O Código Florestal e o novo Congresso

Doutor em antropologia pela Universidade de Brasília (UnB), assessor político do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

Na semana passada, o Congresso Nacional retomou suas atividades legislativas e o Código Florestal está entre as prioridades das prioridades da Casa. O embate pelo Código Florestal Brasileiro (CFB) promete ser duro no primeiro semestre deste ano. Se mantido o disposto no Decreto nº 7.029, publicado em 11 de dezembro de 2009, os produtores rurais têm até 11 de junho para atender a exigência de averbação da reserva legal de suas terras. Isso certamente vai elevar a temperatura do lado da bancada ruralista, que deverá pegar pesado na defesa dos seus interesses.

Na nossa avaliação, o substitutivo ao PL nº 1.876/1999 aprovado na Comissão Especial do CFB da Câmara dos Deputados está baseado numa premissa errônea: a de que o desenvolvimento da agricultura brasileira depende fundamentalmente da expansão das fronteiras agrícolas.

Ilude-se quem crê que a reformulação do CFB proposta pelo substitutivo beneficiará o conjunto das pessoas e famílias que dependem da agricultura. Ela é pautada por interesses unilaterais do empresariado rural que controla a dinâmica produtiva rural brasileira, nitidamente voltada para o agronegócio nacional e para o mercado externo. O mesmo setor que, segundo estudo divulgado recentemente pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), chega fortalecido ao Congresso Nacional em 2011.

Se aprovado, o substitutivo deverá propiciar aumento considerável na substituição de áreas naturais por áreas agrícolas, em muitos casos em locais extremamente sensíveis, como são as áreas alagadas, a vegetação ciliar ou ripária de rios, riachos, lagos, lagoas e banhados, os topos de morros e as áreas com alta declividade (encostas).

Promoverá o aceleramento da ocupação de áreas de risco em inúmeras cidades brasileiras, bem como a impunidade devido à anistia proposta àqueles que desrespeitaram a legislação ambiental até meados de 2008.

Haverá mais degradação ambiental no meio rural e urbano, com decréscimo e fragmentação acentuada da biodiversidade; aumento das emissões de carbono para a atmosfera; e aumento das perdas de solo por erosão, com consequente assoreamento de rios e córregos. Conjugadas, as consequências promoverão perdas irreparáveis em serviços ambientais, das quais a própria agricultura e a qualidade de vida das famílias rurais dependem sobremaneira, especialmente no caso da agricultura familiar que está se incorporando à revolução agroecológica.

A isso soma-se o aumento da vulnerabilidade e do risco de desastres naturais ligados a deslizamentos de encostas, estiagens prolongadas, aumento da ocorrência de inundações e enchentes nas cidades e áreas rurais. Eventos dessa natureza nas regiões Norte e Nordeste, no último ano, são um bom indicador do que nos espera num futuro próximo, caso a degradação ambiental avance, respaldada pelas mudanças legais e administrativas propostas no substitutivo do deputado Rebelo.

Os territórios indígenas, as unidades de conservação e outras áreas protegidas certamente serão ainda mais pressionadas. Além da maior dificuldade para seu reconhecimento legal e implantação, o que já vem acontecendo, haverá uma maior pressão sobre os recursos naturais aí existentes.

Os últimos três anos foram marcados pela batalha em gangorra entre ruralistas e ambientalistas, no Congresso Nacional, no Executivo, no Judiciário, na mídia e outros fóruns, entre aumentar a produção e manter a conservação. É necessário sair dessa gangorra, garantindo a possibilidade de crescimento da produtividade sem que isso implique agravamento do quadro de degradação ambiental existente no país.

O anúncio da divulgação para breve de um documento preparado pelas duas principais instituições científicas do país, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) poderá ajudar e muito para esclarecer vários pontos do debate. Entendemos que o referido documento será crucial para que instituições representativas da sociedade civil tenham acesso a uma base sólida de conhecimento para embasar seu esforço mobilizador e de capilaridade para tratar do assunto no Congresso Nacional que inicia nesta semana nova legislatura.

https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/2/7/o-codigo-florestal-e-o-novo-congresso

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