Junho de 2013 e o processo eleitoral

“Em junho de 2013, a voz das ruas se fez ouvir. Apesar disso, poucas respostas foram dadas. Será que o sistema político está disposto a escutá-la?”, escreve Pablo Ortellado, professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo. Eis o artigo

IHU On-Line – Havia muita expectativa sobre qual seria o impacto dos protestos de junho de 2013 no processo eleitoral. A mais razoável era a de que as demandas pela redução das tarifas de transporte e por melhores serviços públicos, combinadas com uma crítica da representação, levassem a votos em candidaturas progressistas desvinculadas dos partidos estabelecidos. Mas não foi o que ocorreu.

Se compararmos com processos similares em outros países, a experiência brasileira não destoa. Para ficarmos com dois exemplos: logo após maio de 1968, os franceses reelegeram Charles de Gaulle e os espanhóis elegeram Mariano Rajoy, depois das ocupações de praças pelos indignados, em 2011. Com esses antecedentes, talvez não devêssemos esperar que houvesse impacto eleitoral direto de uma revolta anti-institucional como a que vimos em 2013.

Apesar disso, parece-me que as candidaturas deveriam ter prestado mais atenção às demandas dos manifestantes, já que um terremoto social como o de junho de 2013 não ocorre por acaso. Embora tenha sido jogada muita fumaça sobre as insatisfações, elas foram expressas de maneira mais ou menos clara.

Em primeiro lugar, os cidadãos pediram redução das tarifas de transporte público. A questão que detonou o processo, tanto que as pesquisas de opinião realizadas no auge da crise colocaram os preços do transporte público no topo da agenda reivindicatória dos manifestantes. Apesar disso, o tema praticamente desapareceu do debate eleitoral (a exceção foi a promessa de passe livre estudantil pela candidata derrotada Marina Silva).

Pode parecer que essa ausência se deve ao caráter imaturo do debate sobre o tema, mas há propostas concretas sobre a mesa. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 90/2011, da deputada Luiza Erundina (PSB-SP), estabelece o transporte público como um direito social, assim como a saúde e a educação.

Outra proposta, produzida pelo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, propõe a adoção de uma contribuição sobre a gasolina com a receita revertida para o subsídio dos transportes públicos, o que poderia viabilizar uma tarifa social ou até mesmo a tarifa zero para os ônibus. Essa proposta também precisa de ação do Executivo federal, pois pressupõe a municipalização de uma contribuição federal, a Cide.

A outra demanda transversal aos diversos grupos que participaram dos protestos é a reforma da polícia. A violência policial não é só a responsável pela ampliação dos protestos, após a difusão de imagens de abusos, como seu fim é uma demanda universal dos movimentos sociais. Para ela também há uma agenda bem estabelecida.

O projeto de lei nº 4.471/2012, do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), busca pôr fim à “resistência seguida de morte”, termo que encobre a execução de suspeitos por policiais. A PEC 51/2013, do senador Lindbergh Farias (PT-RJ) busca uma profunda reforma da polícia levando a sua desmilitarização.

Por fim, o PL 6.500/2013, do deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), busca limitar o uso de armas menos letais usadas na repressão a manifestações. Todas essas iniciativas legislativas precisam de apoio do Congresso e do governo federal.

Há pouco mais de um ano a voz das ruas se fez ouvir. Apesar disso, poucas respostas foram dadas até agora no debate eleitoral. Será que o sistema político está disposto a escutá-la?

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