Comunidade Quilombola Invernada Paiol de Telha Fundão: “Carta de Alforria”

Nova Cartografia Social - volume 11 - Paiol da TelhaNós, representantes dos Escravos que serviram o Estado Brasileiro, repudiamos qualquer VOTO que perpetue o Regime de Escravidão vivido até hoje por nós descendentes de escravos brasileiros.

Nossos anciões estão morrendo e nossas crianças nascendo num ciclo de violência, cometido pelo sistema jurídico, social, econômico e político, onde prevalece o padrão estereotipado de um humano de pele branca, elitizada com força instaurada no poder de origem Europeia, essencialmente capitalista que conta com representantes nos três poderes desse sistema (executivo, legislativo e judiciário). Este sistema trata o humano de pele negra como um objeto de submissão a um sistema exclusão, racismo e discriminação, onde nós afrodescendentes não nos sentimos representados, tal sistema estigmatiza e oprime o homem de origem Afrodescendente sonegando-lhe os Direitos Humanos, não somos tratados como sujeito de direito.

Exigimos nossa liberdade em nome dos Direitos Humanos, a qual foi substituída por políticas públicas que não atingem nossos objetivos e não devolvem nossos direitos; servem apenas para demonstrar nas estatísticas manipuladas que no Brasil se faz de conta que está ocorrendo o dever de indenizar os descendentes de escravos ratificado em Documentos Internacionais.

Considerando o abismo de desigualdade que há neste Estado Democrático de Direito entre negros e não negros, exigimos o resgate de nosso direito ao território quilombola, através do Decreto 4.887/2003, da Constituição Federal, Convenção 169 da OIT e demais normas jurídicas nacionais e internacionais.

Considerando o processo de escravidão ao qual nossos antepassados foram submetidos exigimos uma indenização por parte da República Federativa do Brasil pelo Direito ora usurpado de nossas famílias, pela falta de prestação jurisdicional por parte do Estado Brasileiro.

Nosso grito de justiça deve surgir de nós não dos outros – que criaram um suposto Ordenamento Jurídico Democrático de Direito – até hoje desde os tempos da escravidão para nós não nos foi dado o que é nosso por direito – o Território para a garantia de nossa sustentabilidade, qual seja, o direito a propriedade, moradia, produção de alimentos,  reprodução física, cultural, econômica, social.

A devolução de nossas terras significa o poder de gerenciar nossas vidas sem depender dos recursos e das políticas de Estado Paternalista que eterniza a dependência econômica, sinônimo de prisão.

Ao nosso ver é essencial que cada grupo étnico racial seja autossustentável e promulgue sua ascensão social, cultural e econômica com seu trabalho em seu espaço territorial legitimado pela ancestralidade de nossos antepassados. Assim seremos livres e teremos a garantia de poder produzir, reproduzir e escolher o destino e o futuro de nossas crianças, e concretizar aos nossos anciões o sonho de vivenciar a democracia racialnão queremos depender eternamente de políticas paternalistas que cerceiam nossa liberdade – queremos romper com isso.

Considerando todos essas análises e verificando que o Brasil ainda aplica política de inclusão social para afrodescendentes evidencia-se que existe o mito da democracia racial ao qual queremos desmistificá-lo.

Considerando que o Brasil não cumpre com os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos relacionados aos pontos mencionados acima e pelo não cumprimento dos princípios e garantias constitucionais denunciamos a Corte Internacional e por cometer crime por OMISSÃO condenamos o Estado Brasileiro a nos INDENIZAR.

Assim restaurada nossa dignidade humana poderemos enfim promulgar nossa Liberdade.

“A escravidão é crime contra a humanidade, negar os direitos dos descendentes de escravos é cometer crime análogo ao de escravidão.”

Outubro de 2013

Comunidade quilombola Invernada Paiol de Telha Fundão, município de Reserva do Iguaçu/PR.

Território reivindicado pela Comunidade - Nova Cartografia Social vol. 11

Para ter acesso ao volume completo da Nova Cartografia Social referente à Comunidade Quilombola de Paiol de Telha Fundão, clique AQUI.

Assine a petição em apoio ao Paiol de Telha.

Mais informações:

TRF4 julgará a constitucionalidade do decreto federal que viabiliza a titulação dos territórios quilombolas

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