Mobilização nacional previne violação de direitos da população de rua durante Copa

2014_06_copa_moradores-de-rua_rebaixada-orgMarcela Belchior – Adital

A articulação em defesa dos direitos humanos durante a Copa do Mundo Fifa 2014 tem rendido frutos. Duas semanas após o início dos jogos no Brasil, não foram registrados, formalmente, casos de violação de direitos da população em situação de rua. Mobilização nacional de entidades de defesa, órgãos públicos, organizações governamentais e não governamentais têm acompanhado de perto o tratamento dado a essa parcela de brasileiros e continua alerta a qualquer desrespeito a crianças, jovens, adultos e idosos que vivem nas ruas do país.

Diante de arbitrariedades cometidas pela Federação Internacional de Futebol (Fifa), respaldadas pelos governos federal, estaduais e municipais, havia preocupação relativa ao tratamento dessa população durante o megaevento. Temia-se a remoção forçada dessas pessoas, sem encaminhamento e acolhimento adequado.

No entanto, a assistente social Karina Alves, coordenadora do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua e dos Catadores de Materiais Recicláveis (CNDDH), em entrevista à Adital, indica que os casos registrados até o momento se situam em período anterior à abertura dos jogos, imediatamente nos meses antecedentes. Os casos, segundo ela, foram registrados nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte (Minas Gerais), Salvador (Bahia) e Porto Alegre (Rio Grande do Sul).

Em sua maioria, foram casos de violência institucional cometida pelo Poder Público. “Ações de caráter higienista que, por essa natureza, podem ter relação com a preparação da Copa do Mundo. Por exemplo, casos de remoção forçada de pessoas de espaços públicos próximos aos estádios ou em outros locais centrais ou com valor turístico, bem como ações de retirada de pertences”, aponta Karina.

A coordenadora explica que, diante de denúncias de violações, o CNDDH representa aos Ministérios Públicos dos estados e defensorias para fins de investigação e providências e solicita informações às polícias, ao Poder Público local responsável, que têm o dever de efetivar as políticas públicas. “É importante ressaltar que o Conselho Nacional do Ministério Público elaborou diretrizes de atuação específicas para a guarda e a promoção dos direitos da população em situação de rua durante a Copa do Mundo de 2014. Sobre as violações já registradas, o CNDDH segue acompanhando e monitorando diligências realizadas”, destacou Karina.

Ela enfatiza ainda que, em relação à Copa das Confederações, realizada em 2013 no Brasil, este ano houve uma articulação mais forte entre as entidades de defesa de direitos humanos, em função de experiência acumulada do evento anterior, e, atualmente, são mobilizados plantões para acompanharem possíveis casos. “É importante manter a população em situação de rua informada sobre os seus direitos mais amplos de cidadania, mas, no contexto da Copa do Mundo, ressaltamos o direito de ir, vir e de estar no espaço público”, ressalta Karina.

No último dia 24 de junho, reportagem publicada pela Agência Pública apontou diversas irregularidades no tratamento da população em situação de rua em Belo Horizonte. A matéria indicava que pessoas eram vítimas de repressão e práticas de “higienização” da cidade, com pertences recolhidos pela Prefeitura Municipal e abrigo em condições precárias. A situação, porém, não é reconhecida por Karina como responsabilidade da organização da Copa do Mundo. Ela afirma que essa é uma realidade anterior ao Mundial no município e uma luta antiga dos movimentos sociais.

Denúncia na cidade-sede Fortaleza

Em Fortaleza, Estado do Ceará, houve denúncia, por parte de um jornal local, de remoção forçada sem acolhimento e encaminhamento adequado. Segundo a matéria, publicada no último dia 14 de junho, pessoas em situação de rua seriam submetidas a ações de “higienização” por órgãos do Estado, que teriam interesse em ocultar essa realidade social local.

O vereador de Fortaleza, Ronivaldo Maia, do Partido dos Trabalhadores (PT), disse em entrevista à Adital considerar a situação um flagrante do abandono de políticas públicas de proteção a essa população na cidade. “Já é uma agressão contra eles, que são higienizados o ano todo. Agora têm de ser colocados num local durante os eventos. Isso não é política pública porque não é abrigo, é uma solução improvisada”, criticou o parlamentar.

Já para o vereador João Alfredo (Psol), também de Fortaleza, o caso chegou a alarmar quando veio a público pela imprensa. Porém, após visitar locais para os quais a população tem sido deslocada, ele afirma à Adital que não tem havido condução forçada. Ainda assim, questiona o método adotado pelo Estado para atender a esse grupo. “O que é certo é que a cidade vive uma realidade completamente diferente durante a Copa do Mundo”, avalia.

Entidades de defesa também negam que esteja havendo violação de direitos relacionada à população de rua nesse sentido. A coordenadora da Pastoral de Rua no Ceará, Fernanda Gonçalves, afirmou à Adital que, até o momento, não há registros de casos, não reconhecendo o fato publicado pelo jornal.

“Não reconhecemos como higienização. (…) Foi um equívoco. Acho que o ou a jornalista não tinha conhecimento do trabalho de convergência”, disse Fernanda, referindo-se à Agenda de Convergência liderada pela Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República, programada para orientar o trabalho de defesa de direitos durante o Mundial e megaeventos posteriores. Ela considera as ações um trabalho de proteção aos mais vulneráveis a casos de trabalho infantil ou exploração sexual. “A população permanece nos espaços públicos, participando de festas ou trabalhando”, assegura.

Coordenador do núcleo do Ceará do CNDDH, Nailson Neo, também desconsidera a ação como violação e afirma que os locais de acolhimento foram, inclusive, demanda dos próprios movimentos sociais, que reivindicavam a necessidade de um ponto de apoio para essa parcela da população durante os jogos do Mundial. “Houve um mal entendido da mídia. Os equipamentos são uma retaguarda”, explicou à Adital.

Para denunciar

Casos de violações contra a população em situação de rua em todo o Brasil podem ser denunciados pelo Disque 100 ou diretamente para o CNDDH, pelo telefone (31) 3250-6291, inclusive através de chamadas a cobrar.

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