Vivian Virissimo, do Rio de Janeiro (RJ), Brasil de Fato
Segundo os autos do processo do massacre de Eldorado dos Carajás (Pará), a operação policial que assassinou 21 trabalhadores, no dia 17 de abril de 1996, foi financiada pela mineradora Vale do Rio Doce. O motivo: o protesto dos sem-terra na rodovia atrapalhava a circulação dos caminhões da empresa. Dezessete anos depois, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), dentro da Jornada Nacional de Lutas pela Reforma Agrária, mobilizou militantes sociais, nesta quarta-feira (17), para contestar os empreendimentos da Vale em âmbito nacional e internacional.
“A Vale bancou o deslocamento dos policiais que fizeram o massacre e até hoje não temos a punição concreta dos mandantes e dos assassinos. Hoje, precisamos mostrar para o povo brasileiro como está se dando as ações das grandes mineradoras e a Vale é o maior exemplo disso. Elas não só poluem e degradam o meio ambiente, mas estão tomando conta de territórios dos povos originários: quilombolas, indígenas, pescadores e campesinos. Além disso, esse modelo de desenvolvimento acumula muito mais riquezas na mão de menos pessoas. As riquezas desses territórios e minérios deveriam ser socializados com a população: escola, educação, saúde e reforma agrária”, destacou Marcelo Durão, coordenador estadual do MST.
Participaram do ato representando da Articulação Internacional de Atingidos pela Vale de vários estados brasileiros (Minas Gerais, Pará, Maranhão, Goiás e Rio de Janeiro) e de vários países da América Latina (Colômbia, Chile, Peru, Bolívia), da América do Norte (Canadá) e da África (Africa do Sul e Moçambique).
A moradora de Santa Cruz, na zona oeste, Marta Trindade, era uma dessas militantes que se juntou ao grupo de mais de 200 pessoas que protestavam em frente à empresa, no centro do Rio. Aposentada do serviço público de saúde, dona Marta é vizinha da empresa Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA), uma parceria entre a alemã ThyssenKrupp (73,13%) e a Vale (26,87%). A empresa provoca diferentes impactos ambientais, desde mortandade de peixes na Baía de Sepetiba, até casos de doenças respiratórias e de pele devido a chamada “chuva de prata”, pó expelido pela fábrica.
Enquanto conversava com a reportagem do Brasil de Fato, dona Marta mostrava as marcas de irritações alérgicas no rosto e se queixava de dores na garganta. “A vida era uma beleza em Santa Cruz, agora a situação está péssima. Antes nós tínhamos ar limpo, agora eu tenho problemas respiratórios por causa dessa poeira prateada que tem alumínio, ferro e chumbo. Essa empresa não tem respeito nenhum com o Brasil e com os países da América Latina. Eu sou uma moradora que luta porque não posso olhar para os lados e ignorar que tem gente com muitos problemas”, disse a moradora.
Campanha “Pare TKCSA”
Diante dos grandes prejuízos financeiros que a TKCSA vem acumulando, a empresa majoritária ThyssenKrupp está colocando sua parte à venda. Para denunciar o desperdício de dinheiro público nesta transação, movimentos sociais estão organizando a campanha “Pare TKCSA”. “A TKCSA está à venda pela metade do preço e essa transação só sera viabilizada se o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), segundo consta na imprensa, aportar novos recursos. Só que o BNDES já aportou cerca de R$2,3 bilhões, que nunca foram pagos, e mais R$2,5 bilhões em termos de renúncias fiscais, ou seja, mais ou menos 5 bilhões de dinheiro público. Além disso, ela está à venda por um valor inferior, já que os novos compradores oferecem R$4 bilhões”, criticou a economista Sandra Quintela do Instituto de Políticas para o Cone Sul (PACS).
A campanha defende que área da TKCSA seja transformada em um campus universitário. “A Zona Oeste, que representa 65% da cidade do Rio de Janeiro, não tem nenhuma universidade. Esta é uma dívida tremenda com a região. Um campus nesta área resultaria em um desenvolvimento real, com pesquisa e extensão, com a descontaminação da baía de Sepetiba, com trabalho com os pescadores tradicionais e com produção de alimentos garantindo soberania alimentar”, completou.
com foto de Henrique Zizo.
—
Compartilhada por Gleice Oliveira Guarani-Kaiowá.