Nota da CAI/ABA sobre o ataque contra os Tupinambás da Serra do Padeiro

abaCaminhão que transportava estudantes é alvejado na aldeia Serra do Padeiro, Bahia

No último dia 14 de agosto, um caminhão que levava estudantes da Escola Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro (EEITSP) de volta para suas casas foi alvejado por um ou mais pistoleiros. O ataque ocorreu por volta das 20h, em uma estrada de terra. Ninguém foi atingido pelos disparos, mas estilhaços do para-brisas do veículo provocaram escoriações em dois estudantes não-indígenas: Lucas Araújo dos Santos, 18 anos, e Rangel Silva Calazans, 25. A informação foi confirmada pela indígena Magnólia Jesus da Silva, diretora da escola. As atividades escolares foram suspensas e retomadas apenas no dia 19.

O ataque inscreve-se em um quadro de intenso conflito territorial. O processo de identificação da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença teve início em 2004. Em 2009, a Fundação Nacional do Índio (Funai) aprovou o relatório circunstanciado que delimitou a TI em cerca de 47 mil ha, estendendo-se por porções dos municípios de Buerarema, Ilhéus e Una, no sul da Bahia. No momento, aguarda-se a assinatura, pelo ministro da Justiça, da portaria declaratória da TI, para que o processo encaminhe-se para as etapas finais.

Em protesto contra a demarcação da TI, no dia 16 de agosto moradores da cidade de Buerarema e arredores bloquearam a BR-101. Conforme informações da Polícia Rodoviária Federal, a via permaneceu fechada por aproximadamente dez horas. Na ocasião, veículos de órgãos governamentais que trafegavam pela rodovia foram retidos e incendiados pelos manifestantes. Um dos carros transportava indígenas, inclusive crianças, para tratamento de saúde em um hospital próximo. Não há registros de feridos.

Os Tupinambás relatam, contudo, estarem sofrendo ameaças. Indígenas que vivem na sede do município de Buerarema foram procurados em suas residências por indivíduos contrários à demarcação, que ameaçaram incendiar suas casas caso a mobilização indígena prosseguisse. Em razão das tensões, os Tupinambás não têm saído da aldeia, o que acarreta prejuízos econômicos, ao impedir a comercialização da produção agrícola, e dificulta o acesso a serviços de saúde, entre outros.

Já na madrugada do dia 17, um dos ônibus que transportam estudantes da EEITSP foi incendiado. O veículo estava estacionado na Vila Brasil (município de Una), localidade relativamente próxima à aldeia Serra do Padeiro; não havia pessoas em seu interior. Segundo relatos dos indígenas, o proprietário da empresa de transportes que presta serviços à Secretaria de Educação vem sofrendo ameaças na forma de “recados”, transmitidos pela Rádio Jornal de Itabuna, para que deixe de atender os indígenas, se não quiser ter outros veículos incinerados.

Em entrevista concedida ao Conselho Indigenista Missionário (Cimi) após a emboscada contra o veículo escolar, Rosivaldo Ferreira da Silva, o cacique Babau, enfatizou: “Já são muitos anos de espera, de sofrimento, de humilhação e somos considerados invasores de nossas próprias terras, eles constantemente nos transformam em réus quando na verdade somos vítimas desta situação humilhante”.

Representantes do poder público – como o deputado federal Geraldo Simões (PT) e a deputada estadual Ângela Souza (PSC) –, em declarações à imprensa regional, têm contribuído para a difusão do preconceito contra os Tupinambás e para a incitação à violência. O radialista Rivamar Mesquita, da Rádio Jornal de Itabuna, também é conhecido por suas frequentes declarações anti-indígenas.

Este não é o primeiro ataque contra os Tupinambá da Serra do Padeiro, alguns inclusive já divulgados pela CAI-ABA. Além de sofrer emboscadas realizadas por ocupantes não-índios, os indígenas foram vítimas, entre os anos de 2008 e 2010, de recorrente violência policial – incluindo uso de armamento letal, prisões ilegais e prática comprovada de tortura –, o que motivou denúncias de entidades como a Anistia Internacional e a proposição, pelo Ministério Público Federal, de ações civis públicas, responsabilizando o Estado.

A EEITSP foi estabelecida em 2005, como resultado da mobilização indígena; este ano, os Tupinambá obtiveram nova vitória, com a posse de sua primeira diretora indígena. Segundo dados da Secretaria de Educação da Bahia, 447 estudantes estão matriculados ali, incluindo não indígenas, em sua maioria assentados da reforma agrária e trabalhadores de fazendas de cacau que vivem nas proximidades. Apesar desses avanços, os Tupinambá sofrem cotidianamente os efeitos da omissão do Estado brasileiro, manifestada principalmente na negação de seus direitos territoriais.

Comissão de Assuntos Indígenas (CAI)

Brasília, 19 de agosto de 2013.

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