Conferência de Segurança Alimentar de PE destaca povos tradicionais e suas culturas

Eduardo Amorim – Núcleo de Comunicação do Centro Sabiá, na Asa

A Conferência Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Pernambuco se encerra nesta quinta-feira, em Gravatá. Lá, aconteceu o lançamento do Guia Alimentar para a População Brasileira. E está sendo realizada a definição dos conselheiros e conselheiras que participarão da etapa nacional em Brasília.

O conselheiro do Consea-PE e coordenador executivo da ASA Pernambuco, Alexandre Pires, destaca a mesa dos povos tradicionais como um dos momentos mais ricos do encontro. Pescadores artesanais, negros, indígenas, ciganos e povos de terreiro, com representantes da Umbanda e de nações como Angola, Nagô, Yorubá-Nagô e Keto foram convidados para participar das atividades, visibilizando suas questões.

“Quando ocupamos esses espaços, a gente vê que começamos a ser compreendidos na nossa religiosidade. Quando temos acesso ao outro vemos como começam a nos encarar como iguais”, diz a ialorixá Mãe Elza, do Ilé Asé Egbé Awo (Olinda). Ela destaca especialmente as similaridades entre as perspectivas em relação à segurança alimentar e nutricional de povos diversos, como o dela e os indígenas, explicando que é uma tradição centenária a concepção de produzir o que se vai comer nos terreiros e especialmente o respeito à Mãe Natureza.

A sacerdotisa Mãe Verônica, do Centro de Umbanda Luz Divina, em Paulista, município da região metropolitana do Recife, ressalta que os povos de terreiro fazem segurança alimentar há séculos e inclusive os índios já tinham concepções nesse sentido antes dos portugueses chegarem ao Brasil. Para ela, a grande dificuldade na atualidade tem sido encontrar rios sem poluição para realizar os rituais e oferendas, assim como a escassez de peixes no mar e também o risco de extinção de algumas ervas sagradas.

“Nossa primeira solicitação é que o Sisan [Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional] tenha um olhar para dentro dos povos de terreiro”, garante Mãe Elza, ressaltando também a necessidade de discutir o acesso a terra, já que essas comunidades são alvo da especulação imobiliária e precisam de área para cultivar suas plantas e criar os animais. “Não vou comprar uma galinha que passou 20 a 25 dias acordada”, diz ela, ressaltando a concepção deles que é de sempre produzir o que vão comer.

Combate ao preconceito – Mãe Elza sabe que ainda há um longo percurso a percorrer para se acabar com o preconceito existente em relação às comunidades de terreiro e sua forma tradicional de se alimentar. E faz questão de ressaltar que “os povos tradicionais já existiam muito antes da nossa concepção atual de alimentação”.

Nessa luta, ela destaca o papel do acarajé (Jé – comer + Acará – Pão). Hoje, o turista que chega ao Alto da Sé não vai comer um alimento tão saudável, pois as baianas estão sendo obrigadas por normas de vigilância sanitária a fritarem em casa modificando o modo de fazer do alimento tão tradicional da culinária “africano-baiana”.

Ela lembra que na Bahia se fez disso uma bandeira de luta e o acarajé hoje é reconhecido como patrimônio. Lá e aqui, alguns evangélicos passaram a vender o mesmo produto e chamá-lo de Pão de Jesus. No entanto, Mãe Elza acredita que não é justo “querer mudar toda a construção de um povo em torno do alimento considerado sagrado. Eu vim para resistir”, encerra.

Imagem: Da esquerda para a direita, Antonelli, com sua Mãe de Santo, Verônica, Mãe Elza e Marta Almeida, do Movimento Negro Unificado (MNU) | Foto: Arquivo Centro Sabiá

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