Deputado federal de MT é investigado por suspeita de atuar contra índios

Organização criminosa tentou evitar retomada da Maraiwatséde, aponta MPF. Nome de Nilson Leitão (PSDB) foi mencionado em escutas telefônicas.

Por Pollyana Araújo, do G1 MT

No processo de retomada da Terra Indígena Maraiwatséde, em Alto Boa Vista, a 1.064 km de Cuiabá, uma organização criminosa teria se formado na tentativa de evitar a retirada das famílias de agricultores que viviam na área após grilagem, como aponta o Ministério Público Federal (MPF). Um dos políticos investigados por suspeita de atuar em favor dos posseiros e, consequentemente, contrário aos indígenas, é o deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT). Ele preside a comissão especial que analisa a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que altera os trâmites dos processos de demarcação de terras indígenas, transferindo essa competência do governo federal para o Congresso Nacional.

Nas investigações, segundo o MPF, foi descoberto que essa organização, supostamente liderada pelo então presidente da Associação dos Produtores Rurais da Gleba Suiá Missú (Aprosum), Sebastião Prado, teria usado da influência política e do poderio econômico para incitar uma série de atos criminosos, como ameaças, incêndios e interdição de estradas, durante o período de retirada dos grileiros da região, que começou em 2012 e terminou em 2013.

Prado chegou a ser preso no ano passado por supostamente financiar e auxiliar na prática de crimes para tentar impedir a retomada da área de propriedade dos índios da etnia Xavante. O G1 tentou entrar em contato com o representante dos produtores, mas não obteve sucesso.

Por meio de escutas telefônicas entre os investigados, foram constatadas possíveis negociações no sentido de direcionar o parecer a ser elaborado pela relatoria da comissão especial da PEC 215 na Câmara dos Deputados para atender aos interesses desses supostos criminosos mediante pagamento de uma quantia em dinheiro a um advogado que seria assessor da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), que também auxiliava a comissão. O valor pedido supostamente por esse assessor seria de R$ 30 mil, como foi identificado após as interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça.

Como foram identificados indícios de que políticos com foro privilegiado estariam supostamente envolvidos com esses crimes, o juiz federal da Vara Única de Barra do Garças, a 516 km de Cuiabá, César Bearsi, remeteu o inquérito ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Ao G1, o deputado Nilson Leitão negou envolvimento em qualquer tipo de ilegalidade e disse ter sido somente citado pelos produtores rurais nas conversas interceptadas. Ele também criticou o MPF e a determinação judicial para a saída das famílias. “Se organizaram e despejaram os pequenos produtores. Na época, o Sebastião era presidente da associação e frequentou o meu gabinete [em Brasília] e foi aí que tomei conhecimento da situação, mas em momento nenhum houve ilegalidade”, afirmou Leitão.

Ele disse que à época da desocupação se manifestou contra e que continua discordando da retomada das terras para os índios, já que, segundo o parlamentar, não mudou em nada a vida dos indígenas e os produtores que moravam no local, sendo que alguns havia mais de 20 anos, foram prejudicados.

Uma das ligações telefônicas em que o nome de Leitão foi mencionado se tratava de uma conversa entre a mulher de Sebastião Prado e um assessor do gabinete do deputado. “Ela ligou desesperada no meu gabinete e falou com meu assessor para que arrumássemos um advogado para tentar tirá-lo da prisão. Mas foi só isso. Essa investigação é uma idiotice e se a intenção é me inibir, não vão conseguir”, argumentou. Para ele, existem interesses ideológicos por trás da investigação.

Ele alega que existe um equívoco em relação à PEC 215, que, no ano passado, tinha sido arquivada e, neste ano, voltou a ser discutida no Congresso. O relatório da comissão já estava pronto. No entanto, a pedido de membros que são contrários a alguns pontos da proposta, o prazo de votação foi prorrogado por mais 60 dias. Nesse período, os representantes dos indígenas devem ser ouvidos.

Leitão acredita que o inquérito possa ser arquivado, já que, segundo ele, o processo contra o ex-presidente e atual vice-presidente da comissão, Osmar Serraglio (PMDB-PR), foi arquivado.

Para o deputado federal Ságuas Moraes (PT-MT), que também faz parte dessa comissão representando o PT, a PEC é ‘perversa’ ao proibir a criação e ampliação de terras indígenas e quilombolas. Ele avalia que é preciso prever a indenização para a ampliação de algumas áreas. Ele citou o caso dos indíos empobrecidos que vivem nas periferias das cidades, como em Dourados (MS).

“Eles vivem na periferia, sem espaço e com estrutura precária, e no entorno tem propriedades rurais que foram adquiridas de boa fé. Então é preciso indenizar as famílias que vivem nessas terras e ampliar a área indígena”, defende o petista que coordena a Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas.

Os dois principais pontos ‘errôneos’ da proposta, na avaliação de Moraes, são a geração de despesa por parte do legislativo e a possível retirada das áreas já reconhecidas como sendo de propriedade das comunidades indígenas.

O território da Terra Maraiwatséde foi devolvido para os indígenas no início na década de 90, quase 40 anos depois da retirada deles da área. Porém, devido à demora na retomada da terra, mais de 200 famílias se apossaram das terras, até que há três anos a Justiça Federal determinou a saída de todos os posseiros e grileiros.

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Destaque: Foto de Alan Azevedo/ Greenpeace

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