Presidente da Funai na fronteira com o Paraguai, por Egon Heck

Egon Heck/Cimi. Texto e Foto

Não é por acaso ou fortuitamente que o novo presidente da Funai, João Pedro, do PT do Amazonas, vem ao Mato Grosso do Sul, logo no início de sua gestão. Com dois meses no cargo teve seu primeiro embate com uma delegação indígena.  Os Pataxó, em cujo território iniciou a invasão do até então desconhecido continente, Ameríndia. Depois de mais de 500 anos de resistência, não mais acreditam em promessas ou falas enganosas feitas pelos neocolonizadores e exterminadores dos povos originários.

Mas seus representantes continuam insistindo e jurando que estão bem intencionados, mesmo repetindo as velhas mazelas de tutores com ares de superioridade.

Por que vem correndo até o Mato Grosso do Sul? Para resolver o gravíssimo problema da demarcação das terras indígenas ou para socorrer a Biafra brasileira como é conhecida a região de pior violência e negação dos direitos indígenas? Se nos governos Lula e Dilma tivessem demonstrado vontade política em resolver o problema, que sabidamente não é fácil, mas absolutamente factível, certamente os povos indígenas da região, especialmente os Kaiowá Guarani e os Terena, não continuariam vendo suas lideranças diariamente ameaçadas e assassinadas.

Mas por que então João Pedro vem à região?  Será por que as Olimpíadas vêm aí e a imagem do país mão pode estar manchada ou conspurcada por ações ao arrepio da lei e dos direitos, violando a Constituição?

Uma coisa é certa. Não é por falta de conhecimento da realidade que se está deixando de agir em favor da vida dos povos indígenas da região e do país. Pilhas de relatórios e documentos devem estar entulhando as gavetas dos senhores dos três poderes. É obstinação em não cumprir a lei em favor dos historicamente oprimidos e rejeitados povos originários.

A boa vontade ao avesso

Existe boa vontade e disposição para resolver essa situação que envergonha a todos nós cidadãos desse país? Que falem os fatos. A instalação de uma mesa de diálogo foi a única forma encontrada pelo ministro da Justiça para tentar resolver a demarcação da terra indígena Buriti. Depois de dois anos, os fazendeiros deram uma banana ao ministro e um adeus à solução por negociação e diálogo. Quando, no governo Lula, houve um tímido passo para começar a resolver o problema fundiário, sinalizando para a indenização e compra de terras, a Famasul se dispôs a fazer o levantamento das terras que estariam à disposição para serem compradas. Um número ínfimo de proprietários se dispôs a vender as terras. E assim poderíamos levantar inúmeros fatos que sinalizam claramente que o que não se quer é que a Constituição seja cumprida e as terras indígenas sejam demarcadas. Salta à vista que o que prevalece é uma boa vontade às avessas.

CPI contra o Cimi

Diante do quadro desolador e vergonhoso, da violência genocida, da discriminação e racismo, é preciso achar um bode expiatório.  Repete-se a mágica de quase meio século. Realiza-se uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Forjam-se acusações falaciosas, mentiras são plantadas como verdades.

“Em outra vertente, a Assembleia Legislativa deve averiguar denúncias contra o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) que, além de incitar invasões, tem orquestrado o confronto armado, colocando em risco a vida de índios e não índios” (Afirmações da deputada estadual Mara Caseiro, Ponta Porã Digital 7/08/15).

João Pedro em Guaivyri e Ypoi

O presidente da Funai visita duas aldeias onde foram utilizadas as mesmas estratégias de assassinar e ocultar o cadáver como forma de dificultar a elucidação dos crimes. Até hoje o corpo do professor Rolindo Vera, do Ypoí e do cacique Nizio Gomes, do Guayviri, não foram encontrados.

Ao passar pelos acampamentos certamente será impactado pela extrema pobreza e dificuldades em que sobrevivem essas populações. Trata-se de um quadro estarrecedor, radicalmente diferente da maioria dos povos indígenas da Amazônia que pelo menos tem seus territórios demarcados.

É possível que o presidente da Funai saia sensibilizado com a situação daquelas comunidades. Mas é preciso mais do que isto. Este deve enfrentar a burocracia e os interesses políticos e econômicos e empenhar-se para minorar a gravidade da situação.

Aos povos indígenas resta a resistência ativa, no caminho para seus tekohá, suas terras tradicionais. Para isso contam com a solidariedade nacional e internacional, com a força dos Nhanderu e de seus guerreiros.

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