MPF teve 85 denúncias de preconceito contra nordestinos após eleição do 1º turno

dignidade médica 3Postagens de preconceito serão avaliadas pela Procuradoria da República do DF para determinar possível investigação criminal

Por Wilson Lima e Carolina Garcia, do iG

Em menos de uma semana, a Procuradoria Geral da República (PGR) recebeu 85 denúncias de atos de preconceito contra nordestinos pela internet. As acusações serão analisadas pela Procuradoria da República do Distrito Federal (PRDF). E foram feitas através da Central de Atendimento ao Cidadão da PGR e listam postagens contra nordestinos pelo Facebook, Twitter, Whatsapp, entre outras redes sociais, em mensagens ligadas diretamente ao processo de eleição.

Durante essa semana, ocorreram várias manifestações de ódio contra nordestinos pela internet. Uma das mais polêmicas foi a comunidade “Dignidade Médica”, hospedada na rede social Facebook, que chegou a pregar um “holocausto contra nordestinos”. O grupo foi revelado pelo iG e reúne quase 100 mil usuários que se declaram da classe médica brasileira.

Comentários contra nordestinos da comunidade Dignidade Médica:

Postagens do grupo 'Dignidade Médica' no Facebook com citações preconceituosas e discurso de ódio . Foto: Reprodução
Postagens do grupo ‘Dignidade Médica’ no Facebook com citações preconceituosas e discurso de ódio . Foto: Reprodução
A princípio todas as denúncias serão encaminhadas para análise da PRDF, que analisará se, a partir delas, vai instaurar um procedimento investigatório único ou vai encaminhá-las a outras procuradorias, nas quais já existem denúncias relacionadas em vários Estados brasileiros. É possível que os procuradores também tentem quebrar o sigilo telemático dos autores dos posts preconceituosos ou mesmo peçam auxílio da Polícia Federal, por meio da Delegacia de Crimes Cibernéticos. Atualmente, postagens preconceituosas já são alvos de apuração em vários Estados, como no Ceará, por exemplo.

Autores de posts discriminatórios estão passíveis de responder pelo crime de racismo. O delito é previsto no art. 20 da Lei 7.716/89 e pode render pena de dois a cinco anos, mais multa. Além dos crimes de racismo, autores de posts também são passíveis dos crimes de incitação pública à prática de ato criminoso, que pode resultar em detenção de 3 a 6 meses, mais multa.

A velha briga PT x PSDB

A vitória de Dilma Rousseff (PT) no primeiro turno, no dia 5 de outubro, foi o estopim para um surto de mensagens preconceituosas contra nordestinos, nortistas, negros e beneficiários dos programas sociais do governo federal. Um dia depois, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso aumentou a disputa partidária após dizer que o PT cresceu com o voto dos “menos informados”.

“O PT está fincado nos menos informados, que coincide de ser os mais pobres. Não é porque são pobres que apoiam o PT, é porque são menos informados”, afirmou FHC ao UOL.

Já nos próximos compromissos do segundo turno, o ataque ao Nordeste foi levado aos palanques e gerou faíscas entre as rivais campanhas. O jurídico do PT confirmou ao iGque levará a comunidade “Dignidade Médica” ao Ministério Público Federal (MPF) e citou ainda que a questão vai além de uma briga partidária. Para o tucano Aécio Neves, no entanto, sua candidatura tem sido alvo de todo tipo de ataques dos “adversários políticos” que buscam apenas desmoralizá-lo.

“Preconceito está entranhado na sociedade”

Os especialistas em internet são categóricos em dizer que as eleições de 2014 ficarão marcadas pela participação das redes sociais. Luciana Ruffo, psicóloga do Núcleo de Pesquisas e Pisicologia em Informática da PUC-SP, explica que a interação online encoraja e valida opiniões como uma espécie de palanque na internet. A fantasia do anonimato, a desinformação de que poderá responder criminalmente pelo conteúdo com o rastreio do IP (endereço eletrônico) e a certeza de impunidade estimulam o compartilhamento de opiniões preconceituosas e racistas. “As pessoas se sentem mais corajosas para falar grandes absurdos”, avalia.

Luciana aponta ainda que os preconceitos diários estão longe de ser exclusivos das redes sociais  ou mesmo do período eleitoral. “Comentários preconceituosos ocorrem diariamente, é algo entranhado na sociedade e acontece em grupos de pessoas que compartilham a mesma ideia. Mas quando cai na web, outros tomam consciência e gera uma repercussão enorme”, analisa a psicóloga, que classifica as denúncias como consequência positiva da convivência entre diferentes classes sociais.

Ela conta ainda que as denúncias aumentarão na proporção que a mídia continue expondo os casos racistas e criarão um novo filtro contra esse tipo de ataque. “A denúncia vem com o conhecimento. É necessária porque estamos todos no mesmo espaço, que não tem dono, não tem cara, mas que faz que a informação circule com uma velocidade assustadora”, conclui.

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