Frentes parlamentares e sociedade civil lançam manifesto contra PEC 215

Documento é assinado por 70 movimentos sociais, organizações da sociedade civil e frentes parlamentares, entre eles o ISA, depois de 48 senadores assinarem um outro manifesto, no final de maio, também contra a proposta

Oswaldo Braga de Souza – ISA

Um conjunto de 70 organizações da sociedade civil, movimentos sociais e frentes parlamentares, entre eles o ISA, divulgaram hoje (11/6), na Câmara, um manifesto contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215. Deputados e líderes indígenas repetiram que estão unidos na luta contra o projeto, que transfere do governo federal para o Congresso a atribuição de oficializar Terras Indígenas, Unidades de Conservação e Territórios Quilombolas. Se aprovada, a PEC vai paralisar de vez a regularização dessas áreas.

“Se aprovada, a PEC 215/2000 resultará em consequências irreversíveis para os povos indígenas e as comunidades quilombolas, considerando que seus territórios são vitais para sua sobrevivência física e cultural, além de contribuírem na preservação de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, no contexto do aquecimento global”, afirma o manifesto (texto abaixo). O manifesto foi elaborado numa plenária ocorrida no dia 20/5, também na Câmara (leia mais).

“Esse documento é prova de que muita gente defende os povos indígenas no Brasil. Nós resistimos, desde 1500. Não conseguiram acabar com a gente. Esse manifesto abre a possibilidade de um diálogo”, afirmou Pierlângela Macuxi, liderança indígena de Roraima. “A classe política tem de entender que essa questão trata de vidas. Quem assina esse manifesto está defendendo a vida dos povos indígenas”, concluiu.

O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) foi otimista ao lembrar que, no final de maio, 48 senadores também assinaram um manifesto contra a PEC, sinalizando que o projeto tem grande chance de ser derrubado no Senado, caso seja aprovado na Câmara (leia mais). “Nós estamos revertendo uma situação de retirada de direitos que parecia já consolidada”, afirmou.

O manifesto é assinado pelas Frentes Parlamentares Ambientalista, em Defesa dos Povos Indígenas e em Defesa dos Direitos Humanos, entre outras.

Ouça também a entrevista do advogado Maurício Guetta, do ISA, sobre o manifesto.

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Manifesto Público contra a PEC 215/2000

Brasília (DF), junho de 2015.

No dia 19 de maio de 2015, na Câmara dos Deputados, organizações e movimentos sociais, indígenas, indigenistas e ambientalistas, junto com as Frentes Parlamentares de Apoio aos Povos Indígenas, em Defesa dos Direitos Humanos e Ambientalista, abaixo assinados, promoveram a Plenária “Ameaças aos direitos fundamentais e a PEC 215: democracia, povos indígenas e meio ambiente”. Como resultado da Plenária, de comum acordo decidiram publicar a seguinte moção de repúdio à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000, em tramitação na Câmara dos Deputados no âmbito de uma comissão especial.

A PEC 215/2000 e seus apensos pretendem paralisar a demarcação de Terras Indígenas, a titulação de Territórios Quilombolas e a criação de Unidades de Conservação, bem como permitir a liberação de grandes empreendimentos dentro dessas áreas protegidas, tais como: hidroelétricas, mineração, agropecuária extensiva, implantação de rodovias, hidrovias, portos e ferrovias.

Se aprovada, a PEC 215/2000 resultará em consequências irreversíveis para os povos indígenas e as comunidades quilombolas, considerando que seus territórios são vitais para sua sobrevivência física e cultural, além de contribuírem na preservação de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, no contexto do aquecimento global.

A PEC 215/2000 é inconstitucional, por ferir cláusulas pétreas relacionadas com o princípio da separação dos poderes e a consagração de direitos fundamentais dos povos indígenas, que enquanto tais ostentam blindagem constitucional e respaldo na normativa internacional.

Diante disso e considerando que:

• a demarcação das Terras Indígenas, a titulação dos Territórios Quilombolas e a criação de Unidades de Conservação da Natureza são atos tipicamente administrativos de caráter estritamente técnico, destinados a implementar direitos constitucionais coletivos conquistados a partir de uma longa e dolorosa jornada de luta e debates no período da Constituinte, em que várias lideranças dos diversos segmentos sociais saíam de seus locais e peregrinavam em Brasília, a fim de discutir e garantir os seus direitos fundamentais, políticos e sociais;

• esses direitos constitucionais coletivos são o resultado do reconhecimento acerca da imprescindibilidade do equilíbrio ecológico para o bem-estar da sociedade e da necessidade de destinar terras aos povos e comunidades que as ocupam tradicionalmente, tanto para garantir sua sobrevivência física e cultural, como para a reparação da dívida histórica do Brasil para com os povos indígenas, povos e comunidades tradicionais;

