Em Brasileia, pousada de luxo que poderia abrigar haitianos será demolida

Abrigo lotado em Brasiléia
Abrigo lotado em Brasiléia

Por Alex Oliveira*, na RBA

Enquanto a discussão sobre o abrigo humanitário de Brasileia se concentra em fechar a fronteira ou fechar o abrigo, alternativas próximas que poderiam reduzir os efeitos colaterais da alta taxa de imigração haitiana seguem mais próximas do que parecem.

Em sessão extraordinária no último dia 15, a Câmara dos Vereadores de Brasileia decidiu destruir uma antiga pousada de luxo que já foi cartão postal da cidade. O nome do local: Vila Brasília. Inaugurada no meio de 2006, a pousada esteve em uso por pouco tempo e está abandonada há aproximadamente um ano. Dispõe de uma infraestrutura desejável a muitos profissionais do turismo: são 13 chalés construídos de acordo com uma arquitetura “amazônica”. Cobertos de palha, têm base de paxiúba. E desfrutam todos de um projeto detalhado o suficiente para suportar ar-condicionado.

A área comum possui piscina, parque infantil, quadra de areia e restaurante. A instalação elétrica é toda subterrânea e, pelo que indica sua matéria prima, de alta capacidade. Inclui os cabos coaxiais, que traziam o sinal da antena parabólica. Apesar disso, alguns sinais de gambiarras denunciam uma possível redução dessa qualidade. O sistema hidráulico também está todo pronto, incluindo armazenamento, distribuição e esgotamento, além dos hidrantes de segurança. Com os banheiros das suítes e os das áreas comuns, são mais de 30 vasos sanitários, pelo menos 20 pias e uma dezena de mictórios. Tudo já instalado. Há, ainda, uma lavanderia industrial. Cada um desses itens em funcionamento já ultrapassaria, em tamanho e número, a capacidade do atual abrigo humanitário. Mas isso se resume ao que pôde ser visto.

Com uma área coberta de aproximadamente 200 metros quadrados, a antiga recepção do estabelecimento também conta com banheiros próprios. O espaço de atendimento do restaurante, com mais 200 metros quadrados, equivaleria ao local onde as refeições são hoje servidas. No entanto, não dependeria de uma lona improvisada, nem do extremo calor por ela provocado, para funcionar. A cozinha industrial já instalada no Vila Brasília e ainda com equipamentos, se também fosse aproveitada, poderia reduzir o custo da comida hoje servida aos imigrantes. Agora financiada pelo governo federal, essa comida provocou, por si só, um processo de licitação.

Cada um dos 13 chalés, com área coberta de aproximadamente 50 metros quadrados, estava planejado para receber umas três pessoas. Com o propósito da emergência no lugar do luxo, seria tranquilamente capaz de acomodar 10 indivíduos em condições superiores às que são oferecidas pelo atual abrigo. A piscina, com seus 20 mil litros, tem tamanho do trailer da PM que pretende, no abrigo, suprir as necessidade receptivas do local.

Abrigo humanitário

Com 4.000 metros quadrados de área total e 1.200 metros quadrados sob zinco, o abrigo humanitário de Brasileia tem uma capacidade de hospedagem alegada de 300 pessoas. Isso significaria uma média de 4 metros quadrados de teto disponíveis a cada abrigado. Mas as condições atuais são mais graves: cerca de 1.200 pessoas estariam vivendo no refúgio de Brasileia, reduzindo o espaço coberto disponível a 1 metro quadrado por pessoa. Em outras palavras, se todos ali tivessem um colchão para dormir, não haveria teto para todo mundo.

Ignorados os espaços de cozinha, vestiários, banheiros e bar da piscina, o Vila Brasília tem cerca de 1.000 metros quadrados habitáveis, prontos. Pela mesma base de cálculo, seria imediatamente capaz de abrigar 250 imigrantes. Sua área desmatada equivale a mais de dois refúgios completos e poderia ser aproveitada para estruturas coordenadas, dedicadas à redução do período de permanência dos imigrantes na cidade. A uma distância aproximada de 2,5 quilômetros do refúgio atual, o Vila Brasília poderia ser uma alternativa de concentração burocrática.

Já existem propostas pela construção de áreas permanentes para a acomodação de imigrantes, fora do perímetro urbano e mais distantes de Brasileia. Os custos dessas eventuais construções nunca foram divulgados. Qualquer uma dessas propostas envolveria, ainda, custos logísticos, dado que a acumulação de imigrantes em Brasileia se deve sobretudo às operações de imigração feitas no entorno. Ponto de fronteira e sede da Receita Federal, o município é vizinho de Epitaciolândia, onde fica a delegacia da Polícia Federal. Toda essa estrutura já montada também seria – ao menos em parte – deslocada para o suposto novo refúgio.

Resultado de uma parceria entre a prefeitura de Brasileia e o governo do Acre, o Vila Brasília surgiu financiado pela Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e pela Caixa Econômica Federal. Mas deixou de operar logo que expirou o seu prazo de concessão. Segundo vereadores da cidade, mais de R$ 5 milhões foram gastos na sua construção e operação. O valor supera os R$ 4 milhões alegados por Nilson Mourão como custo estadual da imigração haitiana, na audiência pública de 3 de dezembro de 2013.

Cerca de R$ 50 mil ainda podem ser gastos com a demolição da antiga pousada. A escola pública que seria construída em seu lugar ainda não dispõe de plano de construção ou custo estimado.

* Alex Oliveira é fotógrafo e hoje vive em Brasileia, onde além de registrar o cotidiano do abrigo humanitário, trabalha para construir um projeto de ensino de português a imigrantes abrigados no local

Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.

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