Com salário menor e pressão por produtividade, trabalhadores sem carteira são entre 80% e 90% dos acidentados no Brasil
Por Ana Paula Pedrosa e Queila Ariadne, em O Tempo
O primeiro fator de risco de um trabalho pode estar em um detalhe do contrato: quem assina a carteira do trabalhador. Aquele que é contratado diretamente tem um risco muito menor de se acidentar do que a pessoa que presta serviço de forma terceirizada. E esse cenário pode piorar, caso o Senado aprove o projeto que libera a terceirização em qualquer atividade da empresa – hoje, não é permitido terceirizar a atividade-fim. As novas regras já foram aprovadas na Câmara dos Deputados.
De acordo com levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), entre 80% e 90% dos acidentes acontecem entre os terceirizados. “A liberação da terceirização vai abrir caminho para agravar essa situação. Se o projeto for aprovado, vamos ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) para impedir que isso aconteça”, afirma o vice-presidente da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho do Ministério Público do Trabalho (MPT), João Batista Machado Júnior.
Entre 1999 e meados de abril de 2015, 117 eletricitários a serviço da Cemig perderam a vida em acidentes de trabalho. Em média, o setor contabiliza uma morte a cada 45 dias, sendo que 82% delas acontecem entre os terceirizados. Os dados são do Sindicato dos Eletricitários de Minas Gerais (Sindieletro-MG).
Na construção civil foram 30 mortes em Minas Gerais no ano passado, 90% delas entre trabalhadores terceirizados, diz o diretor do Marreta, sindicato que representa os trabalhadores, Vilson Valdez da Silva. Soterramentos, quedas e choques elétricos são os casos mais comuns.
Já entre os petroleiros, foram dez mortes no primeiro trimestre de 2015 em todo o país, sendo oito de terceirizados. O diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Leopoldino Ferreira de Paula Martins, diz que os terceirizados não trabalham diretamente na operação, apenas no setor de manutenção. Mesmo assim, já são 360 mil na Petrobras, frente a 85 mil empregados próprios. “Se o projeto passar, eles vão ocupar espaço na operação também, e a situação vai piorar muito”, alerta.
Tratamento Desigual. No setor elétrico já aconteceram dois óbitos em Minas, neste ano, ambos entre os terceirizados. “Esses trabalhadores têm um treinamento e uma remuneração menores, e mais pressão por produtividade. Essa fórmula resulta em acidentes”, diz o coordenador geral do Sindieletro-MG, Jairo Nogueira Filho.
De acordo com ele, um profissional contratado pela Cemig recebe quatro meses de treinamento antes de iniciar o trabalho e tem suas atividades supervisionadas durante um ano. Já quem é contratado por uma empresa que presta serviço à estatal tem apenas 15 dias de treinamento antes de ser mandado a campo sem supervisão alguma.
Esses terceirizados também têm um salário 66% menor do que os funcionários próprios e recebem um adicional por produtividade, o que os leva a praticar jornadas diárias de até 12 horas para tentar aumentar o orçamento. A Cemig foi procurada por telefone e e-mail, mas não comentou o assunto.
–
Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.