Um local de prisão e tortura. Assim quatro pessoas que foram presas por motivos políticos, entre 1969 e 1971, se referiram às dependências do antigo 12º Regimento de Infantaria, em Belo Horizonte. Ontem (30), os ex-presos Carlos Antonio Melgaço Valadares, Gildásio Cosenza, Gilse Cosenza e Emely Vieira Salazar acompanharam a diligência da Comissão Nacional da Verdade (CNV) ao local, da qual participaram também peritos e integrantes da Comissão da Verdade de Minas Gerais (Covemg).
O 12º Regimento de Infantaria é uma das sete instalações militares descritas como lugar de práticas de tortura, em relatório preliminar de pesquisa da CNV, em fevereiro deste ano. O relatório motivou solicitação da CNV para que as Forças Armadas instalassem sindicâncias para apurar desvio de finalidade do uso de suas instalações, durante a ditadura militar.
Em junho, as Forças Armadas encerraram a investigação, concluindo que não havia provas de desvio, o que motivou novo posicionamento da CNV. No último dia 19, o ministro da Defesa, Celso Amorim, enviou ofício à comissão, no qual diz que o Estado já reconheceu a prática de tortura. O posicionamento gerou manifestação por parte da comissão, que o considerou “positivo, mas insuficiente”, segundo o coordenador da CNV, Pedro Dallari, e também de militares da reserva, que por meio de um manifesto negaram qualquer ofensa à dignidade humana e pediram que o ministro se desculpasse pelas afirmações.
Na tarde de ontem, Pedro Dallari disse que a diligência feita a Minas Gerais também seguirá para as outras instalações apontadas naquele relatório, “em relação às quais, o Estado brasileiro não só reconheceu a ocorrência de graves violações como paga indenização às vítimas ou seus familiares. Portanto, são sete localidades nas quais não há mais questionamentos sobre essas graves violações”.
Ele reforçou a necessidade de “haver o reconhecimento do que houve” durante a ditadura. Segundo Dallari, “trata-se do objetivo que foi colocado para a Comissão da Verdade, na lei que a instituiu, que é o objetivo da reconciliação, que é o objetivo de que nunca mais esses eventos voltem a acontecer”.
Dallari participou do reconhecimento da instalação militar e também da coleta de depoimentos, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil, em Minas Gerais. Dos nove convocados pela comissão, uma pessoa já faleceu e quatro não compareceram. Assim, a comissão pôde coletar os depoimentos do ex-militar Paulo Rubens Pereira Diniz – que pediu para depor -, do advogado Jacob Lopes de Castro Máximo, do tenente-coronel reformado Jair Arvelos Rosa – que atuou no 12º Regimento – e do médico legista aposentado João Bosco Nacif da Silva.
João Bosco foi inquirido sobre o laudo de João Lucas Alves, militante do Comando de Libertação Nacional (Colina). Bosco trabalhava na Polícia Civil quando assinou, em 1969, laudo médico da necrópsia no corpo de João Lucas Alves, e apontou que ele morreu por asfixia. Ele negou que a causa da morte tenha sido tortura e estrangulamento, e disse que o caso já foi abordado pelo Conselho Regional de Medicina. “Não é possível afirmar que foi em decorrência da tortura”, disse.
Já Diniz disse que os militares receberam ordens para atirar morteiros em uma praça na qual pessoas protestavam contra a deposição do então governador, Mauro Borges, em Goiânia, que acabou renunciando, o que levou à suspensão da ação.
Durante a sessão, a coordenadora da Comissão da Verdade de Minas Gerais, Maria Celina Pinto Albano, disse que “é difícil, muitas vezes é muito doloroso, mas nós estamos desvendando, descobrindo e mostrando o que realmente aconteceu nesse período da nossa história”.
Edição: Stênio Ribeiro.