• a luta dos Povos Originários é uma luta para o bem-estar de toda a sociedade, em defesa da pluralidade da coletividade brasileira e do meio ambiente ecologicamente equilibrado;

• o deslocamento de competência em matéria constitucional só pode ser feito para ampliar direitos e não para impor retrocessos;

• a biodiversidade, a sustentabilidade e o equilíbrio ambiental não podem ser submetidos aos interesses de maiorias legislativas de ocasião no Congresso Nacional;

• os Povos Indígenas e Comunidades Quilombolas do Brasil são sujeitos de direito, cidadãos e cidadãs, e como tais, devem ser respeitados em seus direitos e em sua integridade física, moral, cultural e histórica;

• juristas renomados e o próprio ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luis Roberto Barroso, relator do Mandado de Segurança n° 32262, já alertaram para a absoluta inconstitucionalidade da PEC 215/2000;

• é urgente que o governo brasileiro aplique a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), aprovada em 1989, durante sua 76ª Conferência, e ratificada pelo Brasil em 2004, sendo o principal tratado internacional sobre direitos dessas populações no tocante à consulta livre, prévia e informada, saúde, educação, trabalho, usufruto da terra, entre outros;

• é fundamental que o Estado brasileiro torne efetivo o direito dos povos indígenas à diferença e ao direito originário a suas terras e territórios, bem como o reconhecimento dos direitos de outros povos e comunidades tradicionais.

Os signatários abaixo elencados RESOLVEM manifestar o seu total apoio à luta dos Povos Indígenas, das Comunidades Quilombolas e da Coletividade brasileira e exigir a retirada imediata de tramitação da PEC 215/2000, propostas apensas e de quaisquer outras iniciativas voltadas a suprimir ou regredir nos direitos dos povos indígenas, das comunidades quilombolas e no reconhecimento das unidades de conservação.

Assinam:

1. Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e a Pela Vida
2. Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib
3. Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – Apoinme
4. Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste – Apinsudeste
5. Articulação dos Povos Indígenas do Sul – Arpinsul
6. Articulação Pacari
7. Associação Brasileira de Antropologia – ABA
8. Associação das Advogadas e Advogados Públicos para a Democracia – APD
9. Associação de Advogados da AGU
10. Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida – APREMAVI
11. Associação dos Acadêmicos Indígenas da Universidade de Brasília
12. Associação dos Juízes para a Democracia – AJD
13. Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED)
14. Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra
15. Casa das Redes
16. Central Única dos Trabalhadores – CUT
17. Centro Acadêmico de Ciência Política da Universidade de Brasília
18. Centro de Trabalho Indigenista – CTI
19. Centro Popular de Direitos Humanos – CPDH
20. Coalizão Pró-SNUC
21. Coletivo Jovem de Meio Ambiente do Brasil
22. Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal
23. Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados
24. Comissão Guarani Yvyrupa
25. Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo
26. Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB
27. Conselho de Missão entre Povos Indígenas (Comin)
28. Conselho Indigenista Missionário – Cimi
29. Conselho Nacional de Direitos Humanos
30. Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Consea
31. Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas – Conaq
32. Distrito Federal em Movimento
33. Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil
34. Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Distrito Federal e
Entorno- Fetraf-DFE
35. Fórum de Entidades Sociais de São Sebastião
36. Fórum de Políticas Públicas de Esporte e Lazer Indígena
37. Frente Parlamentar Ambientalista
38. Frente Parlamentar em Apoio aos Povos Indígenas
39. Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos
40. Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana
41. Frente Parlamentar Mista de Segurança Alimentar e Nutricional
42. Frente Parlamentar Mista Pela Educação do Campo – FPMEDOC
43. Fundação SOS Mata Atlântica
44. Grande Assembleia do Povo Guarani – Aty Guasu
45. Greenpeace
46. Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – Ipam
47. Instituto Internacional de Educação do Brasil
48. Instituto Nzinga Mbandi
49. Instituto Socioambiental – ISA
50. Mídia Ninja
51. Mobilização dos Povos Indígenas do Cerrado – Mopic
52. Movimento Afrodescendente de Brasília – Madeb
53. Movimento de Apoio aos Povos Indígenas
54. Movimento Supernova
55. Movimento Tortura Nunca Mais
56. Núcleo Agrário da Câmara dos Deputados
57. Observatório do Clima
58. ONG Alternativa Terra Azul
59. Ordem dos Advogados do Brasil – OAB
60. Organização Indígena do Médio e Baixo Perus
61. Rede Cerrado
62. Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira
63. Rede Grupo de Trabalho Amazônico – GTA
64. Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares – Renap
65. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República – SDH/PR
66. Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República – SEPPIR/PR
67. Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República- SPM/PR
68. Terra de Direitos
69. Via Campesina
70. WWF-Brasil

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