MPF/MG dá prazo de 60 dias para Incra concluir estudos sobre comunidade quilombola

Trabalhos de identificação e titulação vêm se arrastando há mais de sete anos

Ministério Público Federal em Minas Gerais

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a imediata retomada dos estudos de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação, desintrusão, titulação e registro das terras ocupadas pelos remanescentes da comunidade quilombola São Pedro de Cima, localizada no município de Divino/MG.

Os estudos deverão ser concluídos em até 60 dias, com a apresentação, ao MPF, do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação das terras ocupadas pelos remanescentes de quilombos.

A Comunidade São Pedro de Cima é formada por 50 famílias de afro-descendentes que habitam a área rural do município de Divino, na região da Zona da Mata Mineira. As características do local indicam a existência no passado de uma comunidade negra relativamente isolada, o que acabou garantindo, de certa forma, a preservação de suas características culturais e societárias.

Em 28 de julho de 2006, a comunidade de São Pedro de Cima foi reconhecida oficialmente como remanescente de quilombo. No começo deste ano, porém, o MPF constatou que, quase sete anos após o reconhecimento, o Incra sequer havia iniciado os trabalhos de identificação da comunidade, para elaboração dos Relatórios Técnicos de Identificação e Delimitação (RTID) das terras ocupadas pelos quilombolas.

O MPF então expediu uma primeira recomendação, alertando a autarquia para as consequências jurídicas de sua omissão.

Só então o Incra deu início à elaboração do RTID, interrompendo-a, porém, logo em seguida, quando alguns supostos integrantes da comunidade apresentaram declaração afirmando não terem “interesse” na regularização fundiária do território, o que foi recebido, pela autarquia, a título de “consulta prévia”.

Após diligências no local, o Ministério Público Federal apurou que a declaração fora emitida por pessoas não-quilombolas que habitam a região e possuem interesses econômicos que tendem a ser afetados pela demarcação das terras.

Para o procurador da República Lucas de Morais Gualtieri, a declaração aceita pelo Incra como motivo de interrupção dos trabalhos não atende aos pressupostos da Convenção 169 da OIT e não reflete a vontade livre e informada dos membros da comunidade.

“Para que a consulta prévia seja efetiva e real, o INCRA deve primeiro, identificar os indivíduos que integram a Comunidade Quilombola de São Pedro de Cima, distinguindo-os dos demais indivíduos não-quilombolas que habitam a região, para só então realizar a consulta prevista no Decreto 5.051/2004”.

Segundo esse decreto, os povos interessados devem ser consultados, mediante procedimentos apropriados e através de suas instituições representativas, cada vez que  forem previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente, o que até hoje não foi feito em relação aos quilombolas de São Pedro de Cima.

“No entanto, a falta de consulta não impede a elaboração do RTID, que deve inclusive, como dissemos, preceder à consulta prévia. O que é inaceitável é o fato de o único órgão autorizado a efetuar os estudos que visam garantir direitos fundamentais previstos na própria Constituição proceda de forma tão negligente, ofendendo a soberania física e cultural do povo atingido por sua omissão”, afirma Lucas Gualtieri.

A justificativa do Incra, ao longo dos anos, tem sido sempre a de inexistência ou insuficiência de pessoal para realizar os estudos. Diante dessa situação, o MPF recomendou que o Incra celebre convênios ou contrate pessoal terceirizado para efetuar os trabalhos.

A recomendação foi encaminhada à autarquia na tarde desta quarta-feira, 20/11, Dia Nacional da Consciência Negra.

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