Área atingida pela lama da barragem se transforma em deserto infértil

Por Ana Lucia Azevedo, em O Globo

Terra arrasada não descreve com exatidão o que acontece com as áreas cobertas por uma onda de rejeitos, como a que atingiu distritos de Mariana. A camada de lama que pode chegar a três metros de altura não se solidifica por igual e pode permanecer por muitos meses instável e perigosa demais para ser removida, segundo especialistas da Coppe/UFRJ. Como é composta basicamente por restos de minério, ela é estéril e sufoca o solo fértil que cobre. Nada cresce, nada vive.

Desgraça ambiental, a lama, porém, não oferece risco de contaminação para a saúde humana. O diretor da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto, o geólogo Issamu Endo, diz que não há perigo de contaminação por metais pesados ou soda cáustica, usados em outras formas de extração:

— A extração da hematita, o minério de ferro, é feita basicamente com água. É diferente da do ouro, por exemplo, que usa mercúrio, letal para o homem.

A extração de bauxita para a produção de alumínio é outra altamente tóxica para o ser humano e os animais, pois emprega soda cáustica. Embora muitas pessoas tenham relatado um intenso mau cheiro nas áreas atingidas, o especialista diz que ele não está relacionado ao uso de soda cáustica nessa forma de mineração.

— O que pode acontecer são alergias, lesões causadas pela exposição prolongada de vítimas presas e ainda não resgatadas. Mas são lesões mecânicas, não se trata de intoxicação por metais pesados — diz Endo.

O professor titular de geotecnia da Coppe/UFRJ Márcio Almeida observa que os resíduos são de fato malcheirosos e oferecem risco para o meio ambiente. Na barragem há água e quartzo em forma de areia. Mas esse material é depositado por anos e ao escapar para o ambiente se mistura a outros contaminantes.

— Essa lama é estéril. Não há o que possa crescer nela. A natureza, se deixada por si só, levará muitos e muitos anos para se recuperar. Por isso, tem que ser removida — frisa Almeida.

Almeida acrescenta que o processo de remoção é lento e arriscado:

— É impossível pisar nela sem afundar. Oferece risco de vida para as equipes de resgate, se não estiver completamente estabilizada. A camada superficial pode parecer sólida. Mas embaixo tudo está viscoso. Ela pode engolir facilmente uma máquina grande como um retroescavadeira.

Especialistas dizem ser impossível precisar neste momento o tempo que levará até que a remoção possa começar.

— Não menos que muitos meses. Talvez mais que um ano. E custará, certamente, rios de dinheiro. É um trabalho lento, perigoso pela instabilidade do terreno e caro — diz Almeida.

O professor de geotecnia Maurício Ehrlich acrescenta que, ao secar primeiro, a camada superficial da lama forma uma casca dura, que bloqueia parcialmente a evaporação da água e atrasa a solidificação das camadas profundas, sem o qual não se pode trabalhar em segurança.

Foto: Corpo de Bombeiros

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