Odiar é fácil, qualquer fuinha odeia. Dialogar tem sido para poucos, por Leonardo Sakamoto

No blog do Sakamoto

A esquerda foi para a rua na redemocratização do país e não saiu mais. Não pode se assustar, portanto, que a direita também esteja ocupando o espaço público. Pelo contrário, deveria achar isso saudável.

A histórica ausência de debate político nas ruas, criou alguns problemas. Por exemplo, a incapacidade de muita gente de separar o que é um discurso conservador (que tem suas pautas a respeito do papel do Estado) e os dodóis que, em número insuficiente para organizarem suas próprias manifestações, tentam empurrar um ato de terceiros para o fundo do poço com suas ideias que – não raro – vão contra a dignidade e a legalidade.

Se você acha que não dá para separar esses dois grupos: os conservadores e os dodóis, é porque precisa sair mais à rua.

Isto não é inédito aqui no blog, mas achei que valia o resgate.

No primeiro grupo, colocaria um senhor, muito simpático, com quem travei um rápido diálogo em uma livraria. Ele veio até mim, disse que discordava dos pontos de vista deste blog e travou um debate cordial sobre o papel do Estado no desenvolvimento e sobre algumas liberdades individuais. Foi duro na argumentação mas, ao mesmo tempo, polido. Esperou para ouvir minhas considerações, e educadamente, se despediu.

No segundo, incluiria uma senhora que, no domingo de segundo turno, parou seu carro diante de mim, gritou “Volta pra Cuba!”, seguido de um elogio à minha progenitora, cuspiu em mim e saiu cantando pneu. Sorte que a mira dela era tão boa quanto o seu nível de cultura política.

Quanto mais a esquerda juntar esses dois grupos no mesmo balaio, mais eles vão se aproximar. Sei que PSDB e PT trouxeram muito lixo para perto de si como estratégia eleitoral (burra) e, agora, como diria Antoine de Saint-Exupéry, ambos são responsáveis por aquilo que seus marqueteiros cativaram. Mas eles também não são os demônios – apenas andaram invocando Bettle Juice vezes demais.

Mas nós (de esquerda, principalmente a não partidária) também precisamos fazer essa distinção no dia a dia. Caso contrário, por identidade reativa, jogaremos no colo dos amantes do ódio uma parcela da sociedade que apenas discorda de nós do ponto de vista ideológico.

E é isso o que desejam os dodóis, que insistem em batizar algumas atitudes criminosas de “reivindicações conservadoras”.

A fuinha (Martes foina) é um mamífero carnívoro, que mede entre 40 a 50 cm, com cerca de 25 cm de cauda e pesando entre 1,1 e 2,5 kg. Não está em risco de extinção.
A fuinha (Martes foina) é um mamífero carnívoro, que mede entre 40 a 50 cm, com cerca de 25 cm de cauda e pesando entre 1,1 e 2,5 kg. Não está em risco de extinção.

Pois uma coisa é um pensamento, que merece ser respeitado e, na minha opinião, questionado – quando for o caso – nas arenas de discussões. A outra é gente que acha que a Constituição é papel higiênico e as instituições democráticas – que levamos décadas para reconstruir – são um grande vaso sanitário de onde só exala fedor.

Reivindicações que incluem uma “intervenção militar constitucional” (haha), o bloqueio da transformação do país em uma “ditadura gayzista e feminazi (hahahaha) e uma ação para evitar a “implantação do comunismo” pelo partido que está no poder (kkkkkkkkkk…#morri). Em que país eles vivem?

Li, tempos atrás, um panfleto que dizia que o PT está rompendo com o capital, o que vai colocar o país em uma grave crise. Sério? Para com isso… Dá vergonha alheia! Desde quando o PT ou qualquer partido grande cria entraves para bancos, empreiteiras, empresas de telefonia e demais doadores de campanha?

Se o PT fizesse isso, eu promoveria três dias e três noites de balada open bar lá na casa dos meus pais, no Campo Limpo – porque dá para fechar com lona a garagem, botar umas caixas de som e umas luzes (#quemnunca).

É fundamental que ultraconservadores continuem mostrando sua cara e dizendo quem é. Como já disse aqui em outro texto, você não está cansado de ser xingado por anônimos na internet? Não tem curiosidade de saber quem prega a violência contra minorias? O que comem? Como vivem? Como se acasalam?

Uma das maiores consequências das manifestações de junho de 2013 foi trazer pessoas para ocuparem espaços públicos e darem suas opiniões que, antes, estavam restritas aos espaços privados.

Ruas, praças e avenidas não são apenas rotas de passagem de pedestres e automóveis, mas é onde se faz política e se exerce a cidadania. Que nos dediquemos a fomentar a cultura política e não apenas chamar o outro de inimigo. E, aos dodóis que ultrapassarem os limites democráticos, de forma analógica ou digital, a força da lei.

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