Andrea Cangialosi – Rio On Watch
Após sete anos fornecendo um espaço aclamado de preservação histórica, de cultura e arte no Complexo da Maré, o Museu da Maré está marcado para ser despejado, e têm 90 dias para desocupar o prédio onde fica.
“Aqui, a resistência sempre tem sido necessária. Mas resistir sozinho é impossível” – placa no Museu da Maré
A frase citada acima, encontrada na exposição Tempo da Resistência (um dos vinte temas que estruturam a exposição permanente do museu), mostra a realidade do Museu da Maré, onde centenas de pessoas compareceram para apoiar a permanência do Museu durante o protesto cultural da semana retrasada, chamado de ‘’Primavera da Resistência: Museu, Memórias, Utopias’’. O protesto mostrou a importância do museu para a comunidade através de oficinas, excursões guiadas gratuitas e sessões de assinaturas de petições contra o despejo.
O museu, inaugurado em 2006, foi edificado e mantido em um prédio emprestado durante 10 anos pela ONG CEASM (Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré). O contrato venceu no ano passado. Em junho de 2014, um dos diretores do Grupo Libra de Comércio Marítimo, comunicou a perda do interesse dos investidores em renovar o prazo. Mais recentemente, no dia 10 de setembro, o museu recebeu o aviso oficial para desalojar a propriedade em 90 dias. É por esta razão que esse ano na oitava edição da Semana do Museu, no Complexo da Maré sentiu-se em um estado de emergência.
Estratégias para a resistência
A ameaça de despejo resultou em uma forte chamada por ações coletivas. Várias estratégias foram implementadas para conseguir envolver ao público no movimento para salvar o museu. Na semana da Primavera da Resistência, houveram reuniões e oficinas que incluíram artesanatos, capoeira, rodas de leitura e debates ambientais que destacavam a importância da resistência. Um evento no Twitter no dia 23 de setembro gerou centenas de tweets em uma hora com a hashtag #SOSMuseuDaMare, usando o movimento on-line para alcançar um público mais amplo. No dia 27 de setembro (sábado), o último dia da Primavera da Resistência, houve uma peça teatral e distribuição de balas. Cerca de 500 pessoas protestaram contra o despejo do museu: tanto moradores da favela quanto do asfalto, assim como estudantes universitários e também professores.
Essa não é a primeira nem a última ação organizada pelo museu, que já em agosto criou um movimento chamado “O Museu da Maré Resiste!”, apoiado pelo Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), o Instituto Pereira Passos (IPP), e o Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH). A proteção do prédio foi aprovada no dia 18 de setembro. Embora essa medida não anule o despejo, ao menos oferece uma certa segurança legal ao classificar o prédio como patrimônio da cidade do Rio de Janeiro. Existem quatro petições contra o despejo: três online (nos sites Panela de Pressão do Meu Rio, Petição Pública e Avaaz.org); e uma em papel, assim como um grupo de pressão por correspondência. Além dessas ações, haverá uma passeata que começará no Museu da Maré no dia 18 de outubro e almeja bloquear a Avenida Brasil, a avenida mais próxima.
Resistir juntos é possível
Tendo recebido cerca de 40.000 visitantes e numerosos prêmios durante seus sete anos de atividade, o Museu da Maré tem uma posição considerável na comunidade global de museus. “Sauvons le Museu da Maré” (Salvemos o Museu da Maré) é um exemplo do apoio internacional recebido da França, que está tentando colocar pressão no Conselho Internacional de Museus (ICOM) para que reconheça e apoie a causa.
O RioOnWatch visitou o museu para documentar a importância e o impacto que ele tem na comunidade. Em seguida publicaremos a segunda parte deste artigo, uma foto-reportagem com depoimentos de moradores, visitantes, curadores e colaboradores do Museu da Maré.