Ministro reforça posição do governo contra mudanças nas demarcações indígenas

José Carlos Oliveira – Agência Câmara

Em debate na Câmara, o ministro-chefe da Secretaria de Direitos Humanos, Pepe Vargas,  utilizou as políticas de direitos humanos para reforçar a posição do governo contra mudanças na demarcação de terras indígenas.

Ele participou de audiência pública na Comissão Especial da Câmara que analisa a proposta (PEC 215/00) que transfere do Executivo para o Congresso a decisão sobre a demarcação de terras indígenas.

Pepe Vargas destacou as políticas públicas em curso que, segundo ele, têm melhorado as condições de vida dos 817 mil índios brasileiros. O ministro citou as seguintes políticas públicas em defesa dos índios:

  • aumento do percentual de indígenas (de até 10 anos de idade) com registro civil de nascimento, com meio de garantir direitos e cidadania;
  • redução na mortalidade infantil entre povos indígenas (de 74,6 para cada 1.000 nascidos vivos, em 2000, para 43,4, em 2013);
  • estrutura da atenção à saúde indígena: 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas, 340 polos base, 68 Casa de Saúde Indígena e 751 postos de saúde;
  • 305 profissionais do Programa Mais Médicos atendem exclusivamente aldeias;
  • do total de 5.625 aldeias do país, 2.313 (47%) já receberam obras para a instalação de sistema de abastecimento de água;
  • 140,5 mil famílias indígenas cadastradas e 106,4 mil efetivamente beneficiadas com o Programa Bolsa Família;
  • 239,6 mil matrículas em escolas indígenas de educação básica e 172,7 mil em escolas indígenas de ensino fundamental; e
  • 20,4 mil indígenas matriculados no ensino médio regular e 6,3 mil em ensino superior.

Preservação cultural

Pepe Vargas defendeu o atual processo de demarcação de terras indígenas como fundamental para que essa população preserve seus valores culturais e tenha acesso aos direitos, inclusive os territoriais, assegurados na Constituição de 1988.

“Ao nosso ver, a legislação que temos hoje dá conta do processo demarcatório. Não considero que a mudança da Constituição venha trazer mais segurança jurídica. Com certeza, trará mais conflitos porque, se cada área a ser demarcada tiver de ser precedida de um projeto de lei que tramite por aqui, vai retardar muitos processos e trazer mais conflitos”, disse Pepe Vargas. “Então, acho que a gente pode e deve analisar a legislação para aperfeiçoá-la enquanto procedimento administrativo e não enquanto procedimento legislativo.”

Diminuição das homologações

Até agora, nos dois governos Dilma Rousseff (a partir de 2011), foram homologadas apenas 14 terras indígenas, número bem inferior às 87 dos dois governos Lula e 145 dos dois governos FHC.

Segundo Pepe Vargas, a diminuição no ritmo de demarcações se deve ao fato de as novas áreas estarem em regiões de conflito fundiário, aos mais de 40 processos judiciais em curso e à falta de lei que regulamente o pagamento de indenização para os proprietários com títulos de boa fé.

Indenizações

Deputados ambientalistas e indigenistas argumentaram que os dados do governo rebatem o argumento dos ruralistas de que os problemas dos indígenas é de carência de políticas públicas e não de terra.

É o caso do deputado Sarney Filho (PV-MA), para quem o foco da discussão deve ser o aperfeiçoamento dos mecanismos de indenização aos produtores rurais desapropriados nos processos de demarcação de terras indígenas.

“A votação da PEC, na prática, acaba com a criação de novas reservas indígenas e abre, sim, perspectiva para acabar com as já existentes”, disse Sarney Filho. “Devemos deixar de lado essa questão e passar a discutir outros assuntos, como a indenização, que tem certo consenso”.

Sem condições

Já o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária, avalia que o governo não tem condições de pagar indenizações nos casos de desapropriação.

“O governo não paga desapropriação de terras indígenas. Não tem dinheiro. Na prática não funciona”, afirmou. Para ilustrar o não pagamento do governo, Valdir Colatto citou o caso de uma área desapropriada em 1985, em Chapecó-SC, que está até hoje sem pagamento, sequer, das benfeitorias, o que é exigido pela Constituição.

“Nós temos 13% do território brasileiro que são terras indígenas, e a busca [de novas terras] é de 25%. Tudo que plantamos no Brasil ocupa 60 milhões de hectares. Os indígenas têm 120 milhões de hectares e estão pobres e miseráveis”, afirmou.

Distorções

Os agropecuaristas afirmam que a intenção da proposta em análise na Câmara é acabar com distorções ou fraudes em laudos antropológicos da Funai que, segundo eles, têm justificado demarcações mesmo em locais de produção rural tradicional.

Em caso de aprovação da proposta, serão consideradas terras indígenas aquelas efetivamente ocupadas por essa população até a promulgação da Constituição, em outubro de 1988.

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Pepe Vargas defende diálogo e conciliação para assegurar direitos nas demarcações

Durante audiência da comissão especial sobre demarcações de terras indígenas (PEC 215/00), o ministro Pepe Vargas sugeriu novas formas de atuação para a superação dos entraves para novas demarcações, que ultrapassem o procedimento padrão de regularização e com a “garantia de processos de diálogo e conciliação que assegurem os direitos de todos os envolvidos”.

Pepe Vargas defendeu também a aprovação de duas propostas em tramitação no Congresso. Uma delas é o PL 2057/91, que prevê um novo Estatuto do Índio, em substituição ao atual (Lei 6.001/73).

O ministro argumenta que o estatuto atual tem “cunho integracionista” e está em contraste com a Constituição, que garantiu aos índios o direito e o respeito aos seus usos e tradições. A outra proposta (PL 3571/08) cria o Conselho Nacional de Política Indigenista.

Patrimônio de preservação

Já o deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), também da Frente Parlamentar da Agropecuária, ressaltou “a riqueza do enfoque dado para esse debate” sobre as comunidades indígenas. “Aqui na Casa, infelizmente temos feito um debate absolutamente raso, que leva em consideração apenas os limites demarcatórios de terra.”

Ele afirmou que “a grande maioria dos índios são patrimônio ideológico de preservação. Esses dados e seu ministério podem servir como ponto de partida para que possamos fazer de maneira pacífica e inteligente uma política indigenista harmoniosa, que tire, definitivamente, esse contencioso raivoso que nós temos.”

Investimento

O deputado Nilto Tatto (PT-SP) destacou que “nunca houve tanto investimento em políticas públicas para os indígenas como nos últimos anos” e manifestou preocupação de que a PEC 215/00 venha colocar em risco os resultados dessas políticas.

Tatto sugeriu a criação de um grupo com representantes dos três poderes da União para buscar a superação dos conflitos fundiários e avançar na demarcação de terras indígenas.

Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), “a terra é fundamental para que os indígenas se considerem enquanto povo”. Ela também defendeu avanços nos mecanismos de pagamento das indenizações para os proprietários de terra com título de boa fé, desapropriados para demarcações de terras indígenas.

E o deputado Edmilson Rodrigues (PSOL-PA) voltou a citar o argumento da baixa representatividade de indígenas no Parlamento para defender a rejeição da PEC.

Íntegra da proposta:

 

Reportagem – José Carlos Oliveira
Edição – Newton Araújo

Destaque: Segundo Pepe Vargas, políticas públicas têm melhorado as condições de vida dos 817 mil índios brasileiros – Antonio Augusto / Câmara dos Deputados

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