Nota da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul sobre o Dia Internacional dos Povos Indígenas

Indígenas e Quilombolas protestam contra o governo do Rio Grande do Sul. Foto: Cau Guebo, Futura Press
Indígenas e Quilombolas protestam contra o governo do Rio Grande do Sul. Foto: Cau Guebo, Futura Press

A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul – ARPIN SUL, considerando este sábado como Dia Internacional dos Povos Indígenas, e com grande preocupação tendo em vista este semestre como período eleitoral, estende suas considerações a todos os povos indígenas do mundo a se mobilizarem em suas bases contra as diversas ações inconstitucionais que temos enfrentado diariamente através de ameaças, intimidações, assassinatos, leis anti-indigenas e diversos outros fatos que ocorrem diariamente ferindo gravemente os direitos humanos dos povos tradicionais do Brasil.

Atualmente, os propósitos do latifúndio, agronegócio, e de outros capitais interessados nos territórios indígenas e suas riquezas, têm impossibilitado a segurança indígena e a garantia do cumprimento das leis indígenas asseguradas na Constituição Federal, nos artigos 231 e 232.

Existem no país diversas campanhas de criminalização, deslegitimação, discriminação e racismo contra os povos indígenas. O poder executivo, através do Ministério da Justiça, atua de forma arbitraria e inconstitucional ao movimento indígena do Brasil a partir de negociações dos nossos direitos. Este fato é agravante, ainda mais quando se tem diversos projetos contra os povos indígenas tramitando no Congresso Nacional:

PEC 237/13 visa legalizar o arrendamento das terras indígenas;

PEC 215/2000 leva para o Congresso Nacional a demarcação e homologação de terras indígenas, quilombolas e de áreas de conservação ambiental, que conforme a Constituição Federal são atribuições do Poder Executivo;

PL 1610|96 Pretende legalizar a invasão dos territórios indígenas para fins de mineração;

 – PLP 227/12 que de maneira perversa converte interesses privados do agronegócio e de outros poderosos segmentos econômicos do país em relevante interesse público da União, pretendendo dessa forma legalizar a invasão e usurpação dos nossos territórios originários.   No poder Executivo os ataques aos direitos indígenas se dão por meio dos seguintes instrumentos:

  • Portaria 303, de 17 de julho de 2012, iniciativa do poder Executivo, por meio da Advocacia Geral da União (AGU) que estende equivocadamente a aplicação para todas as terras a aplicabilidade das condicionantes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da demarcação da terra Indígena Raposa Serra do Sol (Petição 3.388/RR), mesmo depois do entendimento da Suprema Corte de que as mesmas se aplicariam somente a esta terra. Dentre essas condicionantes constam: uma que impede a ampliação de territórios para corrigir erros que prejudicaram povos durante a regularização inicial e outra que nega o direito de consulta às comunidades por ocasião de instalações públicas (militares, por exemplo) nos seus territórios.
  • Portaria 2498, de 31 de outubro de 2011, que determina a intimação dos entes federados para que participem dos procedimentos de identificação e delimitação de terras indígenas, contrariando o Decreto 1.775/96 que já estabelece o direito ao contraditório no processo de demarcação.
  • Portaria Interministerial 419 de 28 de outubro de 2011, que restringe o prazo para que órgãos e entidades da administração pública (Fundação Nacional do Índio -, FUNAI, no caso indígena) agilizem os licenciamentos ambientais de empreendimentos de infraestrutura que atingem terras indígenas.
  •  Decreto nº 7.957, de 13 de março de 2013, que cria o Gabinete Permanente de Gestão Integrada para a Proteção do Meio Ambiente e regulamenta a atuação das Forças Armadas na proteção ambiental, alterando o Decreto nº 5.289, de 29 de novembro de 2004. Com esse decreto, “de caráter preventivo ou repressivo”, foi criada a Companhia de Operações Ambientais da Força Nacional de Segurança Pública, tendo como uma de suas atribuições “prestar auxílio à realização de levantamentos e laudos técnicos sobre impactos ambientais negativos”. Na prática, isso significa a criação de instrumento estatal para repressão militarizada de toda e qualquer ação de povos indígenas, comunidades, organizações e movimentos sociais que decidam se posicionar contra empreendimentos que impactem seus territórios.

A partir destas, entre os vários outros projetos de leis contrários aos direitos constitucionais dos povos indígenas, é nítido e vergonhoso a pactuação dos poderes do Estado contra os nossos direitos. O modelo agroexportador adotado pelo Brasil para atingir o status de quinta potência mundial se reflete nos dados dos indígenas assassinados nos últimos anos: 167 indígenas assassinados no governo FHC, 452 indígenas assassinados no governo Lula, 161 indígenas assassinados no governo Dilma. Cerca de 40% de todas estas mortes desde 2007 foram de crianças com até 4 anos. E ainda mais de 800 mil indígenas sofreram algum tipo de violência decorrente da omissão do Poder Público (dado do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2010).

Não podemos mais ser protagonistas dos ataques aos direitos indígenas e à Constituição. Se o atual governo jamais recebeu os povos indígenas para dialogar, o que se pode esperar da próxima presidência brasileira? Uma vez que a própria Presidente da República tem mantido uma conduta omissa em relação aos direitos dos povos, e conveniente com os interesses dos ruralistas e do latifúndio.

Não é apenas por ser o Dia Internacional dos Povos Indígenas, é o cotidiano que enfrentamos em nossa própria terra, em defesa das nossas gerações, para garantir e manter as imensas culturas tradicionais de cada povo. A nossa ancestralidade não pode ficar à mercê do Estado, já estamos fartos de tanta hipocrisia e morosidade por parte deles. Durante todo este mês e até o final do ano, faremos o cabível para denunciarmos todas esta ações contra os povos indígenas para que toda a população tenha conhecimento do que o governo impede de chegar à mídia brasileira e internacional. E ainda assim deturpando as informações reais. Como foi comprovado na Mobilização Nacional indígena deste ano, em Brasília.

Não somos contra o avanço e o progresso brasileiro. Temos notório conhecimento do potencial do nosso país, porém, não podemos continuar sendo tratados desta forma. E queremos de fato sim, estarmos incluso no que acreditamos ser real: a democracia e a vivência plena entre as diferentes realidades culturais, a ordem no cumprimento das leis e o respeito à Constituição Federal, e o progresso natural do nosso país sem agressão à natureza. Afinal, deste último, todos nós precisamos manter para garantir a sobrevivência do planeta terra.

Curitiba, 07 de agosto de 2014

ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DA REGIÃO SUL 

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