobre o processo.

Compromissos

Os municípios que assinaram garantiram às fazendas dentro de seus territórios mais tempo para providenciar a Licença: até agosto de 2011 para propriedades maiores que 3 mil hectares, até dezembro de 2011 para as que têm entre 500 e 3 mil hectares e até junho de 2012 para as menores que 500 hectares.

O pacto estabelece que só terão direito à prorrogação de prazos os proprietários rurais de municípios em que pelo menos 80% do território relativo a imóveis rurais privados e posses tiver sido registrado no cadastro ambiental rural até 30 de junho deste ano.

Outro ponto do pacto determina que a prorrogação vale apenas para municípios que não estejam inclusos na lista dos maiores desmatadores da Amazônia, elaborada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ou que deixem de fazer parte dessa lista dentro de um ano.  O Ibama considera grande desmatador o município em que houver mais de 40 km² de desmatamento por ano. Eis a entrevista.

Até o momento, quantos prefeitos assinaram o pacto?

Estamos tendo assinaturas diárias.  O número mais recente é de 35 municípios.  Também as federações assinaram, tanto a Federação dos Produtores Rurais, a FAEPA [Federação da Agricultura e Pecuária do Pará], quanto a federação dos municípios FAMEP [Federação das Associações de Municípios do Estado do Pará].  A partir do momento que as duas federações assinaram, nessa segunda (31), a gente acredita que o número de municípios que vão aderir ao termo de compromisso vai aumentar durante o mês de fevereiro.

Mas o prazo final para os municípios assinarem não era dia 1º de fevereiro?

O que acontece com esse prazo?  É que pelo compromisso com os frigoríficos, o frigorífico só pode comprar de produtor rural com licença ambiental.  Para os municípios que estão entrando nesse novo termo de compromisso, esse prazo, do licenciamento ambiental, está sendo prorrogado.  Até porque a gente fez alguns levantamentos e alguns estudos e verificou que a Secretaria de Meio Ambiente do Estado não tem estrutura suficiente para receber esse licenciamento.  Então os cadastros ambientais que foram feitos, não foram ainda validados.

A partir de segunda-feira, o produtor rural de município que não assinou só vai conseguir vender a sua produção se estiver com o licenciamento ambiental da sua propriedade.  De qualquer forma, o município pode ainda, em qualquer momento, aderir ao termo de compromisso, e aí o produtor rural volta a poder comercializar sua produção sem ter a licença ambiental, ou melhor, tendo o compromisso de obter a sua licença ambiental, mas com um prazo maior.

Teve algum município, em especial, que ainda não assinou e que justificou o motivo por não ter assinado?

Não houve nenhum município que se recusou a assinar.  Eu tive uma reunião ontem (3) com o prefeito de Novo Repartimento, que é um município que está na lista dos que mais desmatam, e ele está disposto a assinar, mas quer que a assinatura seja precedida de uma audiência pública no município.  Então eu me comprometi com ele a realizar o evento, no final do mês, começo do próximo mês, e ele vai partir pro trabalho, até porque ele quer buscar o apoio do setor produtivo.  A gente tem entendido que não é o prefeito sozinho que vai fazer esse trabalho, tem que achar um consenso no setor.  Então alguns municípios estão fazendo esse tipo de solicitação, mas negativa expressa, dizer que não assina ou que não há vontade de fazer, a gente não recebeu de nenhum município.

Uma das metas desse pacto, a partir do momento que ele assina, é que o município saia dessa lista dos maiores desmatadores da Amazônia…

É!  Um dos pontos principais é zerar o desmatamento, é esse o objetivo que a gente quer alcançar em primeiro lugar.  E pra zerar o desmatamento precisa desse cadastro ambiental rural e do compromisso dos municípios junto com os produtores.

E o Pará é um dos Estados que mais enfrenta problemas com a pecuária e quase sempre é um dos que mais desmata a Amazônia.  Acha que será possível chegar ao desmatamento zero?

Desde que esse trabalho iniciou, nós estamos com o menor desmatamento da história.  Esse trabalho começou em 2009, e foi o que, pela primeira vez, o desmatamento ficou abaixo dos 10 mil quilômetros quadrados.  No ano seguinte, 2010, que terminou agora, a gente conseguiu manter esse desmatamento, inclusive foi abaixo do menor da história, alcançando um novo recorde.  Então acho que estamos no caminho certo, mas é claro que precisamos trabalhar muito para zerar, para realmente chegar a um número do desmatamento que possa ser próximo do zero.  Mas os resultados de queda de desmatamento já são significativos.

E será possível que a pecuária continue sendo viável economicamente?

É possível, a pecuária é uma das atividades que mais pode crescer em produtividade.  Por exemplo, algumas fazendas produzem 0,8 animais por hectares, mas outras produzem 7 animais por hectares.  Então com medidas de conscientização, com medidas de investimento em tecnologia, é possível sim se produzir mais e reduzir áreas de florestas desmatadas para a expansão da atividade pecuária, que é importante para o Estado.

Qual o próximo passo do MPF nesta campanha?

Agora é continuar trabalhando. Temos ainda que resolver algumas pendências para que haja a adesão de todos os municípios do Estado do Pará, ou pelo menos de todos os municípios que a pecuária é a atividade econômica preponderante.  Vamos fazer algumas reuniões para tentar esclarecer alguns pontos, que ainda podem estar sendo poucos compreendidos e o próximo passo é auxiliar os municípios no cumprimento das metas que foram estabelecidas.  O Ministério Público Federal não vai ficar no papel passivo de agente fiscalizador apenas, mas a nossa ideia é trabalhar junto, em parceria com o município, para dar apoio e estrutura para que o trabalho realmente aconteça.

Haverá apoio financeiro para esse projeto?  Durante o período de inscrição, alguns municípios reclamaram que fazer o cadastro rural, que depende de um georreferenciamento, era caro e que não tinham como arcar com todas as despesas…

O cadastro ambiental hoje está gratuito, o produtor rural faz a inscrição na Sema, sem pagamento de qualquer tipo de taxa.  Há um custo de mobilização de pessoal, mas o governo do Estado do Pará tem se colocado a disposição para assumir grande parte desse custo.  Isso é um compromisso pessoal do governador, que deixou bem claro no discurso de assinatura, que essa é uma meta de governo, e já sinalizou em assumir algumas obrigações.  Por exemplo, já está lá no termo que o governo vai fazer o monitoramento do desmatamento, que antes estava sendo colocado aos municípios.

O que a gente tem tentado colocar para os prefeitos é o fato que o dinheiro que está sendo gasto nesse processo ambiental não é gasto, é um investimento.  Até porque municípios como Paragominas, que investiram dessa forma, hoje estão tendo uma arrecadação de investimentos, de tributos, que chega a alcançar, segundo as palavras do próprio prefeito em reunião, o dobro ou o triplo do que foi investido nesse trabalho.  De qualquer forma, se sinalizarem que pode haver dificuldade de recursos, o governo está disposto de entrar com uma parte nesses investimentos.

http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=40467

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