Aos militantes do MST e Via Campesina

Inês Rosa Bueno*

Sonho em ver o fortalecimento da Via Campesina e a aproximação dos movimentos que lutam pela terra e seus recursos e os índios caminhando lado a lado nesta luta. Abaixo, escrevi resposta a publicação mais uma vez mentirosa, com comentários mentirosos, no jornal Olhar Direto, sob titulo, “Jaime Campos diz que conflito em Suiá Missú e questão de Estado”, visando essencialmente esclarecer pessoas que de fato trabalham na terra sobre a verdadeira manipulação que se deu neste processo de terras indígenas (xavantes) de Marãwaitsédé, para fazer parecer que se tratava de uma luta entre posseiros e índios, o que jamais foi verdade. Esta luta é simbólica. Marãwaitsédé ocupa parte do território do que já foi o maior latifúndio do mundo que é a fazenda Suiá Missú, da multinacional italiana Agip Petroli. Essa fazenda jamais foi produtiva:

Em resposta a uma série de calúnias sobre minha perícia:

Em minha experiência profissional, trabalhei com povos indígenas, quilombolas, e posseiros sem terra e assentados. Tenho profunda simpatia por todos aqueles que lutam pelo seu direito ao trabalho no campo, a viver da terra. No entanto, o que houve em Marãwaitsédé não foi isso. Depois da desintrusão, como eu sempre afirmei, ficou claro que o número de posseiros ali era de menos de quatrocentas pessoas e que havia ali grandes latifundiários com outras terras na região. Mesmo aqui, nas postagens e artigos publicados neste “Olhar Direto”, há inúmeras distorções, inverdades, para confundir as pessoas que não têm acesso a outras fontes de informação, nem sabem o que é o trabalho de identificação e o que foi o meu trabalho, de perícia antropológica, uma outra coisa, e que não implica em fazer perícia topográfica, pois não sou topógrafa.

Foram feitos um estudo de identificação, duas perícias antropológicas e uma perícia fundiária, onde o engenheiro realiza os estudos topográficos, entre outras coisas, como avaliação dos custos de reflorestamento da área que foi desmatada ilegalmente. Todos esses quatro estudos, pagos pelo Estado brasileiro e seus contribuintes por caprichos de latifundiários e de uma multinacional, chegam ás mesmas conclusões sobre o território de Marãwaitsédé e toda a cruel história por que passou esse grupo de xavantes. Outra mentira é dizer que eu não estive na área, assim como dizer que eu afirmei isso, como mente mais uma vez o advogado Luís Alfredo Feresin de Abreu. Por essas e muitas outras calúnias sobre meu trabalho e minha pessoa, além de assédio em meu próprio e-mail onde se apresentou como amigo de meu ex-orientador na USP, estou entrando com processo por danos morais contra este profissional, que exerce suas funções de modo a prejudicar pessoas e o exercício da lei.

Fico triste sempre que vejo o nível de desinformação e manipulação que circula nessa região do Brasil e como isso tem altos custos para o Estado brasileiro e toda a população brasileira que paga por isso com seus impostos. Esse estado, neste processo, teve três governadores que cometeram graves crimes: O primeiro, vendeu ilegalmente terras indígenas. Isso é Constituição e nenhum governador se sobrepõe a uma Constituição e a definição do que era considerado terra indígena já existia desde 1932, na nossa Constituição. E quando o relatório de identificação foi entregue em 9 de abril de 1992, não havia absolutamente nada naquelas terras, de propriedade de uma multinacional italiana que mantinha ali menos de cinquenta funcionários, em outras partes da fazenda, não nesta identificada onde nada havia, em regime de semi-escravidão e humilhação constante.

O segundo governador a cometer crime foi o que participou, junto com a gerência da fazenda da multinacional italiana e com latifundiários e políticos da região, dos planos de invasão das terras em 20 de junho de 1992, quase três meses após a identificação da área xavante. Os Xavante, como sabemos, foram retirados dali contra sua vontade, ilegalmente, durante a ditadura, em 1966, pelas Forças Aéreas Brasileiras e colocados em área onde já ocorria uma epidemia de sarampo que matou um terço dos transferidos em duas semanas. Portanto, sádicos planos desses senhores de impedir a volta dos índios para a terra que jamais tinha sido utilizada, e que servia apenas de pretexto para desvio de Caixa 2 da multinacional italiana. Todos os que entraram ali em 20 de junho de 1992 sabiam que estavam entrando em terra indígena e que o faziam por motivos racistas, para impedir que finalmente os índios tivessem seus direitos garantidos porque simplesmente, como dizem, não gostam de índios.

Terceiro governador criminoso: o atual governador que propôs a transferência de quase dois mil xavantes do sub-grupo xavante de Marãwaitsédé para uma área proposta para permuta que na verdade faz parte do território já reconhecido como território dos índios Javaé e Karajá. É lamentável que os recursos públicos tenham que ser utilizados com todos esses crimes e fraudes, ao invés de atender necessidades urgentes da população do estado e do país.

Lamentável. Espero e lutarei para que esses e muitos outros crimes neste processo sejam punidos, porque também os danos morais que sofri não foram pequenos.

*Inês Rosa Bueno – perita antropológica do processo de Marãwaitsédé.

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