Yvy Katu: comunidade Guarani Ñandeva sofre pressões diante de prazo definido por ruralistas

cocarCimi

Sob a justificativa de protesto pacífico, desde ontem, terça-feira, 29, cerca de 120 ruralistas estão acampados próximos à ponte que dá acesso ao tekoha – lugar onde se é – Yvy Katu, municípios de Japorã e Iguatemi, Mato Grosso do Sul, do povo Guarani Ñandeva. Os ruralistas chegaram ao local na data prometida como limite à adoção de medidas próprias para caso o governo federal não apresentasse proposta concreta sobre o “litígio de terras” no estado.

Tal proposta parece não ter chego. Todavia, as comunidades indígenas também aguardam medidas do Poder Público: “Há dez anos que aguardamos a homologação de Yvy Katu. Todo o procedimento demarcatório está completo”, declara Valdemar Guarani Ñandeva. A liderança lembra que este ano o Tribunal Regional da 3ª Região (TRF-3) negou pedido de reintegração de posse de uma das áreas do tekoha. “Não estamos invadindo nada. A terra é de nosso povo”, afirma Valdemar. A presença dos ruralistas, porém, preocupa a comunidade.

A liderança resgata na memória episódio similar ocorrido em 2005, retratado no filme Sementes de Sonhos (assista aqui). Na ocasião, ruralistas e fazendeiros alegaram protesto pacífico na mesma ponte para uma tentativa de expulsão dos Guarani Ñandeva do território. Desarmados, os indígenas tentaram impedir a passagem se posicionando na frente dos fazendeiros, que atiraram ferindo alguns indígenas. Os Guarani Ñandeva iniciaram uma reza e logo após ela ter início uma tempestade de vento e trovões afastou os invasores.

Passados oito anos, a história se repete. Representantes do Ministério Público Federal (MPF) estiveram no local para averiguar a situação. Por enquanto não foram registrados conflitos, mas conforme as lideranças alguns fazendeiros ameaçam adotar medidas para retirar os Guarani Ñandeva de áreas retomadas, localizadas na terra indígena pronta a ser homologada. “Estamos preparados para defender nosso povo e nossa terra”, pontua Valdemar.

O governo federal, por intermédio do Ministério da Justiça e da Secretaria Geral da Presidência da República, tenta intermediar esta e outras situações de conflitos no estado através de uma mesa de diálogo, iniciada depois da morte de Oziel Gabriel Terena, pelas mãos da polícia, na Terra Indígena Buriti, em junho deste ano. Por enquanto, não há resultados objetivos, tanto no sentido de indenizar ocupantes de boa-fé de terras indígenas, quanto de garantir tais terras tradicionais aos povos indígenas.

Histórico

Cerca de 30 famílias Guarani Ñandeva retomaram no último dia 14 de outubro parte da Terra Indígena Yvy Katu, no município de Japorã (MS), fronteira com o Paraguai. No mesmo local, pouco mais de uma semana antes cerca de 30 famílias ocuparam outra área de 600 hectares, abandonada pelos proprietários há ao menos quatro anos, mas fora da posse dos indígenas. Com processo de demarcação praticamente finalizado – os marcos físicos que limitam a área já foram fixados – eles aguardam há 10 anos que a presidência da República assine o decreto de homologação da terra.

Iniciada há 29 anos, a demarcação da Terra Indígena Yvy Katu, na qual Porto Lindo está incorporada, foi interrompida diversas vezes por recursos judiciais. Em 2003, para pressionar o governo e o judiciário, os indígenas realizaram a primeira retomada de seu território tradicional, expulsando não-indígenas de 14 diferentes fazendas na área reivindicada.

Em junho de 2005, o Ministério da Justiça editou uma portaria declarando a terra como de posse permanente do grupo, com área de 9,4 mil hectares. A demarcação física já foi realizada, faltando apenas a homologação pela Presidência da República, ato final da demarcação. Os indígenas ocupam, atualmente, 10% do total da área demarcada, por força de decisão judicial.

Em março deste ano, a Justiça considerou nulos os títulos de propriedade incidentes sobre a Terra Indígena Yvy Katu, atestando a validade do processo demarcatório da área.

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